Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

31.12.07
 
Mª de Lourdes Modesto, a ASAE e a pedagogia
Mª de Lourdes Modesto foi minha professora no Liceu Francês nos idos da década de 50. Uma adorável professora que me deixou passar um ano de Trabalhos Manuais a fazer umas casinhas de gesso pré-históricas em vez de aprender artes e ofícios de fada do lar. Hoje arrepio-me de não ter aprendido culinária com ela mas, pouco mais velha do que nós, era sensata e sabia que "não vale a pena dar de beber a cavalo que não tem sede"...

Leio-a sempre com imenso prazer e proveito certo. Desta vez foi na revista Tabu do Sol em que , interrogada sobre a actuação da ASAE - agora tão na moda louvar ou atacar sem limites nem nuances - diz o seguinte :

Pergunta : "As medidas da ASAE vão contra as tradições?

MLM - O que eu posso dizer é que o lixo não faz parte da cozinha tradicional e fazem-se em muitos sítios coisas muito grosseiras e mal feitas. A ASAE está a cometer um erro porque entrou a matar; mas há-de haver um momento de reflexão. A ASAE tem de ter bom senso mas é absolutamente necessária. Não acho que a cozinha esteja em perigo, a doçaria tradicional sim, porque os frutos exóticos e os novos conhecimentos têm dado origem a doces fantásticos.

P. - Usa colher de pau ?

MLM - Uso, é uma coisa adorável mas tem que ser escaldada e desinfectada senão pode transportar bactérias patogénicas. É preciso que as pessoas se habituem que nem tudo é bom (...) as pessoas têm é que ser esclarecidas, não é como fizeram com os restaurantes chineses e fechar tudo. Isso foi vergonhoso."

Aposto que se estão a perguntar o que é que isto tem a ver com pedagogia. Eu acho que tem tudo !

Maria Emília Brederode Santos

27.12.07
 

Em tempo de bons votos, aqui vão os meus votos de TEMPOS BONS para a nossa sociedade, a escola e as crianças !
…e de boas viagens “de si a si mesmo” e de si aos outros!
MJ



O Homem; As Viagens
Carlos Drummond de Andrade


O homem, bicho da terra tão pequeno
Chateia-se na terra
Lugar de muita miséria e pouca diversão,
Faz um foguete, uma cápsula, um módulo
Toca para a lua
Desce cauteloso na lua
Pisa na lua
Planta bandeirola na lua
Experimenta a lua
Coloniza a lua
Civiliza a lua
Humaniza a lua.

Lua humanizada: tão igual à terra.
O homem chateia-se na lua.
Vamos para marte — ordena a suas máquinas.
Elas obedecem, o homem desce em marte
Pisa em marte
Experimenta
Coloniza
Civiliza
Humaniza marte com engenho e arte.

Marte humanizado, que lugar quadrado.
Vamos a outra parte?
Claro — diz o engenho
Sofisticado e dócil.
Vamos a vênus.
O homem põe o pé em vênus,
Vê o visto — é isto?
Idem
Idem
Idem.

O homem funde a cuca se não for a júpiter
Proclamar justiça junto com injustiça
Repetir a fossa
Repetir o inquieto
Repetitório.

Outros planetas restam para outras colônias.
O espaço todo vira terra-a-terra.
O homem chega ao sol ou dá uma volta
Só para te ver?
Não-vê que ele inventa
Roupa insiderável de viver no sol.
Põe o pé e:
Mas que chato é o sol, falso touro
Espanhol domado.

Restam outros sistemas fora
Do solar a col-
Onizar.
Ao acabarem todos
Só resta ao homem
(estará equipado?)
A dificílima dangerosíssima viagem
De si a si mesmo:
Pôr o pé no chão
Do seu coração
Experimentar
Colonizar
Civilizar
Humanizar
O homem
Descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
A perene, insuspeitada alegria
De con-viver.

 
Boas Festas

A. Bettencourt

24.12.07
 
FELIZ NATAL COM ANTÓNIO GEDEÃO
Dia de Natal

Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

É dia de pensar nos outros— coitadinhos— nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.

Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,
Entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.

De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)

Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos, esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam mais distante.

Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica.

Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos e favores.

A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
e compra— louvado seja o Senhor!— o que nunca tinha pensado comprado.

Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.

Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha,
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama.

Ah!!!!!!!!!!

Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.

Jesus
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.

Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem mortas:
Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.

Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.

Dia de Confraternização Universal,
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.
É dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.

António Gedeão

posted by MEBS , agradecendo à AP do CEBI

23.12.07
 
Boas Festas
Ilha do Fogo- Vendedora com o filho ao colo, no mercado de

S. Filipe

A. Bettencourt

 
Boas Festas
Ilha do Fogo - Cabo Verde

A Bettencourt

22.12.07
 
A EDUCAÇÃO NA COMUNICAÇÃO SOCIAL
O grupo informal que, em 2004, adoptou a designação provocatória de “inquietações pedagógicas” desejava, criando plataformas de discussão, elevar o nível, o “profissionalismo”, o realismo, a diversidade e a qualidade do debate sobre a educação em Portugal. Não procurava perspectivas ou soluções únicas mas pretendia que as questões que correm a opinião pública, muitas vezes “construída” pela comunicação social, fossem fundamentadas, fossem inseridas na realidade e história nacional, não menosprezassem o enquadramento internacional e nunca – apesar da má fama que se lhes quis criar - deixassem de ser ouvidos os actores e especialistas da educação. Entre 2004 e 2007 panorama não melhorou, os propósitos das “inquietações pedagógicas” mantêm-se e é deste tema que tratam os textos que se seguem.

O inesperado desaparecimento de Joaquim Bairrão Ruivo é um facto que não pode deixar de se assinalar, anunciando que a ele se vai dedicar integralmente a próxima colaboração no JLEducação de Janeiro.



A EDUCAÇÃO NA COMUNICAÇÃO SOCIAL

Ana Maria Bettencourt* e Maria Emília Brederode Santos**

As relações entre a educação e a comunicação social nunca foram pacíficas e, hoje, os textos referentes à educação e à escola parecem cada vez mais reduzidos a um “pensamento único” no qual não se revêem nem os protagonistas do processo educativo nem os estudiosos da educação.

Para dizer a verdade, as vozes dos protagonistas nunca foram muito ouvidas – por razões várias que vão desde a dificuldade em reconhecer aos alunos o direito de serem ouvidos e a sua opinião tida em conta, à tradição funcionária dos professores ou à complexidade da organização escolar...

Por outro lado, o espaço dos especialistas definhou: acabaram os programas televisivos e radiofónicos que, nas décadas de 70 e 90,tentaram contribuir para uma cidadania informada em matéria educativa; acabaram também – ou viram o seu espaço muito reduzido – as páginas de educação especializadas dos grandes jornais (a do Diário Notícias no final dos anos 80, a do Público muito mais recentemente), terminaram ainda os jornais ou revistas especializados mas dirigidos ao grande público – como o “Jornal da Educação” e outros.

Restam as “notícias”- cujo propósito não é, nem deve ser, contribuir para o aprofundamento do pensamento pedagógico e para o debate de ideias – e os textos de combate de alguns “opinion-makers” neo-liberais ou saudosos da escola antiga.

Mas a educação é um assunto demasiado sério para ser deixado apenas aos não-especialistas! As “Inquietações Pedagógicas” nasceram destas constatações e da vontade de promover, defender, apoiar medidas com base no conhecimento e de elevar a qualidade do debate pedagógico – primeiro na “Capital”, depois neste singular “Jornal de Letras” e sempre na blogoesfera (http://www.inquietacao_pedagogica.blogspot.com/), cada vez mais espaço de liberdade informativa.

A Página de hoje destina-se justamente a relançar esta questão e a promover o debate sobre uma das dimensões da relação entre a educação e a comunicação social. Outras se seguirão oportunamente.

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*Professora da Escola Superior de Educação de Setúbal e Conselheira do Conselho Nacional de Educação
**Directora da Revista “Noésis” e Conselheira do Conselho Nacional de Educação

QUANDO A ESCOLA É NOTÍCIA

Pedro Abrantes*
Se perguntarmos em que contextos públicos as crianças e jovens formam hoje as suas identidades, competências e culturas, qualquer um apontaria a escola e a esfera mediática. No entanto, que relação existe entre estes dois universos? Que mensagens transmitem um sobre o outro?
O projecto “Crianças e Jovens em Notícia”,coordenado pela professora Cristina Ponte e no qual tive o prazer de participar, permite-nos equacionar esta relação complexa mas fundamental para compreender a sociedade actual. Irei aqui cingir-me, em traços gerais, a uma análise das 1327 peças publicadas em 2005 sobre o universo escolar, nos quatro diários generalistas de maior tiragem.
O facto de a educação abarcar 23,5% das notícias que se referem a crianças e jovens, só superada pelas questões associadas ao risco social, mostra-nos até que ponto se encontra já consolidado e legitimado, pelo menos no universo mediático, o “ser aluno” enquanto ofício “natural” das crianças e adolescentes na sociedade portuguesa.
Mais, em comparação com os restantes temas, podemos observar que a educação constitui um assunto nobre, uma vez que surge mais representado nos jornais que se consideram de “referência”, a dimensão média das peças é maior, são ouvidas mais “fontes”, dispõe de um maior número de manchetes e destaques e a larga maioria das peças são assinadas pelos respectivos autores. No âmbito das abordagens da infância, merece, pois, um tratamento privilegiado.
Nos jornais, a educação tende pois a assumir um carácter público, sendo que mais de três quartos das peças referem informações provenientes de fontes institucionais. No entanto, essas entidades são, quase sempre, da administração central ou das forças sindicais, sendo que os especialistas no campo e as organizações internacionais acabam por ter uma presença residual, menor até do que noutros temas associados à infância. Ou seja, parece consolidar-se um espaço público, mas com acesso muito condicionado.
Não é pois de estranhar que mais de 65% das peças sobre educação têm um âmbito nacional, sendo que os fenómenos de cariz local, regional ou internacional acabam por raramente ser noticiados. Quando os especialistas no campo educativo reconhecem que as últimas décadas foram marcadas por fortes pressões, quer localistas quer globalizantes, os jornalistas parecem fiéis a uma visão centralista e nacionalista da educação.
As políticas governamentais (26% das peças) e os exames e avaliações (16%) são claramente os temas que dominam a agenda mediática sobre educação. Este enfoque tem contribuído, aliás, para que o reforço dos sistemas de exames e de avaliação se tornasse, nos últimos anos, um ponto central das políticas e debates neste campo. Seguem-se, com quase 10% cada um, temas de forte conflitualidade social, como as condições das escolas, os problemas sociais, a violência e os protestos/greves. Perante a total invisibilidade de outros temas, como o insucesso e o abandono escolares, somos levados a concluir que os jornais generalistas possuem uma agenda educativa própria, procurando introduzi-la na arena política.
Além disso, será interessante notar como a educação se estabelece também como terreno de opinião. Enquanto nos restantes temas associados à infância, o volume deste tipo de peças não ultrapassa os 6%, no caso da educação, representa 13%. Uma análise mais fina permite-nos ver como essas opiniões são expressas sobretudo por actores externos às redacções (leitores e opinion makers). Quatro em cada cinco destas peças são assinadas por homens, enquanto a maioria das notícias são escritas por mulheres. Perante a presença residual dos especialistas no campo, podemos então perguntar se esta centralidade das opiniões dos cidadãos não corresponderá a uma estratégia de afirmação, através de mecanismos de filtragem e de representação (selectiva) do espaço público, de posições editoriais.
Por fim, não podemos deixar os grandes ausentes das peças sobre educação são, afinal, os próprios protagonistas centrais dos processos educativos: os alunos e os professores. Convergem para este fenómeno factores tão diversos como a desvalorização geral das opiniões de crianças e adolescentes, os fortes constrangimentos actuais ao “jornalismo de terreno”, os entraves do Ministério da Educação à relação directa entre jornalistas e professores, uma visão da política como afastada das experiências quotidianas dos indivíduos…
Em suma, os jornais generalistas prestam hoje uma atenção considerável ao universo educativo, contribuindo para a sua constituição enquanto espaço público condicionado. Reforça-se assim um jogo de acção-reacção permanente entre as posições governamentais, as demandas sindicais e uma “nebulosa” de opiniões de um grupo restrito de agentes com uma posição social e mediática privilegiada. Nas margens deste espaço têm ficado as organizações não-governamentais, os especialistas no campo e... os próprios protagonistas do processo educativo (alunos, professores e famílias).
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*Sociólogo e Professor de Sociologia da Educação


(RE)LER A “CRISE” DA EDUCAÇÃO EM TRÊS JORNAIS

Ana Maria Bettencourt* e Cristina Gomes da Silva**

Com o projecto “Cidadania, Autoridade e Integração”[1], leit motiv deste texto, pretendeu-se compreender a oposição/desencontro existente entre o discurso transmitido pelos media a propósito da educação e as situações vividas pelas escolas.

O estudo centrou-se, assim, por um lado na análise dos discursos proferidos sobre a educação e a escola actuais, veiculados pelos media e, por outro lado, na identificação das práticas pedagógicas no interior das escolas conducentes ou não a uma maior integração social, a melhores aprendizagens e a um melhor exercício da cidadania.

Trataremos muito brevemente aqui, da análise efectuada sobre dois jornais diários - o Público e o Jornal de Notícias - e um semanário - o Expresso. A análise incidiu sobre as notícias (571, distribuídas pelos três jornais), os editoriais (11, todos no Público) e os artigos de opinião (101, dos quais 71, no Público, 27 no Expresso e 3 no JN) publicados durante o ano de 2002.

Queria-se tentar compreender como é que a produção mediática se ocupava do mundo da educação e das suas escolas, como caracterizavam a sua crise e que soluções preconizavam.

Nesse ano as polémicas em torno da “crise” da educação manifestavam-se de forma muito visível, designadamente através de acesas discussões e trocas de opinião nos media. O objecto principal dessas polémicas era a escola e a sua crise. A inflação da produção de discursos sobre a educação teve como “pretextos” os seguintes factos: a discussão sobre a publicação dos rankings de escolas em 2001; a publicação de dados do PISA, em Dezembro de 2001; a publicação do Manifesto para a Educação da República, em Fevereiro de 2002 (que originou 13 artigos de opinião no Público).

Como era caracterizada a crise ? A ideia de crise está muito presente nos jornais analisados. No entanto o modo como é tratada é diferente nos vários tipos de peças jornalísticas.

A grande maioria das notícias diz respeito às condições das escolas - edifícios degradados, sobrelotação, falta de pessoal auxiliar, o mau estado das escolas do 1º ciclo. Em segundo lugar encontram-se as notícias referentes a protestos, e dizem respeito designadamente a manifestações de alunos (contra a revisão curricular do ensino secundário) e de professores (a favor da estabilidade do corpo docente). Há ainda, com menor expressão, outros problemas como o insucesso ou o abandono escolar.

Como responsáveis pela crise surgem por exemplo, a falta de investimento, a perda de autoridade dos professores e, por consequência da escola, a instabilidade e falta de formação do corpo docente, os alunos e os seus problemáticos meios sociais de origem.

Nos artigos de opinião a crise é considerada em geral grave e generalizada, sendo apontada a ineficácia do sistema, a necessidade de reformas – apesar deste desejo de reformas, são, com frequência, ignoradas as que estão em curso, sendo remetidas para uma quase clandestinidade.

A evolução negativa do sistema é considerada resultado do papel do Estado, ou da acção dos políticos e práticos das políticas da educação. Fala-se da crise de confiança.

Nos editoriais do Público esta linha de pensamento é também seguida, havendo ainda uma crítica à falta de informação quantificada sobre o desempenho das escolas.

Como soluções para a crise surgem nas notícias, com grande frequência, referências à melhoria da rede (86 notícias), reformas (62 notícias), melhoria do parque escolar, dos manuais escolares, a avaliação e formação de professores.

Nos artigos de opinião refere-se a necessidade de mudanças radicais, sendo grande a insistência na necessidade de desenvolvimento de uma cultura de avaliação . Em grande parte das peças analisadas, domina um discurso liberal onde sobressai a defesa da criação de um mercado da educação; do cheque-educação; do fim do monopólio estatal sobre a educação; da remuneração dos professores em função do mérito e da possibilidade de a escola escolher os seus professores.

Os editoriais analisados seguem uma linha de rumo idêntica defendendo a avaliação como factor de progresso, a revisão do estatuto de carreira docente dos professores, a virtude da transparência dos rankings, a submissão a uma lógica de mercado.

Em suma, constata-se a existência de um discurso em que predomina uma visão exterior à escola, onde se ignoram os problemas de funcionamento interno decorrentes designadamente da democratização do acesso. As notícias parecem contudo mais próximas da realidade escolar do que os artigos de opinião ou os editoriais, em geral mais ideológicos e produzidos por elementos que desvalorizam a ciência e o conhecimento no domínio da aprendizagem e da educação.

Tratando-se de um contexto relativamente ao qual todos temos alguma familiaridade, torna-se mais fácil a produção generalizada de discursos e este “à-vontade opinativo” tem, sem dúvida, a ver com o facto de se tratar de um contexto experienciado por todos.

Alguns dos discursos veiculados pelos media evidenciavam, por um lado, um certo grau de desconhecimento do que se passava nas escolas e, por outro lado, ignoravam as recentes transformações vividas nas escolas e que foram efeito do processo de democratização. Assim, estava em causa um discurso que descolava da realidade sobre a qual era proferido. Este desencontro revela-se prejudicial à construção de consensos, sustentáculo essencial das reformas.

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*Professora da Escola Superior de Educação de Setúbal e Conselheira do Conselho Nacional de Educação
**Professora da Escola Superior de Educação de Setúbal


[1] Projecto realizado por Ana Maria Bettencourt, Cristina Gomes da Silva, Nelson Matias, Teresa Gaspar e Miriam Costa, no âmbito do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e da ESE de Setúbal, vd. Noesis, nº 67.


Publicado no Jornal de Letras - Educação em Dezembro de 2007

 
A PSICOLOGIA ESTÁ MAIS POBRE
JOAQUIM BELO BAIRRÃO RUIVO, professor emérito da Universidade do Porto, onde foi marcante como docente e investigador, faleceu no passado dia 1 de Dezembro. Licenciado em Filosofia pela Universidade de Lisboa, doutorou-se em Psicologia na Universidade de Nanterre (Paris). Criou em 1967 o Centro de Observação Médico Pedagógica, serviço pioneiro na área das crianças em risco e com deficiência e o seu contributo foi ímpar para o desenvolvimento da Psicologia em Portugal. O seu saber, rigor e curiosidade insaciável, manteve-o na vanguarda científica, exigindo dos que o rodeavam permanente actualização. A sua perda é sentida pela comunidade científica portuguesa e pelos investigadores internacionais com quem privou. No próximo JLEducação as Inquietações Pedagógicas recordá-lo-ão nas suas diversas facetas.






15.12.07
 
BOLONHA - UM MITO NEO-EUROPEU ?
CONFERÊNCIAS
DEZEMBRO
Organização
18 de Dezembro 18h Sala 7 (Conferência proferida Inglês)
»Bologna« – a neo-European myth?
Jürgen Schriewer
Universidade de Humboldt de Berlim
Apoios
http://conferencias.uidce.fpce.ul.pt
Tel.: 217943651
uidce@fpce.ul.pt http://uidce.fpce.ul.pt
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa > Entrada livre
Unidade de I&D de Ciências da Educação
Fotografia do Arquivo da FPCE-UL
A conferência terá por objecto o chamado "processo de Bolonha" e a difusão, sem precedentes
na história, de um modelo abstracto de reestruturação e harmonização do Ensino Superior em
toda a Europa. Este processo é entendido como uma instância particular de um processo mais
amplo de inter-relações e estandardização mundiais ao nível educativo. A conferência baseia-se
na investigação e nas ferramentas conceptuais produzidas pelas teorias do sistema mundial, em
particular pelas abordagens sociológicas neo-institucionais relacionando-as com uma
abordagem que, enraizada na sociologia das organizações e na sociologia do conhecimento,
investigou e elaborou o modelo da "construção social de uma ‘cultura mundial’". À luz de
conceitos analíticos tais como "difusão", "modelo imaginado" ou "mito racional" e sublinhando
os resultados de investigações que apontam para a importância crescente das organizações
intergovernamentais internacionais (IGOs e INGOs), a conferência apresentará uma
interpretação conceptual acerca, quer das origens, quer das dinâmicas do processo de Bolonha.

12.12.07
 
Lá Fora Também se Aprende
Este era um título de um interessante programa de televisão conduzido por Maria Emília Brederode Santos há cerca de trinta anos. Mas a ideia que lhe deu o título tarda em ser assumida pela sociedade portuguesa.
Ouvimos, a 11 deste mês, na Assembleia da República, Santana Lopes indignar-se com o processo oficial de reconhecimento e validação de competências (RVCC).
Segundo ele, haveria facilitismo no processo, o que seria injusto para quem estuda no ensino regular.
A sua atitude não me espanta. Apesar de ser hoje cada vez mais reconhecido que a melhoria da qualificação dos portugueses passa pela educação de adultos, este sector da educação nunca foi levado muito a sério, no mundo da política.
O conhecimento que aqueles que produzem a opinião no país consideram ter sobre a educação, pelo simples facto de terem andado na escola não lhes permite conhecerem este mundo da educação de adultos, sobre o qual se dizem os maiores disparates. Trata-se porém de um sector que foi decisivo para a democratização e para o desenvolvimento de vários países entre os quais os países nórdicos.
E, no entanto, todos sabemos que há, na sociedade portuguesa, sectores significativos da população, e da população activa em particular, que, infelizmente, não tiveram possibilidade de aceder à educação básica e secundária. E há também um número elevadíssimo de jovens excluídos em anos recentes, aos quais a escola não foi capaz de dar a resposta certa, e que é necessário qualificar.
O sistema de reconhecimento de competências apoia-se em instrumentos rigorosos de avaliação, que, independentemente de poderem ser mal ou bem aplicados - como aliás a avaliação efectuada pelas escolas - permitem avaliar as competências adquiridas pelos adultos ao longo da sua vida e encaminhá-los para as formações de que necessitam para adquirirem um determinado nível de escolaridade.
Conheci histórias extraordinárias de pessoas que, através deste sistema, aprenderam a valorizar os seus percursos, a sua vida pessoal, se reconciliaram com a educação, estudaram mais, aprenderam com entusiasmo, ganharam aptidões profissionais e alguns criaram o seu próprio emprego. Estes percursos de reconhecimento de competências podem constituir um patamar precioso para iniciar trajectos de formação e qualificação com a necessária consistência.
São um êxito da democracia.
Ao contrário do que se vai dizendo, o facto de não se possuir diplomas escolares está longe de corresponder à ausência de conhecimentos, saberes e competências.
Inúmeros exemplos no mundo da política e das artes, por exemplo, confirmam-no.
É fundamental consolidar a rede nacional de instituições vocacionadas para a educação de adultos, capaz de motivar os portugueses para aprenderem mais, e fornecer mais armas para fazerem face ao desemprego.
Avaliar e corrigir este processo inovador e pouco compreendido por muitos é o caminho.

Achincalhá-lo é um acto de ignorância.

Ana Maria Bettencourt

 
A Educação e a Chicana Parlamentar
Ouvi ontem pela manhã, na rádio, que o Primeiro Ministro iria ao Parlamento debater questões da educação.
Pensei : Portugal mudou, finalmente a educação assume o estatuto de prioridade e vamos analisar os problemas deste sector com seriedade. Um sector que todos dizem ter o segredo do desenvolvimento do país, mas que está longe de ser assumido como tal, quer nos debates políticos, quer nos media. As coisas iriam começar a mudar?
Enganei-me.
Ao ver os alinhamentos dos notíciários da noite de ontem na televisão, percebi que prevaleciam as hierarquias do costume - a segurança bem antes da educação, na sequência de uma intervenção de um deputado que provavelmente nem se dignou ouvir o que disse o Primeiro Ministro, - e critérios que privilegiam a chicana parlamentar em detrimento dos temas tratados, se calhar por culpa de todos os que alinham naquele figurino de intervenção. Se calhar por falta de conhecimento e de pedagogia junto dos jornalistas sobre temas com alguma complexidade .
Os debates importantes no Parlamento continuam a ser vistos como uma espécie de jogo em que o importante é identificar quem sai ganhador...
Em vez de se explicar em que aspectos a mudança no modelo de gestão das escolas poderia contribuir para melhorar a qualidade do ensino, perdeu-se imenso tempo a ver semelhanças e diferenças entre o projectos do Governo e um projecto anterior do PSD. Não para construir os consensos necessários à sustentação de um projecto tão decisivo mas apenas para discutir quem foi o primeiro....
O mais grave de tudo foi o modo como o líder da bancada do PSD tratou os temas e em especial o sistema de reconhecimento e validação de competências (RVCC), revelando um grande desconhecimento sobre os procedimentos em que se apoia e demonstrando uma ignorância inaceitável sobre o que vai pelo mundo, nesse aspecto, há várias décadas. Para fazer melhor figura só precisava de ter consultado alguns elementos do seu partido, que tiveram responsabilidades no processo, quando foram governo, e que o mantiveram.
Enquanto isto continuar, de certeza que ninguém ganha de facto nada nestas vitórias parlamentares tão superficiais e efémeras, e, quem perde é, seguramente, o país.
Enquanto os Partidos Políticos - todos sem excepção - demonstrarem tamanhas fragilidades na formação dos seus quadros e na pedagogia dos seus projectos, parece-me difícil qualificar o debate parlamentar e construir consensos mais alargados.

Ana Maria Bettencourt

11.12.07
 
FÉRIAS NO MUSEU CARLOS MACHADO !
Férias no Museu Carlos Machado

Estão abertas inscrições, até ao dia 14 de Dezembro, no Museu Carlos Machado, para o programa educativo Férias no Museu.Durante dois dias, no período de férias de Natal, crianças entre os 6 e os 12 anos poderão realizar actividades relacionadas com as colecções do Museu, com a exposição temporária, e com a época festiva. Estas actividades irão decorrer no Núcleo de Arte Sacra do Museu ( Igreja do Colégio) e na Loja da Cultura. O programa irá funcionar com dois grupos de crianças, um grupo para cada um dos dois dias, e constará de visitas orientadas às exposições, ateliers temáticos, jogos e outras surpresasAs actividades irão decorrer nos dias 17 e 18 de Dezembro das 9:30h às 12:30h e das 14h às 17h. Para mais informações os interessados devem ligar para o Museu - Telefone - 296283814Estas actividades têm lotação limitada.-- Museu Carlos Machado,Rua João Moreira 9500-075 Ponta Delgada tel.296 28 38 14 fax 296 62 95 04

Publ. por MEBS

 
Reinventando Paulo Freire...
SEMINÁRIO
UID-OPECE

A UID - Observatório de Políticas Educativas e de Contextos Educativos convida-vos a assistir ao Seminário intitulado Epistemologias Oprimidas Reinventando Paulo Freire no século XXI, a realizar no próximo dias 14 de Dezembro, nas instalações da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (Auditório Vítor Sá), em Lisboa.


14 Dez 15.30h-18.30H Auditório Vítor Sá

Epistemologias Oprimidas
Reinventando Paulo Freire no século XXI
Prof. Doutor José Eustáquio Romão(UNINOVE, S. paulo, Brasil)

Publicado por MEBS

8.12.07
 
PP E AS SOLUÇÕES DO PASSADO
Paulo Portas e as soluções do passado
Paulo Portas criticou o secretário de estado Jorge Pedreira por este ter dado, como uma das explicações para os maus resultados escolares dos alunos portugueses nos testes PISA, o elevado número de "chumbos". Jorge Pedreira invocava o facto de os testes, ao serem realizados a alunos com uma determinada idade, e não em função do ano de escolaridade que frequentam, penalizarem necessariamente os alunos que ficaram retidos um ou mais anos, na medida em que há conceitos, conteúdos e competências que ainda não adquiriram. Os alunos portugueses que estão no ano correspondente à sua idade obtêm nos testes PISA resultados acima da média.
Há estudos que mostram que as repetências fragilizam os percursos escolares e são factor de desmotivação.
Hoje a retenção não é, na maioria dos casos em que é aplicada entre nós, nem uma medida de justiça, nem uma medida pedagógica válida. É sim um caminho para tornar as turmas mais homogéneas e fáceis de gerir, e um processo para continuar a afastar muitos alunos da escola.
Mas não é o caminho para uma Educação para Todos.
É claro que muitos professores utilizam a retenção considerando-a como medida de justiça. Em grande parte dos sistemas educativos europeus, e sobretudo naqueles que obtêm melhores resultados nos testes PISA, não existem chumbos. O que existe em geral são modalidades muito eficazes de apoio aos alunos. De actuação aos primeiros sinais. E estes sistemas são bem mais justos e democráticos do que o nosso. E constituem um instrumento sólido do desenvolvimento social e económico desses países. Creio que o país e as crianças portuguesas ficariam a ganhar se se substituísse o chumbo, como medida de regulação das dificuldades de aprendizagem, por um enquadramento mais eficaz dos alunos na escola pública, se os alunos trabalhassem muito mais na própria escola, tivessem muito mais apoios, inclusive nas próprias aulas. Uma grande parte dos alunos portugueses trabalha pouco, porque não tem quem os faça trabalhar em casa, quem os acompanhe e não tem acesso a explicações(uma actividade parasita da ineficácia organizativa e pedagógica da escola). A escola portuguesa não será justa enquanto não puder proporcionar a todos os alunos condições para aprenderem e para vencerem as dificuldades que vão encontrando pelo caminho. Enquanto não se passar de uma escola que assume como principal missão ensinar, para uma escola onde se estuda, trabalha e aprende muito mais. Uma escola que se sinta mais responsável pelas aprendizagens dos alunos, onde os alunos aprendam a ser muito mais responsáveis. Existem bons exemplos de escolas públicas portuguesas que se esforçam por garantir que os seus alunos aprendem, num esforço para se tornarem escolas verdadeiramente inclusivas. Mas é um esforço por vezes duríssimo, porque faltam meios de apoio, porque a organização da escola coloca inúmeros obstáculos e porque grande parte dos meios que poderiam ser utilizados para o sucesso dos alunos são consumidos com repetências quase sempre inúteis. Se queremos ter uma escola mais eficaz e democrática não podemos continuar a ir buscar soluções exclusivamente ao passado, como faz Paulo Portas. Porque esse passado é responsável pela exclusão educativa, social e cultural que tem penalizado o nosso país. Olhemos antes para o modo como o problema do insucesso escolar tem sido resolvido por essa Europa fora, e para os caminhos já percorridos em Portugal, com medidas como a estabilidade do corpo docente, a possibilidade de gestão do currículo, ou para os esforços e experiências positivas existentes por esse país fora. Só com esse olhar sobre o conhecimento poderemos construir um futuro mais democrático.

Ana Maria Bettencourt

5.12.07
 
"PISA 2006 - Competências Científicas dos Alunos Portugueses".

No site da CONFAP de hoje: (http://www.confap.pt/desenv_noticias.php?ntid=748)


Relatório Nacional Pisa 2006












O Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE) disponibilizou no seu endereço electrónico a primeira versão do relatório nacional do PISA [ Programme for International Student Assessment] 2006.

Intitulado PISA 2006 – Competências Científicas dos Alunos Portugueses, esta versão preliminar pretende ser uma primeira análise aos resultados dos desempenhos médios dos alunos portugueses nas diferentes áreas de avaliação do PISA 2006.

O director do GAVE, Carlos Pinto-Ferreira, avança, na nota de apresentação do documento, que o presente relatório pretende atingir três objectivos:

- apresentar de forma clara, concisa e sugestiva, os resultados dos desempenhos dos estudantes portugueses no ciclo de 2006 do PISA,
- aprofundar uma perspectiva já iniciada em 2003, de sugerir comparações de desempenhos entre ciclos, propiciando uma visão dinâmica dos resultados e
- levar a efeito a análise desses resultados em confronto com elementos sócio-económicos e culturais do meio envolvente, cujas repercussões nos desempenhos são, de há muito, reconhecidas.

O principal objectivo deste programa de avaliação de estudantes é testar as competências dos alunos de 15 anos nas literacias de leitura, de matemática e de ciências e resolução de problemas.
Esta terceira edição do PISA envolveu em Portugal 173 escolas, divididas entre 155 públicas e 18 privadas, e 5.109 alunos, distribuídos do 7.º ao 11.º ano de escolaridade.

Literacia em Ciências
Portugal apresenta um valor de 474, o que compara com 459 em 2000 e 468 em 2003.

Literacia em Leitura
O valor de 2006 (472) é superior ao de 2000 (470), mas inferior ao de 2003 (478).

Literacia em Matemática
Os 466 pontos de média verificados agora repetem o valor de 2003, continuando acima de 2000, quando o desempenho médio dos alunos portugueses foi de 459.


Para ver o relatório:
http://www.gave.min-edu.pt/np3content/?newsId=156&fileName=relatoriopisa2006versao1.pdf



3.12.07
 
Morreu o Quim Bairrão
Morreu o Quim ou, se preferirem, o Prof. Joaquim Bairrão Ruivo. Não merecia, tão cheio de vida, de saber e de vontade de partilhar esse saber. Não merecíamos nós, os amigos. Não merecia o mundo da educação e da psicologia. Não sei se estamos todos mais pobres, como é costume dizer nestas ocasiões, mas estamos certamente todos muito mais tristes.

M.E.B.S.