Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

8.12.07
 
PP E AS SOLUÇÕES DO PASSADO
Paulo Portas e as soluções do passado
Paulo Portas criticou o secretário de estado Jorge Pedreira por este ter dado, como uma das explicações para os maus resultados escolares dos alunos portugueses nos testes PISA, o elevado número de "chumbos". Jorge Pedreira invocava o facto de os testes, ao serem realizados a alunos com uma determinada idade, e não em função do ano de escolaridade que frequentam, penalizarem necessariamente os alunos que ficaram retidos um ou mais anos, na medida em que há conceitos, conteúdos e competências que ainda não adquiriram. Os alunos portugueses que estão no ano correspondente à sua idade obtêm nos testes PISA resultados acima da média.
Há estudos que mostram que as repetências fragilizam os percursos escolares e são factor de desmotivação.
Hoje a retenção não é, na maioria dos casos em que é aplicada entre nós, nem uma medida de justiça, nem uma medida pedagógica válida. É sim um caminho para tornar as turmas mais homogéneas e fáceis de gerir, e um processo para continuar a afastar muitos alunos da escola.
Mas não é o caminho para uma Educação para Todos.
É claro que muitos professores utilizam a retenção considerando-a como medida de justiça. Em grande parte dos sistemas educativos europeus, e sobretudo naqueles que obtêm melhores resultados nos testes PISA, não existem chumbos. O que existe em geral são modalidades muito eficazes de apoio aos alunos. De actuação aos primeiros sinais. E estes sistemas são bem mais justos e democráticos do que o nosso. E constituem um instrumento sólido do desenvolvimento social e económico desses países. Creio que o país e as crianças portuguesas ficariam a ganhar se se substituísse o chumbo, como medida de regulação das dificuldades de aprendizagem, por um enquadramento mais eficaz dos alunos na escola pública, se os alunos trabalhassem muito mais na própria escola, tivessem muito mais apoios, inclusive nas próprias aulas. Uma grande parte dos alunos portugueses trabalha pouco, porque não tem quem os faça trabalhar em casa, quem os acompanhe e não tem acesso a explicações(uma actividade parasita da ineficácia organizativa e pedagógica da escola). A escola portuguesa não será justa enquanto não puder proporcionar a todos os alunos condições para aprenderem e para vencerem as dificuldades que vão encontrando pelo caminho. Enquanto não se passar de uma escola que assume como principal missão ensinar, para uma escola onde se estuda, trabalha e aprende muito mais. Uma escola que se sinta mais responsável pelas aprendizagens dos alunos, onde os alunos aprendam a ser muito mais responsáveis. Existem bons exemplos de escolas públicas portuguesas que se esforçam por garantir que os seus alunos aprendem, num esforço para se tornarem escolas verdadeiramente inclusivas. Mas é um esforço por vezes duríssimo, porque faltam meios de apoio, porque a organização da escola coloca inúmeros obstáculos e porque grande parte dos meios que poderiam ser utilizados para o sucesso dos alunos são consumidos com repetências quase sempre inúteis. Se queremos ter uma escola mais eficaz e democrática não podemos continuar a ir buscar soluções exclusivamente ao passado, como faz Paulo Portas. Porque esse passado é responsável pela exclusão educativa, social e cultural que tem penalizado o nosso país. Olhemos antes para o modo como o problema do insucesso escolar tem sido resolvido por essa Europa fora, e para os caminhos já percorridos em Portugal, com medidas como a estabilidade do corpo docente, a possibilidade de gestão do currículo, ou para os esforços e experiências positivas existentes por esse país fora. Só com esse olhar sobre o conhecimento poderemos construir um futuro mais democrático.

Ana Maria Bettencourt

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