Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

12.2.05
 
Alberto Melo deu-nos o prazer da sua visita
Caras e Caros Colegas,
Descobri recentemente o vosso blog, graças a uma boa amiga. É uma excelente iniciativa.
A propósito do Ano Internacional da Cidadania através da Educação, gostaria de participar no vosso blog com um texto que escrevi, há uns 27 anos. Foi publicado -pelo Instituto de Educação da UNESCO e a Pergamon Press - num livro de artigos vários, por autores de diferentes países (incluindo o José Mariano Gago) - em versão inglesa. Nunca foi, no entanto, publicado em Portugal. Traduziu-o recentemente e aqui o envio, se o quiserem utilizar.
Com os meus melhores votos para uma continuação do óptimo trabalho que estão realizando.
Saudações cordiais,
Alberto Melo
P.S. Também junto uma referência à Associação "O Direito de Aprender" e à Revista "Aprender ao Longo da Vida"


Em breve, depois de resolvidos alguns problemas técnicos, publicaremos na íntegra o texto que tão gentilmente nos enviou. Neste momento tem muito mais caracteres do que o número que tínhamos estabelecido que seria conveniente aparecer no ecrã.

O CIDADÃO

(Curto ensaio sobre Educação Política)

Alberto Melo


Em uníssono, comentadores na comunicação social, investigadores, jornalistas ou representantes de partidos deploram a apatia pública perante a política – excepto, em geral, por altura das eleições, quando o interesse é constantemente estimulado pelos ‘media’. Além disso, a informação política atinge todas as casas numa escala inédita através dos jornais, rádio e televisão. Já não é possível fingir que a política não existe. A política está metida em tudo, no elevado preço da gasolina ou nos 7 meses de espera para uma simples intervenção cirúrgica, na longa caminhada a pé para casa causada pela greve dos transportes públicos, até nos filmes de terror...

Perante um novo e sério problema a enfrentar, tal como a subida drástica no preço da gasolina, a reacção das pessoas não é, via de regra, de apatia. Reagem e as suas reacções (na maioria das vezes, apenas verbais) diferem bastante, tanto no tom como no conteúdo: “Nunca devíamos ter perdido as colónias!”; “As grandes empresas é que levam o lucro todo!”; “Quando é que teremos finalmente o automóvel eléctrico?”; “Ora, ora, oxalá que o próximo aumento de ordenado chegue para cobrir este aumento”; “Mas porque razão o governo não reduz o imposto sobre combustíveis?”; “Boicotem-se todas as importações de petróleo, já! Regressemos às bicicletas!”

Todas estas reacções se baseiam em informação. Pode até assumir-se que as pessoas que fizeram estes comentários tiveram todas acesso à mesma informação, ao mesmo tipo de conhecimento político sobre a crise do petróleo. Contudo, fizeram opções pessoais ao seleccionar, a partir da informação original, o factor específico mais capaz de expressar os respectivos sentimentos. Para mais, não será possível distinguir entre as reacções correctas e as reacções erradas. Alguns comentários poderão ser objecto de uma condenação moral, e é sempre possível procurar avaliá-los em função do respectivo grau de realismo político ou classificá-los por categorias psicológicas, mas não se podem invocar argumentos científicos para separar o falso do verdadeiro.

Será possível retirar algumas conclusões do que ficou dito que poderão ser úteis para uma clarificação gradual do conceito de “pessoa como cidadão”. Uma delas refere-se a opinião política, um assunto do maior interesse, não só para os que organizam sondagens de opinião, mas também para os militantes políticos que consideram a manipulação das opiniões pessoais como uma parte essencial da sua missão. As opiniões não precisam de ser cientificamente substanciadas; reflectem a ideologia ou filosofia de vida daqueles que as expressam. Ter opiniões e ser capaz de as articular é uma necessidade muito largamente sentida pela população adulta. E isto exige, para além de uma aptidão geral para o discurso lúcido, a capacidade de definir problemas sob os seus diferentes aspectos, identificar e seleccionar toda a informação relevante e integrar dados externos e valores internos numa opinião coerente que revele com fidelidade o ego político de cada pessoa.

A realização de um ego político integrado – isto é, um conhecimento profundo de como se age em sociedade, de como se pensa e se sente sobre os assuntos sociais, de como se expressam ideias e se procura influenciar pessoas e acontecimentos – pode, pois, ser sugerido como o objectivo principal de qualquer programa de educação política.

Obviamente, a vida política não se limita a ser um fórum de opiniões. Embora as opiniões possam ser etiquetadas como perigosas ou subversivas pelos regimes autoritários, uma opinião expressa não será mais nem menos do que palavras; se se pretende que tenha um impacto social, terá que ser seguida por qualquer tipo de acção, desde levantar o braço para apoiar uma moção até mobilizar uma multidão para apoiar uma causa.

A acção política é, portanto, o passo seguinte no desenvolvimento de uma pessoa como cidadão. Já não se limita a formular uma opinião sobre um problema social e sobre as soluções políticas apresentadas para o resolver; passa a fazer qualquer coisa sobre isso. Mesmo para sociedades em que existe liberdade de expressão, este domínio da acção política implica controlos bastante restritivos. Em regra, as opiniões não prejudicam as outras pessoas nem afectam a sua liberdade tal como as acções o poderão fazer. “A minha liberdade termina onde começa a liberdade do outro”.
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