Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

31.7.05
 
Porque é que Salazar nos governou durante trinta e tal anos?
A Srª Ministra da Educação colocou na Internet um documento que titulou"Política Educativa e Organização do Ano Lectivo 2005/2006". É um documentode muitas páginas porque está escrito em letras com corpo 28. A Srª Ministra chamou os Presidentes dos Conselhos Executivos das Escolas, reuniu-se com eles para detalhar este documento que é apresentado, em tópicos, na Web e, ao que parece, cada Presidente tem a sua versão o que não abona em nada a clareza da exposição. Neste documento a Srª Ministra divide o horário dos Professores em duas componentes:lectiva e não lectiva. Vinte eduas horas (2º, 3º ciclos) de componente lectiva e treze de não lectiva. Nosvários exemplos que dá de horários para os docentes, aparecem sempre sete horas atribuídas ao trabalho individual das treze não lectivas. As outras seis horas distribuem-se por reuniões e por trabalho no estabelecimento. Entende-se por trabalho individual o trabalho de correcção de testes e detrabalhos e o trabalho de preparação de aulas. Esperará o leitor e esperava eu que os próprios Presidentes dos Conselhos Executivos explicassem, indignados, à Srª Ministra que, por exemplo, um Professor de Português com cinco turmas, terá, numa semana típica, quarenta ou sessenta composições para ver, ou quarenta ou sessenta trabalhos de outro estilo, ou ainda quarenta ou sessenta testes para ver. Esperará o leitor, também, que os Presidente Executivos, ciosos defensores dos seus docentes, gritassem apopléticos que, para além disto, o dito Professor ainda teria as aulas para preparar. Nestas condições as treze horas de componente não lectiva não seriam demais para este trabalho. Seria razoável pensar que a Srª Ministra dissesse qualquer coisa como: "e quem vos garante que os professores são assim tão cumpridores?". Nessa altura, rasgando as suas vestes, os Presidentes dos Conselhos Executivos diriam, ultrajados: "tem V.Exª SrªMinistra um instrumento chamado Avaliação de Desempenho que poderá regulamentar como quiser e, com ele, poder-se-á verificar quem é bom profissional ou não e premiar quem o é e penalizar quem o não é". Orgulhosos do dever cumprido, regressariam os Presidentes dos Conselhos Executivos às suas escolas. Pois é, mas não foi isso que aconteceu. Imagine o leitor que os Presidentes voltaram, aplicaram, o que deveria ser um exemplo, como regra e, alguns, mais papistas que o Papa, queriam já obrigar os Professores a corrigir os testes e a preparar as aulas na própria Escola. Os Sindicatos timidamente informaram o óbvio: o que está na Internet não vale como lei e mais não disseram. Os Professores ficaram quietos e calados e... foram para férias...e a Srª Ministra sorriu. Lançou um balão de ensaio e... as forças vivas daNação fizeram o resto. A própria estratégia de lançar um documento com exemplos que lhe permitiria recuar se a contestação fosse forte, não foi necessária usar. Agora, tranquilamente emitirá uma portaria e tudo ficará bem.Neste documento é também dito que as acumulaçoes só serão autorizadas até um limite máximo de seis horas. Perguntará o leitor:"porquê seis horas?" Ora bem a portaria que ainda está em vigor que regulamenta estas coisas permite uma acumulação até seis horas para o ensino superior e de dez para o não superior (Portaria nº 652/99). Ou a Srª Ministra não teve tempo de ver a alínea do não superior ou achou que o anterior legislador era burro e que ensino superior ou não superior é tudo a mesma coisa. Esperaria o leitor que as Escolas que contrataram professores, em regime de acumulação, já para o próximo ano lectivo se juntassem num coro de protestos contra esta disrupção do seu trabalho e que as associações representativasdo sector lavrassem protestos indignados. Seria razoável pensar que a SrªMinistra dissesse que, a acumulação privado-público, para além dedeterminado limite lesaria o desempenho dos docentes. Esperaria então oleitor que as forças vivas que eu invoquei, em uníssono e indignadasdissessem qualquer coisa como: "Srª Ministra, nos países com um desenvolvimento que nós não sonhamos, como por exemplo os Estados Unidos daAmérica, estão-se borrifando para quem faz o quê e como, fora do seu horáriode trabalho, desde que cumpram diligentemente os seus deveres laborais e que, para isso, têm uma real avaliação de desempenho, não podemos portanto pagar por uma incapacidade atávica da Administração Pública de avaliar quem quer que seja, para além disso, um professor, se lhe der na bolha ir trabalhar para um bar, noite fora, pago a recibo verde, pode-o fazer, se for para fazer trabalho docente já não o pode e ­ diriam as ditas forças de dedo em riste "­ se a Srª Ministra quer dedicação exclusiva pague-a como já oEstado paga aos médicos". Poderiam, nesta altura, as forças vivas dizer cinicamente: "...já que não pagou aos professores que corrigiram as provas nacionais do básico".Pois é...mas não foi isso que aconteceu. As Escolas calaram-se e, a ser verdade o que apareceu no jornal "O Público" de 28 de Julho o SecretárioGeral da AEEP (Associação dos Estabelecimentos do Ensino Particular) declarou que este novo regime de acumulação não afectaria o ensino particular porque, dos 50 000 docentes deste regime, só (?) 3000 estariam em regime de acumulação. Os sindicatos congratularam-se com a medida porque esta iria criar mais emprego(?)...e...mais uma vez...a Srª Ministra sorriu.
João Rangel de Lima

 
Política Educativa e Organização do Ano Lectivo 2005/2006
fonte: Ministério da Educação, publicado a 18 de Julho de 2005
ver mais> http://www.min-edu.pt/ftp/docs_stats/Orientações%20organização%20ano%20lectivo%202005-2006.pdf

30.7.05
 

Competências

Pedro Lourtie
Os resultados dos exames de Matemática do 9º ano, as peças que li na comunicação social e o que ouvi, suscitaram-me algumas reflexões que depois transponho para o ensino superior.
Ver mais > http://www.diarioeconomico.com/edicion/noticia/0,2458,654979,00.html

29.7.05
 

Entrevista a Lopes da Silva
Universidades com gestão eficiente podem receber mais dinheiro
O novo Presidente do Conselho de Reitores, Lopes da Silva, propõe a introdução de critérios de eficiência pedagógica.
Ver mais > http://www.diarioeconomico.com/edicion/noticia/0,2458,655023,00.html

28.7.05
 
Livros para a 2ª estação da vida
Para a infancia e pré-adolescência - entre os 3 e os 13, digamos - eu escolheria a obra de Luisa Ducla Soares que tem livros tanto para mais pequenos (por exemplo o bricalhão "Todos no Sofá") como já para pré-adolescentes. No meio ficam livros como as "Seis Histórias às Avessas", os deliciosos "Poemas da Mentira e da Verdade" ou o "Abecedário Maluco". São sempre histórias ou poemas formativos mas com imenso humor - ou até, melhor dizendo, formativos através do humor. E, brincando com as palavras, ajudam a tomar distância em relação à língua e portanto a dominá-la melhor, além de lançarem as bases da apreciação literária.

A obra de Luisa Ducla Soares está a ser reeditada pela Livraria Civilização Editora. Entretanto ela vai sempre produzindo textos novos pelo que a "obra completa" está longe de o estar, felizmente !

27.7.05
 
.Novo Presidente do CNE
Tomou posse, na Assembleia da República, o novo presidente do Conselho Nacional de Educação, Prof. Júlio Pedrosa .

O seu perfil dialogante e a sua experiência como professor, reitor e Ministro da Educação do último governo socialista permitem-nos prever que terá
uma visão ampla e activa do papel do CNE.


M.E.B.S. e T.G.

 
Um novo público : os menores de 3 anos
As crianças com menos de 3 anos quase não existem em termos de brinquedos e livros. É tudo para maiores de 3 anos ! E, no entanto, a partir de um ano uma criança consegue reconhecer uma emoção, seguir um fio de história. É a minha experiência.


Cá em casa o primeiro livro a fazer sucesso era um daqueles que se desdobram e vão revelando imagens inesperadas : no nosso caso, a inofensiva rãzinha da capa ia-se transformando em tartaruga, lagarta, dinosauro... até chegar a um terrível, um tenebroso, um enorme crocodilo, com uma grande boca e muitos dentes afiados. Ui que medo ! E o medo ia sendo ultrapassado pela repetição e pelas gargalhadas.

Depois foi a história de um esquilo que não lavava os dentes e ai, ai, ai , chorava o esquilo agarrado à bochecha com uma grande dor de dentes que, claro tratada por um esquilo dentista, acabou por passar (também deixou a mensagem de que é preciso lavar os dentes o que é bom mas aqui para o caso nem era o mais importante !)

Com o passar dos meses, as histórias vão-se tornando um bocadinho mais complicadas. Isto para além daqueles livros mais de observação de imagens e de reprodução de situações do quotidiano que ajudam a desenvolver o vocabulário e a estruturar o dia-a-dia.

Agora (22 meses) a grande paixão é "A toupeira que queria saber quem lhe fizera aquilo na cabeça". Aqui a emoção -reconhecível e exteriorizável como as anteriores - é a zanga. A toupeira está zangada porque quando ia a sair de casa debaixo da terra alguém lhe fez "aquilo" na cabeça. E, nuns desenhos deliciosos, a toupeira vai confrontando diversos animais com a sua pergunta e aprendendo como são diferentes os "cócós" - tratando assim com humor um problema desta idade em que se começa a tentar deixar as fraldas.

Ou seja : há um "público" com menos de 3 anos com exigências próprias mas capaz de apreciar muitíssimo livros que correspondam a essas exigências e a outras que têm a ver com o lado "físico"dos livros (tamanho, tipo de papel, etc.)

Ah e atenção : A editora da "Toupeira" é KALANDRAKA e não o nome que erradamente lhe dei no post anterior.

Maria Emília Brederode Santos

26.7.05
 
Leituras de Verão ... para todas as estações da vida!
Eis algumas recomendações de leituras de Verão para 5 estações da vida :

Para a 1ª estação que constitui o "público novo" dos menores de 3 anos : "A toupeira que queria saber quem é que lhe fizera aquilo na cabeça", Ed. Mandraka;

Para a 2ªestação - a infância - recomendo qualquer obra da Luisa Ducla Soares . A Livraria Civilização Editora está a reeditar-lhe a obra completa.

Para a 3ª estação - adolescência, juventude - recomendo a "Guerra e Paz" de Leão Tolstoi que está a ser traduzida directamente do russo e publicada pela Presença.

Para a 4ª estação - a idade adulta - o VIII volume da História de Portugal coordenada por José Matoso, intitulado "Portugal em Transe" e da autoria de José Medeiros Ferreira (e aqui claro que tenho de fazer uma declaração de interesses...)

Para a 5ª estação - maiores de 60 anos - a biografia de Pierre Auguste Renoir pelo seu filho Jean Renoir e intitulada "Pierre Auguste Renoir, meu pai" e editada pela Bizâncio.

Em próximos posts fundamentarei estas escolhas e desenvolverei o tema dos "novos públicos" (os menores de 3 anos e os maiores de 60).

Maria Emília Brederode Santos

21.7.05
 
Despedida do Presidente do CNE
Foi hoje a despedida do Professor Manuel Porto que terminou funções como Presidente do Conselho Nacional de Educação.

Foi um Presidente eficaz (conseguia muitas vezes "meter o Rossio na Rua da Betesga"!), que geriu com inteligência as diversas sensibilidades presentes no Conselho e assegurou a sua independência. Internamente deixou uma marca calorosa e de espírito verdadeiramente humanista.

Maria Emília Brederode Santos
Teresa Gaspar

20.7.05
 
Bestial!!! 70% de níveis negativos!!! Conseguimos!!!
O que se pretende com uma prova nacional, afinal?
Avaliar conhecimentos?
Avaliar técnicas?
Avaliar conceitos?
Talvez tudo isto, não será assim?
Atendendo ao que se disse atrás e a que:
1) não pode haver nenhum esclarecimento de dúvidas durante a prova,
2) os professores correctores não sabem quem é o aluno cuja prova estão acorrigir,
3) cada aluno está habituado à linguagem do professor que teve, pelomenos, ao longo do ano, como se deve fazer, então, uma prova de matemática a nível nacional?
Fazem-se perguntas dirigidas a cada tipo de item que se pretende avaliar(conhecimento, técnica ou conceito), evitando misturá-los:
1) se um deles depender do outro para a continuação do exercício,
2) se dois coexistem forçando a que se dominem ambos para responder àpergunta.
Fazem-se perguntas claras sem termos ambíguos.
Fazem-se exercícios em que não se sobrecarregue a atenção, não exigindo que,simultaneamente, se sigam várias indicações.
Fazem-se perguntas que avaliem apenas as competências que são exigidas noprograma.
Ora a prova de Matemática da 1ª chamada do 9º ano (feita pela esmagadora maioria dos alunos) conseguiu a proeza de cometer todos estes erros:
Numa pergunta de cálculo de probabilidades, os alunos que tenham um baixo factor espacial erram-na (menos 6 pontos) mesmo que dominem a fórmula de Laplace, porque têm de fazer uma contagem de objectos num desenho em perspectiva.
O que se avalia então nesta pergunta?
Numa outra pergunta pede-se um número irracional entre 4 e 5. Nos critériosde correcção do próprio Ministério sugere-se como resposta correcta "pi +1".
Ora, para um aluno do 9º ano, "pi + 1" não é um número mas sim uma expressão numérica, logo, se pensou nesta solução, poderá não a escrever pora julgar errada. Menos 5 pontos.
No capítulo da proporcionalidade inversa pede-se, primeiro, o preenchimento dum quadro e, na alínea seguinte, a escolha dum gráfico de acordo com o quadro.
Um aluno que se engane e considere, por exemplo, que a área é a de um triângulo, preenche o quadro para o dobro da constante de proporcionalidade e há um gráfico - o "D" ­ que corresponde a este engano.
O aluno enganou-se por se ter precipitado na leitura da primeira alínea, tem zero e muito bem, mas, depois, tem zero na segunda alínea e até sabe fazer corresponder o gráfico à situação. Menos 5 pontos.
Há uma pergunta sobre aproximações em que se não diz para usar a aproximação do número "pi" que está no formulário que é fornecido.
Se o aluno não usar a aproximação do formulário tem a resposta errada e, como é uma pergunta de escolha múltipla, não pode explicar o seu raciocínio. Menos 5 pontos.
Numa pergunta de trigonometria pede-se em simultâneo:
o cálculo em metros do comprimento da rampa, o resultado arredondado até aos décimos, e aconservação de 4 casas decimais nos cálculos intermédios.
A desatenção a qualquer destas indicações fará perder de 1 a 4 pontos.
Finalmente no problema envolvendo volumes de sólidos, pede-se uma competência que não vem expressa no programa de Matemática nem nas competências essenciais do "Currículo Nacional do Ensino Básico": a relacionação de fórmulas. Talvez por isso não tenha conseguido encontrar um único manual em que esta competência seja exigida. Menos 8 pontos.
Sucessivos estudos têm demonstrado que o nível conceptual e relacional dos alunos portugueses, em Matemática, é muito baixo. Com uma prova nacional com erros deste calibre, juntam-se, ao enorme exército de alunos com dificuldades conceptuais e relacionais, aqueles que, não as tendo, foram vítimas do que atrás se disse.
A pergunta mais interessante, portanto, será: o que é que se pretendeu comesta prova? Entretenha-se o leitor a conjecturar respostas.
João Rangel de Lima
Publicado no jornal A Capital a 17 de Julho

18.7.05
 
Educação Ambiental
Domingo, passeio a pé pela lindíssima mata do Buçaco. Seguimos os trilhos indicados, de uma riqueza imensa em termos de património natural e histórico, e que nos conduzem a pontos de vista fabulosas. São passeios que exigem pouco esforço físico constantemente compensado pela beleza. No percurso a pé cruzámo-nos com pessoas, na esmagadora maioria estrangeiras. Nos pontos com acesso de carro e nos locais indicados para pic-nic, os portugueses abundavam.
Lembrei-me que a primeira vez que subimos ao Pico do Pico sem guia, seguimos um roteiro muito claro, escrito por um cidadão inglês e lembrei-me também as vezes sem conta que nos temos cruzado com estrangeiros nos trilhos açoreanos. É certo que já temos encontrado portugueses, mas é bem menos frequente, e é pena. É pena que grande parte dos portugueses conheça mal a paisagem ou a conheça sobretudo de carro.
Acredito que a educação ambiental deve ser desenvolvida em contacto com a natureza. “A escola sai pouco da escola” para ter contacto com o ambiente e com a cultura. Para promover o conhecimento e o gosto pela natureza...para ensinar a preservar o ambiente e o património. Para formar cidadãos activos e intervenientes. Para desenvolver competências de observação, essenciais na promoção da cultura científica.
É importante que a escola promova a educação ambiental para que as crianças adquiriram novos hábitos, seduzam os pais para novas práticas, e sejam, no futuro, mais críticas e activas no combate aos atropelos ambientais.
Ana Maria Bettencourt

17.7.05
 

(Não sei como me dirigir ou a quem me dirigir. Aqui fica a fórmula consagrada:)

Caros colegas,

Sou professor de Matemática na Escola EB 2, 3 Luís de Sttau Monteiro, em Loures, e colaboro num blog colectivo
(http://blogdosindocentes.blogspot.com/), no qual postei o seguinte que gostaria de partilhar convosco:


Quarta-feira, Julho 13, 2005

Exame de Matemática: 2 episódios
1º:Pedro: Ó setor, tive 3, que nota preciso de ter no exame para não chumbar?Sérgio: Setor, não vale a pena, já lhe expliquei mais de 100 vezes que ele pode ter uma nota qualquer que passa sempre, mas ele não acredita!!...O Sérgio teve a melhor nota da escola no exame de Matemática e, como ele sabia muito bem, não precisava de se ter esforçado.2º:Quando acabaram as aulas do 9º, combinei com os alunos e continuei a vir às aulas para tirar dúvidas e/ou treiná-los para o exame. Disse-lhes que, como não eram aulas convencionais, podiam trazer os amigos que quisessem.De turmas de 26, nunca me apareceram mais do que 10 alunos. E uma vez não me apareceu ninguém.Para já, não tiro conclusões. Deixo-as para vocês.

Domingo, Julho 17, 2005

Exame de Matemática: 2 episódios (II)
Volto a este meu post de 13 de Julho.O que terá levado o Sérgio que tinha 5 a tirar 5 no exame, ou a I. e a N. (que tiveram, respectivamente 5-3 e 3-1), ou os meus outros 28 alunos de 47 que baixaram de um nível? O professor, a escola, a matéria ensinada, ou o exame eram os mesmos...Quanto mim, esta é a questão crucial de todo o ensino-aprendizagem!Se soubermos a resposta talvez possamos mudar alguma coisa.E não me venham com a história da simpatia pessoal. Escolhi estes 3 exemplos não por acaso: o Sérgio nunca teve nenhuma relação significativa comigo, a I. não gostava lá muito de mim (não se coibiu de me acusar à frente da mãe que eu não os tinha preparado para o exame, numa tentativa clara de fugir às suas responsabilidades), enquanto a N., que eu conhecia há anos do meu trabalho voluntário, simpatiza muito comigo.Características pessoais de inteligência? Os 3 são muito inteligentes.Antecedentes familiares? Poupem-me!Diferenças de requisitos prévios, seja lá o que isso queira dizer? Tive estes 3 alunos pela 1ª vez este ano e tanto o Sérgio como a I. são alunos de 5.Então?Eu ponho uma hipótese: motivação pessoal para a excelência, mais conhecida por BRIO, profissional e pessoal!E como se consegue isto em muitos mais alunos?Ponho outra hipótese: exemplo, mas exemplo vindo de todos os lados, não só dos professores.Exemplo na exigência profissional consigo próprios, exemplo no cumprimento de regras e leis, exemplo na satisfação pessoal por um trabalho bem feito,...Ouviram, classe política?Ouviram, classe empresarial?Ouviram, automobilistas que são pais destes alunos?Ouviram? TODOS!Nota de rodapé: a percentagem de alunos meus que passaram no exame foi superior à média nacional (29,3%): 36,2%. Não é um resultado de que me sinta orgulhoso.




Vale de alguma coisa isto que escrevi para a descoberta e proposta de caminhos para o sucesso dos nossos alunos? Não sei.

Continuem com o vosso blog e obrigado pela atenção.

Rui

 

Acabo de descobrir o vosso blog e logo com o post sobre o Paulo Abrantes e ainda por cima escrito por uma pessoa de que há muito não ouvia falar.



É bem verdade que tenho andado afastado de quase tudo mas, muitas vezes, ainda vou às recordações das aulas de Psicologia Pedagógica e Seminário arranjar energia para continuar.



É pena não terem aberto os comentários, pois este é um óptimo processo de se discutir algumas ideias.



Os meus melhores cumprimentos



Cecília

15.7.05
 
In memoriam Paulo Abrantes
A homenagem ao Paulo Abrantes, ontem, na Faulddade de Ciências, foi muito comovente. Gostei de ver a exposição, de ouvir o Eduardo Veloso e outros, de sentir o carinho com que a Associação de Professores de Matemática, o departamento de educação e o centro de investigação da Faculdade de Ciências organizaram tudo e de encontrar tantos ex-colegas e amigos. Mas mais do que tudo adorei "conhecer" o irmão mais velho do Paulo que o recordou numa conversa que nos levou a todos tanto às gargalhadas como às lágrimas. Fiquei com pena de não ter conhecido melhor essa dimensão mais humana do Paulo.Embora a sua dimensão profissional de educador nos esteja a fazer muita falta !

Maria Emília Brederode Santos

Podem enviar comentários para inquietacoes_pedagogicas@hotmail.com

11.7.05
 
ENSINO PÚBLICO VERSUS ENSINO PRIVADO
Em Maio passado saiu no jornal “Público“ um artigo de Vital Moreira, oportuno e certeiro, com o título “Ensino Básico a Tempo Inteiro”. Nele afirmava-se que “o horário reduzido das escolas do 1º ciclo do ensino básico constitui um dos grandes factores de discriminação social e de privatização furtiva desse grau de ensino”. Poderia ter dito mais: os horários e o funcionamento da maioria das escolas de todos os ciclos do Ensino Básico público constituem um convite sedutor e justificado para o ensino privado.

O que pode levar os pais, na sociedade portuguesa de hoje, a optarem pelo ensino privado sempre que essa alternativa existe:
- a qualidade no desempenho escolar dos alunos confirmada, nomeadamente, pelos resultados nos exames nacionais;
- os horários de funcionamento regulares e ajustados - ou com condições de se ajustarem - aos horários das famílias, em que, cada vez mais, ambos os pais trabalham;
- a existência, dentro da escola ou com ela articulada, de outras actividades (música, desporto, língua estrangeira, etc.) que “compete” hoje uma criança ter, e do apoio ao estudo (trabalhos de casa!) que a família já não tem tempo para prestar;
- a segurança com base na certeza que a escola se responsabiliza pelos seus filhos entre a hora de entrada e a hora de saída;
- a confiança em saber que há um professor responsável e que acompanha o seu filho e uma entidade – a direcção da escola - que quer saber e sabe do que se passa com ele, nem que seja para o manter como aluno ou para o expulsar porque a “incomoda”;
- saber que se trata de uma escola para a vida, desejavelmente do pré-escolar ao secundário, em que a criança e o jovem conhecem os seus amigos e professores e os pais não têm que, no final de cada 2, 3 ou 4 anos, interrogar-se sobre o seguimento e sequência da educação formal dos seus filhos;
- a preferência por determinada escola, perfeitamente justa e legal, decorrente ou de uma opção religiosa, de um interesse cultural ou educativo, ou do desejo efectivo de selecção social. Como dizia um meu amigo londrino: os meus filhos andam na escola privada (public scholl!) porque eu não quero que eles venham da escola pública a falar com aquele “linguajar” que nem eu percebo!

Ora se há alguns destes razões a que a escola pública não pode nem deve aspirar e que têm que ver com as opções das famílias, outras há a que tem de dar resposta, quer alterando claramente o mandato das escolas, quer articulando-se íntima e consistentemente com o sistema de tempos livres, quase todo ele também subsidiado pelo Estado, seja ele de iniciativa da própria escola ou dos pais, ou venha da já ampla oferta privada solidária.

As medidas anunciadas pelo governo de estabilidade do corpo docente, de refeições escolares, horários alargados e ensino do inglês no 1º ciclo podem constituir já parte da resposta. Mas só parte, faltando ainda muito para o todo!

É, sobretudo, importante que num tempo de contenção financeira não se prescinda, mais uma vez, de redefinir o papel e as responsabilidades da escola e de rentabilizar recursos disponíveis e não se somem despesas e se dupliquem serviços.

Não posso deixar de referir um dos programas a que, na Europa, é reconhecido maior sucesso no combate ao abandono e ao insucesso escolar, o “Excellence in Cities” em escolas públicas do Reino Unido, em que das medidas mais emblemáticas são a apoio individual de cada aluno mal ele começa a sentir a primeira dificuldade (os “learning tutors”) e a atenção dispensada, mesmo em meios desfavorecidos, às crianças mais dotadas.

Termino de novo com um excerto do mesmo artigo de Vital Moreira:“Urge tomar as medidas adequadas, incluindo as necessárias mexidas no ordenamento da rede escolar e no regime laboral dos professores e demais pessoal. As escolas existem para os alunos e não para os professores”. Só acrescentaria: e também não devem existir para as vicissitudes do Ministério da Educação e dos seus compartimentados serviços educativos, para as hesitações e desregulação nas transferência de competências entre autarquias e administração central, e para o difícil processo de articulação das atribuições educativas e sociais entre o Ministério da Educação e o da Segurança Social.
Maria José Rau

Publicado no jornal A Capital a 10 de Julho

6.7.05
 
Pequenas coisas que fazem a diferença...
-Gatinho de Cheshire ... És capaz de me dizer, por favor, que caminho devo seguir para sair daqui?
-Isso depende muito de para onde queres ir, respondeu o Gato.
-Tanto me faz..., disse Alice.
-Então não interessa que caminho tomas, disse o Gato.
-Desde que chegue a algum sítio, acrescentou Alice, à laia de explicação.
-Quanto a isso, não há dúvida, disse o Gato, se caminhares o suficiente.
(Carroll, L., in Alice no País das Maravilhas,Ed. Ambar, Porto, 2003)

Este diálogo, que descreve um dos encontros da viagem atribulada de Alice, no País das Maravilhas, veio-me à lembrança a propósito da “cena” (usando a linguagem dos alegados participantes) ocorrida, recentemente, numa praia cerca de Lisboa.
Mas o que é que a Alice, o gato, e os simbólicos e fantásticos interlocutores que a foram surpreendendo e inquietando no seu sonho têm a ver connosco e com essa situação, perguntarão?
Têm tudo! Em primeiro lugar, a Alice, que se encontra numa encruzilhada e que tendo a percepção de se saber perdida e sem saber para onde quer ir, ou como o conseguir, mas que tem a humildade de pedir ajuda ao primeiro gato que lhe aparece!
Depois, o gato sábio, devolvendo-lhe com outra pergunta – para onde queres ir? - a responsabilidade/protagonismo da decisão na escolha do seu futuro. E que, em seguida, desinteressando-se (aparentemente) do problema, lhe responde que, quem anda à deriva, vai até onde as pernas (e não a cabeça) o leva.
Também, no que se refere à imigração e à interculturalidade, há pequenas coisas que fazem a diferença. Neste caso, o ponto de interrogação!.
É que, mais importante do que as respostas, são as perguntas! E nenhum dos actores (todos nós) está dispensado de (se) questionar sobre a forma como recebemos e acolhemos os imigrantes e os seus filhos.
Os que se dizem “indiferentes” devem questionar-se se o seu alheamento não esconde alguma xenofobia, e se não pode contribuir para agravar tensões sociais, sempre agudizadas em épocas de crise
Os de nós que rejeitam “os de fora” devem perguntar-se se este país funcionaria sem o contributo dos que decidiram abandonar a sua terra, e com o seu trabalho contribuir para desenvolver este país?.
E os decisores talvez possam perguntar-se “O que ficou por fazer para integrar os imigrantes?” E porquê?
Finalmente todos os que, tal como a Alice, se encontram perdidos nas encruzilhadas da vida, deverão interrogar-se se atitudes de protesto ou rejeição mais ou menos violentas resolvem problemas, ou se contribuem para agravar as (enormes) tensões que todas as desigualdades sociais geram, especialmente em tempos de crise.
Há uma outra “pequena coisa” que, para problemas como estes, faz a diferença é apostar numa Educação que de forma continuada e serena ajude (todos) professores e alunos, produtores e “consumidores” de media, famílias e organizações, a aprenderem com o Gato de Cheshire a pôr questões que façam os outros pensar!

Isabel Ferreira Martins
ACIME (Alto-Comissariado para Imigração e Minorias Étnicas) / Entreculturas

Publicado no jornal A Capital a 3 de Julho

5.7.05
 
Temos o que merecemos?
Fim de ano lectivo, tempo de balanço… E nem sequer será preciso fazer grandes esforços de análise para perceber que há questões que exigem um pouco mais da nossa atenção. “De boas intenções está o inferno cheio!” é o que mais me tem ocorrido ultimamente, perante algumas situações da vida escolar com que me tenho deparado. A mais recente está relacionada com a chamada área de Estudo Acompanhado.

Já todos sabemos que os alunos têm no seu horário um espaço em que usufruem do apoio de professores para, em termos sintéticos, aprenderem a estudar, estudando. Até aqui nada haveria a estranhar, tanto mais que era comummente aceite que um dos problemas geradores de insucesso era o facto de os alunos não saberem estudar. Poder-se-ia talvez objectar a obrigatoriedade de frequência destas sessões por todos, mesmo aqueles que nitidamente não necessitam delas e que, além disso, ainda têm de o fazer por sucessivos anos ao longo do seu percurso escolar. De qualquer modo, tudo parecia correr bem, tendo-se até tornado uma medida que acolhia a simpatia de pais, alunos e professores.

O que os criadores deste espaço curricular provavelmente não previam é que a prestação dos alunos também aqui viesse a ser avaliada como o é nas outras áreas ou disciplinas. Parecer-nos-ia lógico que os progressos desta se revelariam nos melhores resultados das restantes. Eis senão quando, numa qualquer ânsia de eficácia (ou de rigor?!), surge nas escolas nova directiva, logo no início deste ano lectivo, desta vez obrigando à atribuição de uma menção qualitativa neste domínio! Estranhamente, mais uma vez não há registo de grande contestação: será que os professores já se habituaram a receber as instruções mais díspares que se possa imaginar? Será que se cansaram de tentar fazer-se ouvir? Ou tão-só esgotaram toda a energia disponível no preenchimento de quilos de papel que mais não fazem que embotar o discernimento?

Ora, se bem o disseram, melhor o fizeram! O que se esperaria, então, que significasse um “Não Satisfaz” na área de Estudo Acompanhado? Seríamos naturalmente levados a pensar que o aluno em questão ainda não estaria de posse das necessárias competências de estudo e que esta condição certamente que transportaria sérias repercussões para seu aproveitamento, em geral. Pois não é o que acontece. Numa ocasional revisão de pautas, tive a oportunidade de verificar, com alguma perplexidade, que não só havia crianças que tinham transitado com “positiva” à maioria das disciplinas, apesar do “não satisfaz” do Estudo Acompanhado, como chegaram até a atingir níveis superiores em algumas delas.

Felizmente que houve o bom senso de contraditar a medida pseudo moralizadora da atribuição de uma nota com a sua total irrelevância para efeitos de transição de ano, o que faz com que ela tenha um mero efeito (in)estético no conjunto das avaliações de um aluno. Por outras palavras, emitiu-se uma norma para “inglês ver” (leia-se, tudo será rigorosamente avaliado), para seguidamente anular os seus efeitos através de um mecanismo menos transparente em termos de opinião pública (leia-se, não tem qualquer efeito sobre a passagem ou retenção do aluno).

O verdadeiro significado da nota atribuída, não cheguei a saber qual era. O que é legítimo deduzir é que há várias formas de contestar as regras arbitrariamente impostas e nem sempre compreendidas e que elas acabam por ter um tratamento correspondente à consideração que merecem.



Maria Ribeiro


Publicado no jornal A Capital a 3 de Julho

4.7.05
 
Cidadania rima com educação
Os processos de desenvolvimento local, em que as comunidades procuram e constróem respostas para os seus problemas a partir das suas próprias capacidades e, portanto, do reforço da sua autonomia, instituem-se como processos privilegiados de aprendizagem colectiva. É no contexto de processos deste tipo que cidadania e educação estão condenados a coincidir. É desta temática que se ocupa a obra intitulada “Inovação, cidadania e desenvolvimento local”, organizada por José Alberto Correia e Rui d’Espiney, editada pelo Instituto das Comunidades Educativas (ICE). O livro apresenta, por um lado, algumas experiências de intervenção local em que as dimensões educativas são potenciadas por dinâmicas fortes de participação, de que é exemplo a experiência de “orçamento participativo” desenvolvido na Câmara Municipal de Palmela, num texto assinado por Ana Vicente. Por outro lado, a obra reúne um conjunto muito diversificado de textos, da autoria de um leque muito alargado de autores, que reflectem sobre temas como: a relação entre a saúde e o desenvolvimento (António Cardoso Ferreira e J. Diegues), processos de animação comunitária (Orlando Garcia), Associativismo (Manuel Matos), educação ambiental (Philippe Meirieu) ou educação no meio rural (Rui d’Espiney).
Um dos aspectos mais estimulantes da leitura deste livro corresponde ao modo como, ao mesmo tempo que valoriza a acção concreta, produz um exercício de análise crítica sobre o vocabulário utilizado e que, uma vez entrado na linguagem comum como objecto de “consenso”, tende a transformar-se em slogans vazios de sentido. Sobre a importância desta reflexão relativamente ao modo como pensamos com as palavras, é de destacar o notável texto assinado por Mia Couto e que nos convida a sermos produtores e não meros consumidores do pensamento alheio sobre os problemas que nos dizem respeito. Este esforço de elucidação é igualmente marcante nos textos da autoria de José Alberto Correia, quer na nota de introdução, quer no texto em que (com João Caramelo) desenvolve a noção de “cosmopolitismo comunitário”. Mas talvez a chave para compreender como podem rimar educação e cidadania tenha de ser encontrada nas questões fundadoras que, num texto a ler atentamente, Guy Berger equaciona: o que são, e como se articulam de modo fértil, a democracia, a participação e a cidadania? Não haverá, nunca, respostas definitivas para estas questões, mas estamos condenados a procurá-las e construí-las, num trabalho sempre inacabado que combina uma dimensão teórica e uma dimensão prática, contra uma estrutura social que tende a querer fechar-nos “num presente sem futuros”. A importância deste livro para os que se empenham numa acção educativa de sentido transformador reside no seu contributo para contrariar o conformismo e nos incentivar a problematizar o futuro. Como escreveu Ivan Illich, a mudança social começa quando se instala no cidadão a dúvida. A leitura e divulgação deste livro pode ser um bom princípio.
Resta assinalar que o local escolhido para a apresentação pública da obra, perante um auditório repleto e atento, não poderia ter sido mais feliz: o, recentemente criado, Museu da Cidade de Almada, edifício belo e funcional, onde os interessados poderão visitar uma exposição, “ir à escola” sobre a história do ensino em Almada, da qual foi editado um excelente catálogo.

Rui Canário

Publicado no jornal A Capital a 3 de Julho

3.7.05
 
“Estes Difíceis Amores"
No seu último programa da Antena 1, “Estes Difíceis Amores”, interrompido para férias o professor falou em Educação. Aqui está um excerto de Freud, que citou e que me apeteceu partilhar. Não encontramos de muito novo, não é verdade? Apenas os quase 100 anos que nos distam deste pensamento do autor

Bom fim-de-semana



Fátima Forreta





“O que se pretende quando se quer esconder às crianças – ou aos adolescentes – as explicações sobre a vida sexual dos seres humanos? Teme-se despertar precocemente o seu interesse por essas coisas, antes que surja de forma espontânea? Espera-se com tal dissimulação conter a sua pulsão sexual até ao dia em que poderá percorrer as únicas vias que lhe são abertas pela ordem burguesa? Quer isso dizer que as crianças não mostrariam nenhum interesse ou compreensão pelos factos e enigmas da vida sexual se para tal não lhes fosse chamada a atenção por alguém do exterior? Crê-se possível que os conhecimentos que são recusados não lhes sejam fornecidos de outra maneira? Ou na realidade deseja-se, real e seriamente, vê-los considerar mais tarde tudo o que diz respeito ao sexo como algo de vil e abominável, de que os pais e os educadores os tentaram manter afastados tanto tempo quanto possível?”

Freud. Que não era propriamente um libertário:). Em 1907…

2.7.05
 
Os estágios na formação dos professores
A propósito do texto de Maria Odete Valente sobre a formação dos professores desenvolvida pelas universidades.

O modelo defendido nesse texto tem certamente bastante mérito, mas terá sido considerado pelo governo um modelo de difícil sustentação.
Actualmente, no nosso país, coexistem essencialmente dois modelos de formação inicial, que se distinguem fundamentalmente pelo modo como se articula a componente de prática docente no plano de estudos. O modelo integrado inclui a prática no currículo desde o 1º ano, crescendo em tempo e em responsabilidade até ao último ano, antes da aquisição do diploma. A prática é tutorizada e desenvolve-se em turmas cujos professores “acolhem” os estudantes. No modelo agora em apreço, a componente prática constitui um ano de trabalho numa escola, de responsabilidade plena, embora também tutorizada.

As razões que presidem às decisões de um lado e à defesa do modelo do outro lado não são suficientemente conhecidas. Seria possível não deitar fora o menino com a água do banho ? Como? O que representa neste caso o menino?
Que estudos existem sobre os modelos que temos de formação inicial de professores? Que alterações devem ou podem ser introduzidas sem que se ponha em causa o essencial? Como valorizar o que um e outro modelo têm de bom, sem que subsistam as desigualdades hoje existentes, em que os candidatos a professor inseridos num dos modelos de formação são remunerados e os outros não?
Seria por outro lado importante que as razões para alteração da situação existente fossem mais conhecidas.
O que é certo é que a situação da formação de professores mudou radicalmente entre um tempo em que havia lugar para todos os estudantes que se formavam e uma situação em que existem dezenas de milhares de candidatos a professor, com formação profissional concluída, sem qualquer hipótese de inserção no mercado de trabalho, e em que consequentemente as turmas atribuídas aos estagiários são encaradas como factor de menos oferta de trabalho para os já diplomados nos vários modelos de formação.

Pessoalmente, batemo-nos há muitos anos para que, ao serem colocados numa escola, os professores em início de carreira beneficiem de um acompanhamento pelas instituições de formação, no seu primeiro ano de trabalho.
Seria o Ano de Indução, existente em vários países e que pode ser decisivo para reforçar práticas, corrigir erros e também potenciar a energia e os conhecimentos dos jovens professores. Em Portugal já foram ensaiadas algumas experiências nesse sentido que morreram, por falta de condições administrativas e de apoio.
Independentemente dos modelos de formação, e cremos que não seria desejável reduzir a formação toda a um único modelo, o Ano de Indução seria decisivo para colmatar deficiências sempre encontradas nessa primeira situação de responsabilidade plena nas escolas.
 Este poderia constituir um dispositivo que tirasse partido da experiência e conhecimentos consolidados e das capacidades de liderança de professores seniores, reforçando o funcionamento do trabalho em equipa nas escolas;
 Este pode ser um caminho para suprir dificuldades da formação, para o qual existem recursos (instituições, pessoas e capacidade de acompanhamento directo e produção de meios on-line...);
 Seria essencial, porém, aprofundar o conhecimento sobre os programas e os modelos de formação inicial existentes no país, promover a qualidade, valorizar as diferenças e combater as desigualdades nas condições de formação.

Ana Maria Bettencourt; Maria José Martins