Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

25.6.06
 
Felizmente há ... a Barraca !
A propósito da discussão recente sobre o ensino da Literatura no Secundário e a leitura de obras completas no 3º ciclo, espero que a peça de Luis de Sttau Monteiro "Felizmente Há Luar" ainda seja lida na escola.

Vale a pena ver - e levar os meninos a ver - a encenação feita pelo Helder Costa na Barraca com a Mª do Céu Guerra numa comovente Matilde.

Permite muitas leituras e explorações : desde a histórica literal (século XIX) à histórica a um segundo nível (por que razão teria sido retomado o tema nos anos 60 do século XX) . Por outro lado poderá ser interessante comparar o texto encenado com o texto escrito e procurar as razões de cortes e adaptações. Funcionará como uma introdução à escrita dramática.

Maria Emília Brederode Santos

21.6.06
 
A Educação Sexual na Escola
Face à polémica gerada o ano passado por uma notícia publicada no semanário Expresso que referia a existência de um programa oficial de educação sexual onde constariam orientações pedagógicas muito questionáveis, o Ministério da Educação solicitou ao Conselho Nacional de Educação (CNE) que se pronunciasse sobre o modelo curricular a adoptar nos programas de Educação Sexual a serem desenvolvidos em meio escolar e nomeou um grupo de trabalho, coordenado pelo Prof. Daniel Sampaio, para proceder ao estudo e propor os parâmetros gerais dos programas de educação sexual, na perspectiva da promoção da saúde escolar.
Passado um ano, procurámos fazer o ponto da situação. A síntese das principais conclusões do Parecer do CNE e do Grupo de Trabalho e o artigo de Maria Isabel Baptista, que nos dá conta dos projectos que têm vindo a ser apresentados pelas escolas, mostram que há ainda um longo caminho a percorrer no modo com a escola pode ajudar os jovens a integrarem plenamente no seu desenvolvimento as questões da sexualidade.
E como um debate que se não pode deixar de ter na actualidade, agora que o PRACE (Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado) diz que quer avançar, volta-se a levantar a questão dos Serviços Educativos de Apoio às Escolas.
Estes e outros temas são tratados em www.inquietacaopedagogica.blogspot.com


A Educação Sexual na Escola

Parecer do Conselho Nacional de Educação*

O Parecer do CNE reitera que a Educação Sexual em meio escolar é uma componente da área de Formação Pessoal e Social, que se enquadra na educação em valores e para os valores e recomenda ao Ministério da Educação as seguintes linhas de acção:
- Definir uma matriz curricular global de abordagem da Educação Sexual no contexto dos conteúdos programáticos dos ensinos básico e secundário;
- Valorizar o papel das famílias na implementação da Educação Sexual em meio escolar;
- Considerar as diversas componentes de Formação Pessoal e Social prioritárias na formação inicial e contínua de professores;
- Reformular os materiais curriculares existentes;
- Aperfeiçoar o modelo transdisciplinar da Educação Sexual;
- Criar uma nova área curricular não disciplinar que integre diversas áreas de Formação Pessoal e Social, incluindo a Educação para a Sexualidade, a Educação para a Saúde e a Educação Cívica;
- Ancorar a Educação para a Sexualidade no projecto educativo das escolas;
- Desenvolver e consolidar mecanismos de acompanhamento e avaliação de experiências e projectos de Educação Sexual em meio escolar.

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* Parecer nº 6/2005 de 27 de Outubro

Propostas do Grupo de Trabalho de Educação Sexual*

O Relatório Final do Grupo de Trabalho de Educação Sexual (GTES), coordenado pelo Prof Daniel Sampaio, apresentado em 31 de Outubro de 2005, propõe uma série de medidas para tornar mais efectiva a Educação Sexual/Educação para a Saúde em meio escolar, de entre as quais se destacam:
- A Educação Sexual deve ser integrada numa nova dinâmica curricular de Promoção e Educação para a Saúde;
- A Educação para a Saúde deverá assumir carácter obrigatório;
- A participação dos pais é considerada crucial em colaboração com a escola;
- O estudo, reorganização e revitalização dos curricula das disciplinas dos 1º, 2º e 3º ciclos do ensino básico na perspectiva da Educação para a Saúde é preconizado;
- As áreas curriculares não disciplinares podem ser aproveitadas para a abordagem da Educação para a Saúde em função das características da escola e dos docentes disponíveis com formação adequada;
- Deverá ser eleito em cada escola um professor responsável pela área de Educação para a Saúde;
- No ensino secundário deverão ser criados Gabinetes de Atendimento para as questões da Saúde em articulação com o Centro de Saúde da área da escola.

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* Nomeado pelo Despacho do Ministério da Educação n.º19 737/2005, de 15 de Junho de 2005



Projectos de Educação para a Saúde: múltiplas abordagens

Maria Isabel Baptista*

Quando em 1986, a carta de Otava estabeleceu o conceito de Promoção da Saúde, lançou um marco importante ao reforçar a importância de cada indivíduo na gestão da sua própria saúde e na sua relação positiva com o meio. Esta importância reconhecida ao indivíduo converge com a Lei de Bases do Sistema Educativo, quando no seu número 5. do Artigo 2º, enuncia que a educação promove o desenvolvimento do espírito democrático e pluralista (…) formando cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de se empenharem na sua transformação progressiva.

Dito isto, Educação e Promoção da Saúde são consonantes, pois ambas têm em vista a capacitação do indivíduo. Apenas se torna necessário que as instituições competentes se apropriem deste referencial teórico e o ponham em prática.

Foi este o desafio que o Grupo de Trabalho de Educação Sexual (GTES)[1] entendeu lançar às escolas, através de um Edital, convidando-as a elaborar um plano de trabalho, compreendendo aspectos, tais como, uma proposta de concretização das temáticas da educação para a Promoção da Saúde (…).

E as escolas responderam. De todo o país chegaram-nos projectos, esboços de vontade em pôr em prática o que deve ser prioritário: desenvolvimento de competências nos jovens, de modo a estes serem capazes de activar recursos em momentos críticos e/ou ainda, tomarem opções conscientes e responsáveis.

Passando em revista a generalidade dos projectos, podemos constatar que a maioria das escolas conhece o enquadramento legal em matéria de Educação, Promoção da Saúde e Educação Sexual. Citam-no frequentemente, como fundamentação de determinadas actividades. Para muitas escolas, o Relatório Preliminar do GTES já constituiu uma base de reflexão e, simultaneamente, uma base de partida para a construção de novos projectos e/ou reformulação dos projectos em curso. Uma primeira conclusão a retirar é pois, a de que há saberes e tem havido reflexão em torno do tema, o que confere consistência aos projectos.

Outro aspecto emergente é a designação dada aos projectos. Algumas escolas optam por designações mais ou menos formais, como Educação para a Saúde, Sexualidade na Adolescência, Educação para a Sexualidade e Promoção da Saúde e, em alguns casos, estas designações surgem associadas ao exercício da cidadania no espaço escola / comunidade, o que deixa antever uma visão abrangente da promoção da saúde. Outras optam por designações menos neutras como Crescer bem, crescer saudável, Promove a tua saúde!, Espaço J, Clube Saúde (…) . No entanto, todas as designações apresentam em comum um conjunto de referenciais atinentes à filosofia da Promoção da Saúde.

Quanto às metodologias referidas para a concretização desta área, são as mais diversas: pesquisa, interpretação de documentos, role playing, dossiers temáticos, técnicas de assertividade, etc… A lista é exaustiva e o denominador comum são as metodologias activas e participativas. Há escolas que dispõem de uma página na Internet, onde os projectos da área da saúde são divulgados e têm um contador do número de visitantes. Dessas, algumas consideram que é uma forma de avaliar o grau de adesão da comunidade em geral às actividades e iniciativas lançadas pelas escolas.

Questionamo-nos sobre os conteúdos da Educação para a Saúde, onde são eles ministrados e qual o tipo de avaliação?

Com efeito, a maioria refere as Áreas Curriculares não Disciplinares (ACND), sobretudo a Área de Projecto e a Formação Cívica, como espaços privilegiados para o tratamento deste assunto. Além do aproveitamento das ACND, muitas escolas seleccionam os principais temas da Educação para a Saúde para serem trabalhados nas diferentes disciplinas. Assim, em Geografia, por exemplo, a abordagem do assunto sobre Contrastes de desenvolvimentos -Países desenvolvidos/países em desenvolvimento – indicadores e obstáculos de desenvolvimento, é pretexto para falar de métodos anticoncepcionais, planeamento familiar, afectos e valores. Poderíamos citar outros exemplos, mas o que importa reter é que a Educação para a Saúde é abordada de forma transversal, ou seja, está presente nos programas das várias disciplinas, mas também é objecto de estudo/trabalho continuado, quando abordado nas outras áreas. Quanto à avaliação, esta incide muito sobre grelhas de observação, inquéritos e relatórios.

Em rigor, ainda pouco sabemos do impacto desta área na formação integral do aluno. Parece-nos, contudo, que há uma preocupação na avaliação das acções numa perspectiva qualitativa, que sendo estruturada e constantemente aferida permite a redefinição do plano de trabalho para os anos seguintes.

Os parceiros principais são os pais e as estruturas da saúde. No entanto, algumas escolas – diremos até muitas…- vão mais longe, abrem-se para o exterior, para a comunidade, chamam outros parceiros à escola e a própria comunidade participa da vida da escola, particularmente em eventos especiais, como sejam, o Dia do Não Fumador, Dia Mundial da Luta contra a Droga, e no lançamento de concursos. São escolas que manifestam possuir uma longa tradição de trabalho em parceria. Muitas delas desenvolveram esta prática, enquanto membros da Rede Nacional de Escolas Promotoras de Saúde.

Cada escola tem o seu responsável perfeitamente identificado. Porém, várias optaram pela constituição de uma equipa responsável, uma equipa multidisciplinar, onde se inclui um representante do Centro de Saúde e um aluno. Parece-nos uma estratégia perfeitamente adequada ao fortalecimento da capacitação dos jovens na tomada de opções saudáveis e da responsabilização da escola em todo este processo de ensino-aprendizagem.

Em síntese, da globalidade dos projectos poderemos dizer que é patente a preocupação das escolas pela formação integral dos jovens, assumindo pois as características de uma escola total, onde as fronteiras entre a Educação para a Saúde e a Cidadania se esbatem em favor do Ser Cidadão.

*Professora requisitada na DGIDC ( Direcção Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular) e membro do GTES

Publicado no Jornal de Letras - Educação

 
gRANDE dEBATE SOBRE eDUCAÇÃO EM sETÚBAL
Dia 22 de Junho (amanhã) às 21 h terá lugar, nos claustros do Instituto Politécnico de Setúbal, uma sessão de lançamento do Debate Nacional sobre Educação, organizado pelo CNE em colaboração com a Câmara Municipal de Setúbal e com o Instituto Politécnico. A intenção destas sessões é suscitar a participação de cidadãos e instituições na reflexão em torno da questão : "Como podemos melhorar a educação e a escola em Portugal?"
Interessa ouvir todos e, em particular, aqueles e aquelas que geralmente não se pronunciam sobre educação.

O tema desta sessão em Setúbal é :

Que saberes, que competências serão necessários para o cidadão do século XXI e como pode a escola promover essas competências com qualidade e equidade ?

Carvalho da Silva, Liseta Barbosa, Maria Belo, Octávio Carmo Costa e Viriato Soromenho Marques serão algumas das vozes que se farão ouvir. E a sua ?

A entrada é livre e a participação de todos é bemvinda !

Maria Emília Brederode Santos

20.6.06
 
SERVIÇOS DE APOIO ÀS ESCOLAS SIM OU NÃO, COMO E QUAIS?

M.J.Rau

Em 1999 foi publicado um texto de José Madureira Pinto* aonde, de uma forma que considerei perfeita, por ajustada e integradora, se referia o que há muito eu sentia como uma evidência que poucos, estranhamente, levavam a sério. O texto com o sugestivo título "NOTAS SOBRE O SOFRIMENTO NA SALA DE AULA E POSSÍVEIS MODOS DE ATENUAR" apareceu no Boletim da Direcção Regional de Educação do Norte e nele, depois de descrever muitos dos "sofrimentos" para os que vivem na e para a escola, se diz a certa altura "... Perante as diversidade e complexidade dos problemas que aqui se colocam, não vejo como se possa continuar a prescindir de um acompanhamento regular dos estabelecimentos de ensino por equipas pluridisciplinares (formadas por técnicos de saúde, psicólogos, sociólogos, assistentes sociais, diplomados em Ciências da Educação e outros especialistas na área das Ciências Sociais) com capacidade de entrosamento efectivo nos territórios educativos. Não ignoro os custos associados à manutenção de serviços profissionalizados com esta ambição; mas não tenho dúvidas em garantir que a sua acção implicaria, a prazo, uma redução sensível de custos sociais, que, na ausência de inovações deste tipo, se vão relevando insustentáveis". E ainda mais adiante e reforçando "quanto ao argumento de que serão demasiado elevados os encargos decorrentes do tipo de medidas preconizadas, só sei responder que, desde sempre, as mudanças políticas, ou as mudanças de política impuseram redefinições de prioridades orçamentais".

Num momento em que se repensa e se reestrutura a administração pública, se pretende acabar com sobreposições e dispersões ineficazes e se investe na qualidade da formação e do desempenho, é importante não esquecer que há custos sociais que resultam em gravosos custos financeiros e que se os reduzirmos conseguimos, simultaneamente, importantes "economias e eficácias".

Sempre me inquietou a sobreposição de redes e serviços e, sobretudo, a excessiva especialização e o desperdício que decorre, sempre com o argumento da prioridade e especificidade, de estruturas de apoio compartimentadas, seja para o desporto escolar ou a para a saúde nas escolas, seja para a orientação educativa ou as necessidades educativas especiais, seja para a inovação mesmo que nas novas tecnologias, seja ainda para a formação contínua de professores e todos os mais compartimentos e feudos que se foram criando, iam morrendo e logo depois voltavam a ressurgir muitas vezes com diferentes designações.
Mas não se deite fora o menino com a água do banho. O apoio interdisciplinar especializado (por equipas de profissionais) aos alunos, professores e escolas é um imperativo que tem tradição e acção relevante em muitos dos países com que convivemos, com que nos comparamos e a que estamos unidos. Vejam-se as boas e as más experiências. Reflicta-se nos sucessos e nos resultados e o caminho por certo se iluminará!

Não é uma questão fácil num momento de reestruturação/redução da administração pública. Preocupa as "Inquietações Pedagógicas" que vê, com inquietação, que esta matéria não tem estado na ordem do dia e sobre a mesa das análises e dos debates e receia que venha a ser esquecida ou menosprezada. A ela também voltaremos!

*Professor Catedrático da Faculdade de Economia da Universidade do Porto
Publicado no Jornal de Letras - Educação

13.6.06
 
Notícia
O ECD continua a ser fonte de grande contestação por parte de sindicatos... três pontos de que se tem ouvido falar muito:
O acesso condicionado à categoria de professor titular
O facto de a avaliação dos professores determinar o ritmo da progressão na carreira
A participação dos pais na avaliação dos professores

12.6.06
 
Apresentação do livro "Écrans em Mudança"
ABRANTES, J.C. (coord.), Écrans em Mudança – Dos Jovens na Internet ao Provedor da Televisão,Lxª, Livros Horizonte, Col. Media e Jornalismo, 2006.

Apesar de as investigações relatadas nos dois primeiros capítulos deste livro (de Jacques Piette, coordenador da investigação sobre “os jovens e a internet”, quer no Canadá quer a nível internacional, e de J.C. Abrantes, coordenador em Portugal) terem já meia dúzia de anos e incidirem sobre um meio em expansão aceleradíssima - a Internet – este é um livro extremamente actual que vai ao encontro de questões que estão hoje a ser intensamente debatidas na sociedade portuguesa :

Como explicar e ultrapassar as dificuldades e deficiências da escola portuguesa ? Será a escola portuguesa uma escola “transbordante”, com excesso de tarefas e de missões e que, por isso, acaba por não cumprir a sua função essencial de transmissão de conhecimentos ? Ou, pelo contrário, será uma escola “minimalista”, demasiado centrada nos saberes académicos e que esquece as aprendizagens fundamentais da vida , o aprender a ser, a criar e a viver com os outros ?

Ora os resultados da investigação portuguesa sobre o uso das NTIC e da internet revelam que a escola cumpre melhor o seu papel educativo no que respeita ao acesso às NTIC do que outras instituições com um papel educativo como por exemplo as famílias. Mas com limitações : acesso sim, mas não regular; pouca utilização como recurso pedagógico, utilização sobretudo em espaços não lectivos (sala de informática, centro de recursos, etc.) com pouco enquadramento docente e portanto incluindo “chats” e jogos – o que no Canadá seria impossível (situação que é aliás criticada pelos investigadores canadianos que a consideram “uma excessiva domesticação pedagógica da internet”).

Em Portugal poderá existir, pelo contrário, uma excessiva liberdade no uso da internet ?
O que é certo é que mais uma vez se fala nos perigos deste novo meio de comunicação e mais uma vez se apela à Educação para os Media que se atribui, claro, à escola ! O capítulo II incide justamente sobre a “educação dos públicos”, abrindo com um historial de Jacques Gonnet que regista as várias tendências existentes da "Educação para os Media" para defender uma abordagem pela produção a levar a cabo pela escola. Ora esta “educação mediática” poderia ser realizada pelos media, especialmente pela tv se esta assumisse a sua função educativa, coisa que de modo algum acontece, como lamenta Marçal Grilo no capítulo “Televisão : educação ou deseducação?”

Geneviève Guicheney, provedora de programas da France Télévision, relata-nos a sua experiência no Capítulo III deste livro. Fica-nos a reflexão :a criação recente em Portugal da figura do provedor do telespectador na RTP poderá ser uma porta de entrada para a tv começar a fazer educação para os media ?


Maria Emília Brederode Santos

11.6.06
 
Boas-vindas à escola a tempo inteiro !
Saudemos o anúncio feito pela Ministra da Educação da "escola a tempo inteiro" : que, a partir do próximo ano lectivo, todas as escolas do 1º ciclo funcionem até às 17:30, oferecendo 25 h curriculares semanais e 10 h semanais de "enriquecimento curricular" (de oferta obrigatória pelas escolas mas não de frequência obrigatória pelas crianças) a gerir pelas escolas, tirando partido dos recursos existentes localmente.

De facto, o horário das escolas de 1º ciclo, mesmo ou sobretudo as de turno único, não se coadunava minimamente com as condições de vida actuais. O seu alargamento era assim indispensável e o modo como vai ser feito parece-me satisfatório para todas as partes :

. Enriquece e diversifica as aprendizagens das crianças;
. Obriga o Estado/as escolas mas não as crianças e suas famílias;
. Não vem sobrecarregar os professores;
. Reforça a autonomia curricular das escolas;
. Favorece o aproveitamento dos recursos extra-escolares existentes no meio;
. Co-responsabiliza escolas, autarquias e famílias, concretizando o tal provérbio índio - "É preciso uma aldeia inteira para criar uma criança"- que a Hillary Clinton relançou.

Mas também deve haver problemas e inconvenientes. Uma carta ao director do Público, assinada por Mª José Metello de Seixas e publicada a 7 de Junho, levanta alguns problemas relativos à rede escolar e às condições do trabalho de equipa dos professores nas escolas. Sem serem impeditivas da medida, são certamente questões a ter em conta.

Maria Emília Brederode Santos
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9.6.06
 
Escola a Tempo Inteiro
Escola a Tempo Inteiro

Nunca esquecerei as lágrimas do João, 13 anos, que suplicava que o deixassem ir trabalhar, ficar em casa... não suportava a escola. Tinha crescido num meio muito isolado, tinha frequentado uma escola do 1º ciclo muito pequena...não conseguia adaptar-se a uma cidade de média dimensão. Sentia-se mal nas aulas, nos recreios....

Este aluno tinha encontrado no conselho executivo as melhores boas vontades, tinha professores muito empenhados, mas a resolução de casos como o do João - que veio depois a abandonar precocemente a escola - não pode passar por um somatório de boas vontades ou pelo esforço de professores isolados, mesmo que muito competentes. Tem de passar por profundas mudanças a nível organizativo e pedagógico.
É claro que o João tinha um passado escolar que o penalizava muito, que tornava o seu caso muito difícil. Penso no entanto que precisamos de ser capazes de dar respostas adequadas à população que temos, com as histórias escolares que possuem.
É muito grave a falta de eficácia da escola no enquadramento, apoio e resolução dos problemas daqueles que encontram dificuldades pelo caminho.
A escola portuguesa funciona bem, para os que aprendem bem, mas abandona, de forma inaceitável, muitos alunos.
Antes estavam fora da escola. Hoje estão lá, mas a escola não lhes dá as respostas adequadas. Aprendem pouco. Apesar de terem professores que durante toda a sua vida foram bons professores. Professores que sabem muito.
Pessoalmente penso que as principais causas justificativas da ineficácia da escola não residem nos professores mas sim na organização escolar.
Precisamos de uma escola a tempo inteiro, mais responsável pelos percursos escolares dos seus alunos.
Nunca entendi como se considerava normal/aceitável que a escola não fosse a tempo inteiro. Que os planos que iam existindo não dessem prioridade à ruptura com o modelo existente, nos horários das escolas, nos equipamentos escolares, na formação dos professores, nos ritmos e organização da vida escolar.
A escola a tempo inteiro é essencial para que os professores não sejam injustamente encarados pela sociedade, como os bodes expiatórios de uma organização que não funciona e de que todos somos responsáveis.
Acredito que não somos menos capazes do que os outros países europeus.
Penso que precisamos de uma escola mais rica culturalmente em que os alunos trabalhem mais e sejam mais apoiados, e em que os professores sejam capazes de trabalhar em equipa para resolver de forma eficaz os problemas do insucesso e do abandono escolar.
Uma escola a tempo inteiro é uma escola mais responsável pelos percursos escolares dos seus alunos. Não esquecendo de deixar à sociedade o que é da sociedade...

Ana Maria Bettencourt

5.6.06
 
Sonhar com a autoridade perdida e regressar ao passado
Este podia ser o título de muitos dos artigos e intervenções televisivas dos últimos dias.
Algumas das intervenções são proferidas por pessoas promovidas a especialistas da escola, que são pais e avós (e só a esse título ou como antigos alunos conhecem a escola) que curiosamente consideram que os encarregados de educação não se podem pronunciar sobre os professores. Estes mesmos que não se coíbem todavia de emitir opiniões sobre os professores e sobre a escola. Mais,... verifica-se que de uma só penada resolveriam todos os problemas de que o país e em particular as escolas sofrem. No caso da indisciplina e da violência bastaria regressar ao passado e reencontrar a autoridade perdida. Bastaria dar mais autoridade aos professores e o ideal seria mesmo “que estes soubessem inspirar medo nos alunos”. Gostaria de ver algumas destas pessoas com responsabilidades em algumas escolas......

Nem se dão ao trabalho de ir ver que existem muitas soluções para os problemas que “tão bem” diagnosticam, em curso em Portugal e noutros países do espaço europeu por exemplo. E, se as soluções não devem ser importadas, pelo menos devem servir para que pessoas tidas como “especialistas” entendam que os problemas são complexos e exigem soluções organizativas e pedagógicas que não se compadecem com os palpites....

Há muitas pessoas que sonham com o regresso ao passado. Que defendem que os problemas de indisciplina se resolvem sem repensar a organização da aula e do trabalho escolar, bastando para isso que o professor saiba organizar a sua retórica e saiba mandar calar os alunos. Estes métodos podem efectivamente conseguir o silêncio de alunos, mas não são métodos úteis nem para melhorar a qualidade das aprendizagens nem para a democracia. Regra geral essas pessoas não conhecem a escola de hoje, não conhecem escolas onde estes problemas foram resolvidos, apesar de grandes dificuldades.
Na procura de bodes expiatórios surge o Ministério da Educação.....É patético o discurso que atira para o Ministério da Educação a responsabilidade pela resolução dos problemas de indisciplina e violência. Uma lei aprovada há cerca de dois anos pela AR sobre o estatuto do aluno necessitaria de ser alterada para que os problemas se resolvessem! E as escolas? Qual o seu papel?
Tenho defendido neste blog, que a autoridade do professor e da escola é essencial enquanto meio de aprendizagem e defesa da democracia, e condição para que se possa trabalhar bem. Defendo que é necessária autoridade dos conselhos executivos, associada a mais autonomia para a resolução de problemas como a indisciplina e o insucesso escolar. É também necessária mais autoridade das chefias intermédias, designadamente dos directores de turma, e dos professores. Mas grande parte da solução dos problemas que existem hoje passa por novas estratégias organizativas e pedagógicas. Estratégias que visem resolver problemas. Conheço exemplos de excelentes professores que souberam gerir uma autoridade democrática baseada na criação e cumprimento de regras claras e de leis e no desenvolvimento de uma vida escolar baseada no estudo, no trabalho rigoroso, na entreajuda, na pesquisa, no desenvolvimento do sentido crítico, procedimentos pedagógicos essenciais para escapar ao laxismo e ao autoritarismo. O resultado é bem mais interessante do que a via do medo. Conseguem-se melhores ambientes escolares, em que se trabalha mais, se aprende melhor, se aprende a compreender e cumprir as leis e a praticar a democracia.
A solução dos problemas educativos é complexa. Por isso ela deve partir da reflexão sobre as realidades concretas de hoje e ser enriquecida pela pedagogia. Choca-me a arrogância com que certas pessoas que tenho por inteligentes e cultas, ignoram o contributo da pedagogia e o esforço de professores que no terreno resolvem bem muitos problemas.
É indispensável que se entenda que “o regresso ao passado não tem futuro” porque os alunos são diferentes, a relação com o conhecimento mudou profundamente nas nossas sociedades e a escola tem hoje novas missões .

Ana Maria Bettencourt

4.6.06
 
A RAIZ DE TODO O MAL
Chego a Portugal e não reconheço o meu pacífico país. O ambiente é de guerra civil opinativa:

. Nos Prós e Contras economistas septuagenários parecem querer recuperar a revolução cultural de Mao ateando fogo aos maiores de 50 anos que tão caro saiem ao país e que serão "a raiz de de todos os males" futuros da juventude.

.Nos jornais diz-se que a Ministra da Educação acusou os professores de serem os responsáveis pelo insucesso escolar dos alunos (não ouvi o discurso e se a Ministra disse isso os professores devem sentir-se extremamente injustiçados e revoltados. Mas a ministra terá razão se tiver dito que a escola não se assume como responsável pelo percurso educativo dos alunos, isto é, perante o insucesso educativo revelado por certos indicadores nem o Ministério nem as escolas nem o sistema educativo têm sabido encontrar caminhos diferentes que ajudem realmente os alunos em dificuldades e todos a aprender mais e melhor).

. Na RTP uma reportagem com câmara escondida revela a indisciplina, a desordem e a violência numa sala de aula, no momento em que a mesma Ministra anuncia uma proposta de estatuto da carreira docente que incluiria na avaliação dos professores um contributo dos pais. O momento não podia ser pior ! E uma medida tão polémica e discutível não é apresentada com argumentos que a fundamentem minimamente. Não teria sido mais útil começar por ajudar as escolas a auto-avaliarem-se tendo em conta os resultados nos exames e outras provas e aí sim recolhendo o contributo dos pais e até, de preferência, o dos alunos ? Acresce que há estudos e experiências a nível europeu (e que incluiram escolas portuguesas) que podem fundamentar e orientar este processo.

. Nos debates subsequentes em vários canais televisivos e nos jornais,sucedem-se os disparates, as acusações, a procura de bodes expiatórios e mesmo os apelos à violência.

O mais grave é que esta gritaria histérica não é "conversa de taxista" (como contundentemente lhe chamou Daniel Oliveira) mas de professores universitários e investigadores em Ciências Sociais, logo imitados e repetidos por comentadores televisivos. O que só prova como de facto o ensino em Portugal está em muito maus lençois... Porque se a situação actual apresenta de facto grandes dificuldades provocadas em parte pela expansão - necessária e desejada - do ensino a seguir ao 25 de Abril, que dizer de um ensino selectivo e elitista que só conseguiu produzir estas mentalidades simplistas e bárbaras ? E como debater, reflectir e agir com racionalidade e ponderação quando o que "está a dar" é o histerismo ruidoso e violento ?

Maria Emília Brederode Santos

3.6.06
 
Site do Grande Debate
Do CNE : Convite à Participação

"O Debate Nacional sobre Educação, promovido pela Assembleia da República e pelo Governo e organizado pelo Conselho Nacional de Educação, foi publicamente apresentado no dia 22 de Maio.
A sua primeira fase decorrerá até final de Setembro e centra-se na promoção do Debate em todo o país do modo mais descentralizado possível, sendo todos os cidadãos e todas as instituições chamados a participar activamente, através do envio de contributos para o CNE.
Para facilitar este processo foi criado um espaço na Internet, onde poderá expressar a sua opinião, reagir a outras intervenções ou divulgar as suas iniciativas.
Todos estes contributos ficarão disponíveis para consulta e serão posteriormente devolvidos à sociedade, de forma sistematizada.
A sua participação é importante!
Deixe o seu contributo em

http://www.debatereducacao.pt"

1.6.06
 

1 de Junho de 2006- Dia Mundial da Criança

Interrogações em torno da responsabilidade social sobre as crianças

Pensa-se ainda muitas vezes por aí que as crianças são pertença dos pais e que são estes que devem garantir as condições para que se desenvolvam. Para que aprendam. Que as crianças são seres sem direitos. Considera-se que os pais são legitimamente “gestores de palmadas” desde que leves....Felizmente que a leis estão a mudar para garantir os direitos das crianças, mas não chega.
O que pode a escola fazer mais? E as outras estruturas? Como articular esforços e não “empurrar” as responsabilidades para a entidade seguinte, como se não fossemos todos responsáveis? O que andamos nós a fazer neste país?...como é possível que aconteçam a violência e as barbaridades que temos ouvido por aí?
Como podemos nós todos ser responsáveis por um crescimento harmonioso de todas as crianças?
Ana Maria Bettencourt