Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

29.3.06
 
Conferência “ Que Prioridades para Portugal? ”
Estudos Temáticos para Preparação do Próximo Ciclo de Intervenções Estruturais
A estratégia de Portugal para o próximo ciclo de intervenções estruturais comunitárias é o tema da Conferência a realizar nos dias 29 e 30 de Março de 2006, iniciando um exercício de divulgação e promoção do debate em torno da preparação do próximo período de programação financeira da União Europeia 2007-2013.
Promovida pelo Observatório do QCA III, esta iniciativa reunirá um vasto conjunto de especialistas para aprofundar e suscitar a reflexão prospectiva sobre a intervenção das políticas públicas de desenvolvimento em Portugal no horizonte 2007 - 2013. O debate será organizado em torno de quatro temas: “Inovação e Desenvolvimento”, “Cidades e Território”, “Qualificação e Inclusão Social”, “Qualidade das Instituições”. Cada um deles desenvolver-se-á a partir da apresentação das conclusões de um conjunto de estudos temáticos realizados por equipas universitárias para o Observatório do QCA.
A Conferência realiza-se na Sala Tejo do Pavilhão Atlântico, em Lisboa, sendo a participação livre e gratuita, embora sujeita a inscrição prévia e limitada à capacidade da sala.
As inscrições podem ser feitas através do endereço electrónico ls@cunhavaz.com
ou pelo telefone 213 121 197.

 
"Eduquês", "cientês" e alguns porquês
Notícia do Público de 23 de Março

Carla Machado
A educação vai mal, já o sabemos. Os diagnósticos abundam, "novas" soluções recriam velhas receitas e sucessivas medidas vão sendo ensaiadas em sucessão tão vertiginosa que quando estamos a começar a compreender a última reforma já a seguinte está a ser - como agora se diz - "implementada". Neste palco de muitos arautos da verdade e poucos conhecedores do assunto, é agora moda o ataque ao dito "eduquês", tido como culpado do insucesso educativo e responsável pela cultura de facilitismo dominante. Não sendo especialista no assunto nem parte comprometida com nenhuma "escola", parece-me que há neste jogo de acusações algumas curiosidades e paradoxos. O discurso das ciências da educação tem apontado uma série de críticas à pedagogia tradicional, nomeadamente a sua centração no exame como instrumento avaliativo, o ensino expositivo, a falta de acompanhamento dos alunos ou a ênfase na reprodução como objectivo da aprendizagem. Parece-me difícil desmentir a verdade destas críticas: na escola - em todos os níveis de ensino - pululam docentes sem gosto em ensinar, que "despejam" conteúdos de forma totalmente indiferente a quem os ouve, para quem o aluno é pouco mais do que uma obrigação e que esperam que aqueles "papagueiem" a matéria tal e qual lhes saiu da boca... porque isso lhes dá lustro ao narcisismo ou simplesmente lhes reforça a convicção de que sabem algo que, possivelmente, terão lido num tempo imemorial que remonta ao momento em que saíram dos bancos da faculdade. Mas também é verdade que esta crítica pode ser confundida - justa ou talvez, em alguns casos, injustamente - com alguma dificuldade em assumir o papel de autoridade dos docentes ou com um discurso de vitimização do aluno, visto como um "bom selvagem" entregue aos desígnios dos "maus" educadores.Por sua vez, é fácil aos críticos do "eduquês" ganhar notoriedade, numa fase da vida política em que é de bom tom reivindicar a exigência e rigor e denunciar o facilitismo do passado (onde é que eu já ouvi isto?). Curiosamente, para tão árduos defensores do rigor, grande parte destes "novos educólogos" -- porque obviamente o tentam ser, dizendo que não o são (onde é que eu também já ouvi isto?) - tendem a apropriar mal os conceitos que usam, a confundir mudança da pedagogia com laxismo pedagógico, modificação das práticas avaliativas com inexistência de avaliação ou construção do conhecimento com o mito de que o aluno aprende sozinho. Tendem, também, na forma como recorrem de modo omnipresente à noção de ciência nos seus discursos (contrapondo-a ao "endoutrinamento ideológico" de que acusam os pedagogos), a incorrer numa outra falácia. É que é óbvio que esta argumentação - ainda que brilhante no plano retórico - não é mais do que isso: retórica disfarçada de cientificidade, a ciência transformada em argumento político e moral, usada como arma de arremesso.O que é curioso, nesta guerrilha verbal, é a aparente incapacidade de perceber que podemos simultaneamente ser críticos em relação aos docentes e à prática pedagógica e ser exigentes em relação aos alunos, sem colocar nem uns nem outros na posição de "vítimas do sistema". Na pior das hipóteses, a escola (desde o básico à universidade) está povoada de professores a contragosto e alunos que só lá estão porque a isso são obrigados, que jogam uns com os outros o jogo do "deixa andar". No melhor dos casos, temos professores que gostam de ensinar e são - por isso mesmo - exigentes, e alunos que percebem que estudar é prazer, mas também esforço e perda de outras gratificações mais imediatas.Construir a melhor destas alternativas exige o fim do "jogo do empurra" nas culpas pela educação e o entendimento de que a cultura de exigência tem que envolver alunos e professores, a ambos sendo pedido que façam o seu melhor: seja isso transformar a pedagogia ou envolver-se e esforçar-se no estudo. A culpa raramente é boa alavanca da mudança, seja sob a forma de má consciência, seja pela tendência de a imputar a terceiros. No meio deste jogo entre oponentes cegos a qualquer argumentação que não confirme o que já julgam saber, o desfecho típico é a inércia. Quem perde, como é óbvio, somos todos nós... Professora universitária







26.3.06
 
Uma aula empolgante - foto New York Times
Um artigo no New York Times de hoje (26 Março) aponta para um problema que conhecemos (os fracos resultados em Inglês e em Matemática) e soluções muito simplificadas que são a tentação de muita gente – regular por meio de exames e concentrar o trabalho nestas duas áreas…
http://www.nytimes.com/2006/03/26/education/26child.html?th&emc=th

Uma lei federal de 2002 ( No Child Left Behind )determina exames a estas duas disciplinas, na Junior High School (2º/3º ciclos em Portugal), estabelecendo sanções para as escolas que não melhorem a sua posição na qualificação graduada.
Eis a fórmula de recurso das autoridades educativas, para corresponder a esse desiderato nacional: “narrowing the curriculum”!
E assim, 71% das 15 000 zonas escolares (com autonomia na gestão do currículo) reduziram drasticamente o tempo dedicado à história, música e língua estrangeira (incluindo o espanhol, para muitos a Língua Materna ) e até ciência (!), para reforçar o tempo de trabalho com as disciplinas “básicas”. Esta solução aplica-se, bem entendido, aos alunos com níveis não satisfatórios.
Em uma das escolas referida no artigo, 150 alunos integrados neste “currículo alternativo” ocupam cinco dos seis tempos de aula diários, com matemática, leitura e ginástica, deixando apenas um tempo para todas as outras matérias.
Anunciam-se já alguns efeitos, não muito brilhantes, nas comunidades com muitos alunos de origem hispânica … Por exemplo, nos exames intercalares realizados no estado da Califórnia, apenas 17.4% alcançaram um nível satisfatório em Matemática e 14.9 em Inglês.

Há também consequências manifestas no mercado de emprego dos professores.
Aguarda-se com interesse o relatório de avaliação externa, realizada pelo Center on
Education Policy, a sair esta semana.
Na notícia do NYT, são referidos casos estudados na avaliação, testemunhando reacções de alunos e de professores que transmitem a ideia de melhorias nos resultados, pese embora algumas reacções penosas dos alunos a esta estratégia para os motivar (sic).
Vale a pena ler a resposta de uma professora a uma aluna “morta por sair deste programa” - Muito bem! A única forma de saíres é fazeres melhor no exame!
Trata-se daquele velho princípio pedagógico: “Hás-de cantar até aprender!”

Concorde-se ou não com o conteúdo destas medidas e das estratégias desenvolvidas, interessa salientar que o mesmo governo que aponta uma prioridade política, define em paralelo, processos de implementação, fórmulas de sanção e linhas de avaliação. É a combinatória destas acções que reforça o protagonismo de todos os intervenientes, pela sua responsabilização, e que oferece a todos ( também a nós, distantes leitores de uma notícia de jornal) elementos de reflexão.

Maria José Martins


25.3.06
 
“Melhoria da formação e do acesso à profissão docente”
“Melhoria da formação e do acesso à profissão docente”
É esta a notícia publicada na página do ME, no dia 21 - http://www.professores.pt/
Inacreditável!!
:-(
Embora sabendo que a formação inicial é apenas o início de um percurso de aprendizagem profissional, não consigo compreender esta ilusão de que os Educadores de Infância e os Professores do 1º Ciclo se podem formar em menos tempo do que os restantes professores!!
Alguém me pode ajudar a perceber este fenómeno?
Tudo de bom

Margarida Belchior

 
Privilégio
Tive ontem à noite o privilégio de ir ver, em conjunto com um grupo de professores, alunos e cooperantes da ESE de Lisboa (e famílias) o espectáculo SECRET - Le Cirque ici, no CCB. Sem palavras, apenas sons, só um actor em cena - Johann le Guillerm, artista associado do Parc de laVillette... notável! -, uma tenda de circo. Trabalhava os princípios elementares da Física e formas geométricas com materiais simples numa beleza e domínio do corpo simplesmente notável-- a magia e a poesia da ciência. Um misto de feitiçaria, magia, luz, som, que só o ambiente de circo transmite. Para velhos, novos e crianças. Preocupados com o pobre desempenho em matemática e ciências dos nossos alunos, pergunto-me se um espectáculo destes que nos mantém suspensos do princípio ao fim não será um excepcional ponto de partida (ou, mesmo, de chegada) para levar as crianças e jovens a fascinarem-se com o universo da ciência. Infelizmente, continuamos a massacrá-los com manuais escolares e aulas sem sentido...
Teresa Vasconcelos

24.3.06
 
Cambridge
Processo de Bolonha e Pedagogia no Ensino Superior

Há na edição de hoje do Público um interessante trabalho de Bárbara Wong, realizado com base em entrevistas a estudantes do ensino secundário, em que se verifica que estão em geral à margem, ou sabem pouco sobre o que se passa com o processo de Bolonha. Levanta uma questão pertinente, já aqui equacionada num outro ângulo (o das famílias), por Beatriz Bettencourt, a 16/3/2006.

São questões importantes.

Bolonha está a trazer inquietações às universidades portuguesas.....na origem de interessantes reflexões. E as inquietações não dizem unicamente respeito à duração dos cursos, como era receio de muitos.
A pedagogia entrou, pela mão de Bolonha, nas preocupações de muitas escolas superiores mesmo das mais clássicas....
É curioso como foi preciso este processo para as pessoas entenderem a importância de reflectir sobre:
O modo como se organizam as aulas,
Os materiais utilizados pelos professores,
O modo como se aprende,
O acompanhamento dos alunos,
O papel dos alunos, as responsabilidades e os trabalhos que lhes são pedidos.

Antes tarde do que nunca.

Ana Maria Bettencourt



22.3.06
 
Encerramento de Escolas
O anunciado encerramento de escolas é muito difícil de aceitar pelas populações. Temos ouvido a este respeito discursos de grande tristeza.
É preciso mais pedagogia para que as pessoas entendam as vantagens para as crianças de frequentarem uma escola a tempo inteiro, mais rica do ponto de vista cultural, dos meios para aprender, e do convívio com outras crianças. Mas é igualmente necessário que os centros escolares de acolhimento tenham efectivamente melhores condições do que as escolas que vão ser encerradas.
Ajudaria também muito que se fizesse um esforço para reanimar as aldeias que perdem a sua escola, designadamente através da reutilização para fins comunitários e educativos de uma parte dos edifícios escolares. Podem ser criados pequenos centros de animação e educação de adultos que muito poderiam contribuir para que a vida das pessoas fosse menos triste e solitária.
A Internet pode tornar-se num meio decisivo para quebrar o isolamento entre pessoas e entre as aldeias e a Câmara Municipal o motor da mudança.
Não é mantendo uma escola sem condições aberta que se contraria a morte das aldeias, é pelo desenvolvimento cultural das populações. Qualquer que seja a sua idade.

Ana Maria Bettencourt

20.3.06
 
Quando um sindicato procura as raízes de um problema…
Comecei a ler com grande apreensão, a partir de um título que a isso conduzia, a notícia da agressão a uma professora por parte da mãe de um aluno. (cf. Público, pg.22) Passou-se numa escola no norte do país. Mas a jornalista adianta mais dois casos de agressões a professores, passados durante a semana, da responsabilidade de pessoas exteriores à escola. Claro que fiquei chocada e inquieta. Mas a inquietação virou espanto. A mesma notícia dá conta que o Sindicato de Professores da Região Centro considera, em comunicado, que a causa destes acontecimentos está na desvalorização e degradação da imagem e do papel dos professores na escola e na sociedade, levada a cabo pelo Governo. Estas análises são mesmo nefastas. Assim, não se ajuda os professores e a Escola. Por favor, entendam!

Maria da Conceição Moita

19.3.06
 
OS ALUNOS PORTUGUESES E A MATEMÁTICA*
As Competências Matemáticas
dos Alunos Portugueses

No início deste século, os líderes europeus delinearam o desígnio de desenvolver na União Europeia, até 2010, a economia do conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo.
Se este objectivo é exigente para qualquer dos Estados-membros, para Portugal não pode deixar de ser considerado um fortíssimo desafio, dada a situação de partida particularmente desfavorável do país no que respeita aos níveis de educação e de competências básicas da sua população (ver Quadros 1 e 2).

Quadro 1: População activa por nível de instrução em 2000

Nível de Instrução N.º %
Nenhum 433 200 8,9
Ensino básico:
1º Ciclo (4 anos) 1 659 700 33,9
2º Ciclo (6 anos) 1 045 600 21,4
3º Ciclo (9 anos) 715 900 14,6

Ensino Secundário 585 400 12,0
Ensino Superior 452 200 9,2

Total 4 892 000 100,0

Fonte: INE, 2001

Essa situação é ainda mais preocupante quando comparamos com o panorama português o que se passa na União Europeia e, em particular, nos novos países aderentes.


Quadro 2: Percentagem da população com idade entre 18 e 24 anos cujas habilitações correspondem apenas ao ensino básico e que não continua a estudar nem segue qualquer formação (2002)

União Europeia 18,8%
Novos Países Aderentes 8,4%
União Europeia + Novos Países Aderentes 16,4%
Portugal 45,5%

Ora isto é particularmente evidente no domínio da Matemática. Com efeito, o PISA (Programme for International Student Assessment) 2003 avaliou o domínio da literacia matemática dos nossos jovens, isto é, a sua capacidade de analisar, raciocinar e comunicar ideias com eficiência quando se colocam, formulam, resolvem e interpretam problemas matemáticos numa variedade de situações. Esta avaliação centrou-se em problemas da vida real.
Os resultados do PISA 2003 colocam Portugal numa posição nada confortável (ver Gráfico 1) e mostram que Portugal tem ainda um elevado número de estudantes com níveis muito baixos de literacia matemática – cerca de 30% dos nossos alunos têm um nível de literacia matemática igual ou inferior a 1. Nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) esse valor é de 21%. Isto significa que quase um terço dos nossos jovens de 15 anos se limita a responder correctamente a questões familiares, em que toda a informação está disponível e só conseguem identificar informação e levar a cabo procedimentos de rotina de acordo com instruções, em situações explícitas.
Quando comparamos as percentagens de alunos nos níveis 5 e 6 do PISA (os níveis superiores), existe também uma grande disparidade. Apenas 5% dos alunos portugueses estão naqueles níveis, enquanto que em termos da OCDE essa percentagem é de 15%.


Gráfico 1: Resultados do PISA 2000 e 2003 (Fonte OCDE)

Também as provas de aferição, aplicadas no final dos 4º, 6º e 9º anos de escolaridade, confirmam estes dados relativos aos nossos alunos. Quando se comparam as percentagens da classificação média relativa à classificação máxima das provas do 9º ano realizadas de 2002 a 2004 e do exame nacional de 2005 (ver Quadro 3) verifica-se que a percentagem global varia entre 37% e 40%, sendo consistente nos quatro anos em que as provas se realizaram, o que deve constituir motivo de preocupação.

Quadro 3: Percentagens da classificação média relativa à classificação máxima das provas de aferição do 9º ano e do exame nacional (2005)

Anos Percentagens
2002 40%
2003 37%
2004 38%
2005 38%

Ainda em relação ao 9º ano, os dados disponíveis mostram-nos que o pior desempenho diz respeito às competências de Raciocínio e de Resolução de problemas, sendo o melhor desempenho o que se refere ao domínio dos Conceitos e Procedimentos. Em termos de áreas de conteúdo, o domínio dos Números e Cálculo é aquele em que aquela percentagem é menor, seguida do da Geometria. Por exemplo, nas provas de aferição de 2004, 52% das perguntas ficaram por responder ou tiveram respostas erradas, sendo o domínio dos Números e Cálculo aquele em que há uma maior percentagem (60%) de não respostas ou respostas totalmente erradas, seguido da Geometria (57%). Nas competências de Resolução de Problemas e de Raciocínio as não respostas e as respostas erradas atingem naquele ano 62%.
A situação agrava-se no 6º ano de escolaridade, onde a percentagem de respostas erradas ou não respostas atingem, em 2004, 68%, registando-se os piores resultados nos domínios de Álgebra e Funções (75%) e Geometria (70%). Na competência da Comunicação as não respostas e as respostas erradas atingem os 78%, seguida da Conhecimento de Conceitos e Procedimentos (62%). Os resultados do 4º ano também mostram fragilidades pois a percentagem de respostas certas é apenas de 51%. Por exemplo, o domínio da Geometria tem apenas 45% de respostas certas, sendo esta percentagem no que se refere à competência de resolução de problemas apenas de 39%.
Os resultados das provas de aferição, que mostram alguma consistência ao longo dos anos, evidenciam algumas das fragilidades do nosso sistema educativo, designadamente a questão do 2º ciclo do ensino básico, onde os resultados são muito fracos. Um dado, do PISA 2003, sobre o qual interessa reflectir, já verificado em avaliações internacionais anteriores, é o facto de os alunos que frequentam anos de escolaridade inferiores ao 10º ano (devido à repetição de um ou mais anos) estarem claramente afastados dos seus colegas que seguem o percurso sem retenção. Este aspecto da retenção de alunos, particularidade do nosso sistema educativo, deve merecer a atenção dos responsáveis pela educação no nosso país.

Desenvolver a Competência Matemática
na Escolaridade Básica

Importa, por isso, desenvolver a competência matemática na escolaridade básica E esta constrói-se através de um investimento na promoção e desenvolvimento dos diferentes aspectos dessa competência durante a escolaridade. Foi isto que fizeram diversos países ocidentais quando foram confrontados com baixos níveis de desempenho em matemática das suas populações escolares. São disso exemplo, entre outros, os relatórios nacionais e os programas subsequentes desenvolvidos nos Estados Unidos da América (cf. A Nation at Risk, 1983; Everybody Count, 1992; No Child Left Behind Act, 2001), em Inglaterra (The National Numeracy Strategy, 1998) ou na Finlândia (Projecto Luma, 1996).
A formação dos professores para o ensino da Matemática foi considerada um aspecto crucial pelos governos dos diversos países, que fizeram um investimento muito especial na qualidade do ensino da Matemática nos primeiros anos de escolaridade. Concomitantemente fizeram um forte investimento na implementação de um sistema de acompanhamento supervisionado dos professores que ensinam Matemática e na avaliação monitorizada dos desempenhos dos alunos, dos professores e das escolas, com uma forte responsabilização das escolas. Ao mesmo tempo houve um esforço para a correcção das assimetrias de desempenho entre alunos e escolas.
Em Portugal, a situação tem sido bastante diferente. Não tem existido uma prática de monitorização de aulas (segundo os dados do PISA 2003, apenas 5% contra 61%, em média, nos países da OCDE) e os estudos que nos permitam conhecer as práticas profissionais dos professores de Matemática são escassos. Estas são certamente um dos factores que mais influenciam a qualidade do ensino e da aprendizagem dos alunos.
No estudo Matemática 2001, dos professores do 1º ciclo inquiridos, 54% revelaram não ter frequentado nenhuma acção de formação de Matemática para a implementação do programa de 1990. Continuam a existir muitos professores que apenas utilizam o manual do aluno para trabalhar a Matemática. No que se refere a necessidades de formação, explicitadas pelos professores inquiridos naquele estudo, estas cobrem um grande leque que vai desde a integração de conteúdos numa perspectiva inter e multidisciplinar, ligação da matemática à realidade através da resolução de problemas, a conteúdos específicos como a Geometria. A necessidade de formação em Geometria é também uma das áreas mais referidas pelos professores de Matemática dos outros níveis de ensino. Um outro aspecto muito referido pelos professores questionados neste estudo é a necessidade da formação centrada nas escolas e com uma forte relação com as práticas na sala de aula.
Apesar da manifestação de necessidades de formação, quando analisamos o número de professores que nos últimos anos realizaram a formação contínua, subsidiada pelo Prodep, verificamos que em 2002 apenas 1923 (14,8%) num universo de 129797 formandos o fizeram em Matemática, 1313 (11,5%) em 113812 em 2003 e 1339 (11,7%) em 114785 em 2004.
No caso português importa ainda ter em atenção um outro factor: a falta de confiança pessoal e uma atitude negativa que muitos dos professores, em especial os dos primeiros anos, têm relativamente à Matemática. Ora ninguém pode desenvolver nos outros uma atitude positiva perante uma ciência se ele próprio a não tem. Dos resultados de um questionário aplicado a 202 professores do 1º ciclo do ensino básico da cidade de Lisboa, em 1998 (Serrazina, 1998), conclui-se que a maioria não gosta de Matemática (mais de 60%) e não a consideram uma das suas disciplinas favoritas. A investigação tem mostrado que a forma como os professores encaram a disciplina tem uma repercussão muito forte nas suas práticas.

O Programa de Formação Contínua em Matemática
para Professores do 1º ciclo

Uma atenção especial às práticas lectivas em Matemática, no caso dos professores do 1º ciclo do ensino básico, é um dos aspectos essenciais do Programa de Formação Contínua em Matemática para professores do 1º ciclo que tem vindo a ser implementado neste ano lectivo de 2005/06. Este programa, promovido pelo Ministério da Educação, está a ser desenvolvido, em termos nacionais, pelas Instituições de Ensino Superior públicas que formam professores do 1º ciclo – catorze Escolas Superiores de Educação e quatro Universidades. O programa dirige-se prioritariamente aos professores que leccionam os 3º e 4º anos de escolaridade e é centrado nas escolas, tendo como um dos seus objectivos o aprofundamento do conhecimento matemático, didáctico e curricular dos professores de modo a que possam promover nos seus alunos uma melhor aprendizagem em Matemática. A formação, que tem vindo a ser feita, consiste na realização de sessões de trabalho quinzenais nas escolas com um grupo de professores e acompanhamento ao nível da sala de aula pelo formador dos professores desse grupo. Estão envolvidos nesta formação mais de 5 000 professores do 1º ciclo de ensino básico que, de um modo global, têm vindo a envolver-se de um modo muito positivo em todo o processo. A colaboração entre formadores e professores é já uma realidade em muitas das escolas do 1º ciclo, onde começa a ser encarada com relativa normalidade a entrada do formador nas salas de aula e o trabalho conjunto que é desenvolvido. Mas, em educação, os resultados não são imediatos e os investimentos apenas se tornam visíveis a médio ou a longo prazo. Parece-nos positivo o começar pelo 1º ciclo pois a forma como a competência matemática é desenvolvida neste ciclo vai ter repercussões no alargamento dessa competência ao longo da escolaridade.

Lurdes Serrazina

* Publicado no Jornal de Letras - Educação 15 de Março de 2006

18.3.06
 
A má prestação dos alunos portugueses em matemática
A má prestação dos alunos portugueses em matemática continua a ser inquietante. Há um passado que a pode justificar, mas não basta nem nos pode confortar. Vamos mais uma vez ver o que se passa, partindo de um reconhecimento da situação e da forma como se está a procurar ultrapassá-la.

A questão do fecho das escolas é da maior actualidade. Não podemos deixar de, a partir de um enquadramento sucinto, prometer um futuro tratamento mais alargado.


Publicado no Jornal de Letras - Educação 15 de Março de 2006

 
ACTUALIDADE EM DEBATE
O FECHO DE ESCOLAS

Tem vindo a público alguma contestação ao fecho de certas escolas. O que surpreende nessa contestação é ter por base apenas as reacções de pais, avós e professores e sustentar-se quase exclusivamente na preocupação da "morte" de comunidades devido ao fecho das escolas ou, no caso de antigas grandes escolas do Ensino Secundário, em apreciações saudosistas por instituições que, no passado, tiveram muitos alunos e foram um marco da evolução ou da inovação em educação.

São razões e critérios apreciáveis e importantes, mas a questão ultrapassa-os em muito e já foi antecedida, em quase todos os países europeus, por um debate antigo, vivo e muito interessante. Porque a dimensão de uma escola, correcta e ajustada aos alunos e profissionais que a frequentam, já antes de 1974 era discutida nos fóruns europeus e internacionais e já há muito que a junção e divisão de escolas se impunha em quase todos os países. Portugal, à altura, já era um caso raro de escolas demasiado pequenas ou demasiado grandes, situação que, aliás, se veio a agravar com o crescimento exponencial do acesso à educação e as alterações sociológicas posteriores ao 25 de Abril.

Porque está provado que, para além do conforto de um enquadramento social próximo ou da preservação de um património, não é a existência de uma escola que impede o "fecho" de uma aldeia, nem é uma escola sem alunos que justifica a sua preservação patrimonial.

E se o que surpreende mais no fundamento da actual contestação é raramente ser referido o interesse das crianças e dos jovens que frequentam essas escolas, é porque está cada vez mais comprovado que os alunos precisam de se integrar em meios escolares equilibrados mas não restritos, que os professores necessitam, para o seu progresso e desenvolvimento, de uma interacção constante e próxima com colegas e outros profissionais e que a vida social e educativa de uma escola implica espaços e equipamentos cada vez mais exigentes e ricos para responderem ao que os alunos necessitam, desejam e esperam e que confrontam e comprovam com tudo o que a comunicação social e a Internet lhes traz.

Reconhece-se que não é uma questão fácil, linear e simples. Preocupa e inquieta as "Inquietações Pedagógicas" pelo que a ela voltaremos num debate mais amplo e interdisciplinar!


Publicado no Jornal de Letras - Educação a 15 de Março

17.3.06
 
Habilitações para a docência - interpretações inquietantes!
1. Estou perplexa! Estou estupefacta!
Ao fim de tantos anos a trabalhar e a “lutar” por dignificar o estatuto das professoras do 1ºCEB, acabo de ler e ouvir na comunicação social que está em cima da mesa, para discussão pública, uma proposta do Ministério da Educação sobre as habilitações para a docência de todos os níveis do ensino não superior em que se faz a clara distinção entre a formação inicial para educadores de infância e professores do 1ºCEB e os restantes professores. Ou seja, para os educadores de infância e para os professores do 1º Ciclo vai se exigido o grau de licenciatura (3 anos de ensino não superior que atribuirá o grau de licenciatura, segundo o tratado de Bolonha) e para os professores do 2º, 3º ciclos e secundário vai ser exigido o grau de mestre (3 anos + 2 de ensino superior, segundo o mesmo tratado de Bolonha).

2. Fiquei perplexa e estupefacta! (Ver PÚBLICO de 2006/03/14)

A ser verdade, esta proposta significa um retrocesso na qualificação profissional destes docentes, uma descrença na formação inicial proporcionada pelas instituições de ensino superior, uma visão muito romantizada da importância dos primeiros anos de escolaridade na formação e crescimento das crianças do nosso país: numa semana o governo reafirma uma aposta clara na qualificação do 1º ciclo do ensino básico (em que a formação inicial dos seus agentes é uma dimensão significativa), na semana seguinte, o mesmo governo divulga uma proposta sua sobre a formação dos profissionais deste nível de ensino que contradiz claramente a referida aposta.
Há pouco mais de 7 anos reformularam-se os currículos da formação inicial de professores e de educadoras de infância para que a estes profissionais passasse também a ser conferido o grau de licenciatura, reconhecendo assim as exigências da sua função educativa, cultural e social, e equiparando deste modo a respectiva formação académica à exigida aos docentes dos outros níveis do ensino não superior: 2º, 3º ciclos e secundário. Questionei-me ainda sobre a quem interessa esta hierarquização – num país como o nosso esta distinção não pode deixar de corresponder claramente a uma estratificação ou hierarquização social e a uma desvalorização daqueles grupos profissionais. Corresponde também a um certo pensamento reinante que considera que qualquer um/a pode ser educadora de infância ou professora primária, aproximando estas profissões do desempenho maternal da esfera privada e não lhes reconhecendo uma identidade, uma cultura e um desempenho profissional próprios aos quais são indispensáveis uma aquisição e um desenvolvimento de competências, eminentemente integradoras, quer do domínio relacional (afectivo e emocional) quer dos domínios científicos, artísticos, tecnológicos e humanísticos.

3. Fui procurar a referida proposta! Precisava de «ver para crer» – tal era a minha incredulidade!

Fui ler …
( http://www.min-edu.pt/ftp/docs_stats/Habilitações%20Prof%20Docencia_22_Fev_06.pdf )

4. E comecei por me interrogar … mas afinal quem é que não sabe ler nem interpretar?

Voltei a ler!

Não consegui encontrar naquela proposta nada do que vira escrito nem do que ouvira na comunicação social …

Encontrei antes uma proposta sobre a habilitação profissional para a docência de todos os professores do ensino não superior. Esta habilitação passará assim a ser constituída cumulativamente por três condições:
- o grau de licenciatura - conferido por uma instituição do ensino superior (as licenciaturas no nosso país passarão a ser conferidas no final de frequência com aprovação de 3 anos de ensino superior, segundo o tratado de Bolonha);
- um determinado número de ECTS (European Credit Transfer System), no ensino superior, na disciplina/área de conhecimento, ou em cada uma das disciplinas abrangidas por essa área disciplinar/curricular;
- aproveitamento num curso de formação profissional para o ensino, organizado segundo critérios definidos pelo ME, para cada um dos níveis de ensino, bem como nas diferentes áreas disciplinares.
Segundo esta mesma proposta, para efeitos de recrutamento, será ainda necessária a aprovação em provas nacionais de avaliação de conhecimentos e competências da responsabilidade do ME, de acordo com os currículos do ensino não superior em vigor

… continuava a não encontrar nada do que ouvira e lera na comunicação social…a clara distinção entre as exigências académicas para se ser educador de infância ou professor do 1ºciclo do ensino básico e para se ser docente dos outros níveis de ensino.

5. Continuei a ler…

Encontrei a clarificação e a explicitação dos princípios orientadores desta proposta:
a) Valorização da componente de conhecimento disciplinar;
b) Valorização da componente de prática profissional;
c) Dissociação da formação do acesso à profissão docente;
d) Modulação da formação;
e) Instituições de formação.

Princípios que poderão não ser facilmente compreensíveis por quem não está no meio nem próximo dele, mas, quando não se sabe o melhor é perguntar, indagar, investigar, …

Nesta parte do documento, no que se refere à componente da prática profissional, propõe-se que esta possa ser obtida num segundo ciclo de estudos superiores, ou seja depois da obtenção do grau de licenciatura. Não refere que tal seja apenas para o 2º, 3º ciclo ou secundário. Ou seja, pode acontecer o mesmo também para a educação de infância ou para o 1º ciclo do ensino básico.
Ainda nesta componente da prática pedagógica, diz-se que a mesma habilitará para mais de um ciclo de escolaridade, no 2º ciclo do ensino básico ao ensino secundário. E aqui sim se estabelece a diferença! … os educadores de infância e os professores do 1º CEB só poderão exercer apenas e só, respectivamente, nesses níveis de ensino, enquanto os restantes, com uma componente de formação claramente focalizada numa determinada área científica ou disciplinar, ficarão habilitados para mais de um ciclo de escolaridade. Acabam-se assim as formações iniciais das variantes, cursos estes que habilitavam para a docência no 1º CEB e para uma das áreas disciplinares do 2º ciclo. Um fim há muito desejado por largos sectores da docência!

Estas diferenças que consegui identificar continuavam a não corresponder ao que ouvira, nem ao que lera!! … será ingenuidade da minha parte?... haverá quem queira ler neste documento o que ele não diz?

Na componente da modulação da formação consagra-se a sua flexibilidade e reconversão, princípios que me parecem consensuais e pacíficos do ponto de vista dos alunos do ensino superior, abrindo a possibilidade da não existência, à partida, de uma intencionalidade na oferta, por parte das instituições de ensino superior, ou na procura, por parte dos alunos – os alunos poderão começar por frequentar determinadas disciplinas da área da física, por exemplo, e posteriormente virem a descobrir que querem ser professores, seleccionando então as disciplinas necessárias para esse objectivo. Pode acontecer também exactamente ao contrário. Procura-se minimizar o drama dos pedidos de equivalência aquando das mudanças de cursos no ensino superior entre diferentes instituições (para já não falar de quando isso acontece na mesma instituição).
Salvaguarda-se neste documento, no entanto, o caso da Educação de Infância e o dos professores do 1º ciclo do ensino básico, pelo que poderá haver escolas superiores que disponham dessa oferta devidamente estruturada à partida, ou não. Tudo dependerá das características a definir pelo ME em termos das habilitações académicas e profissionais para a docência a serem adquiridas através das três condições anteriormente referidas.

Continuei a não encontrar aqui a distinção entre as exigências dos graus académicos e os anos de frequência no ensino superior acima referidos na comunicação social …
Voltei a questionar-me: Seria a linguagem do documento / proposta muito hermética? Só compreensível por quem pertence ou está próximo do meio? … ou haverá algo escrito nas entrelinhas que eu não consegui descortinar?

6. Prosseguindo com a minha segunda leitura…

Diz-se também que aos dois subsistemas de ensino superior, universidade e politécnicos, é reconhecida a possibilidade de realizarem a formação de educadores de infância e professores para todos os ciclos de ensino básico e para o ensino secundário.

Não encontrei escrito em lado nenhum deste documento afirmações que digam que não poderá haver educadores de infância com o grau de mestre (o correspondente a 5 anos de frequência e aprovação no ensino superior), que não possa haver professores do ensino secundário apenas com o grau de licenciado (3 ano de frequência e aprovação no ensino superior).

E voltei a interrogar-me: a quem interessa lançar esta confusão? … a que visão tão reducionista e hierarquizada socialmente dos níveis de ensino não superior, e consequentemente dos seus agentes, corresponde esta interpretação do documento? … Quem tem medo dos saberes holísticos e integradores que caracterizam os educadores de infância e os professores do 1º CEB? … Será apenas mais uma forma de valorizar os “ditos” saberes científicos (os das “ciências puras e duras”, como se ouve dizer) em detrimento dos saberes científicos das ciências sociais e humanas e das ciências da educação?

Fiquei perplexa com a leitura jornalística (será apenas uma interpretação jornalística?) feita a este documento! … voltei a questionar-me: «… mas o que terão ouvido os jornalistas para fazerem esta interpretação?...»

7. Claro que esta proposta exige um grande esforço de reorganização por parte das instituições de ensino superior, mas também tem subjacente uma outra forma de encarar e organizar os percursos de formação neste nível de ensino. A formação de professores e a sua habilitação, até agora conferida apenas através de graus académicos conferidos pelas universidades e politécnicos, passa a ser objecto de um maior controlo por parte do ME, a entidade empregadora, e deixa de estar apenas a cargo das instituições de ensino superior.

Há muitas outras questões e dúvidas que se podem colocar a esta proposta… nomeadamente o facto de ser, ou não, suficiente o grau de licenciatura (3 anos de frequência e aprovação no ensino superior) como habilitação para a docência (cumulativamente com as outras condições) …mas a mim o que mais me continua ainda a surpreender foi a interpretação que dela foi feita …

Porquê? A quem serve? …

8. Apesar de há já alguns anos a formação académica dos educadores de infância e dos professores do 1º Ciclo ser equivalente à dos outros níveis de ensino, e facultada por instituições de ensino superior, cujos docentes possuem os mesmos graus académicos que as universidade, ainda continuamos, enquanto sociedade, a desvalorizar estes profissionais e a sua actividade? … por este profissionais não serem professores de Matemática, de História, de Português ou de Ciências? … por serem sobretudo «professoras de crianças»?

Como não estive presente na apresentação desta proposta, continuo perplexa e estupefacta!!

Este documento é um documento “aberto". Tudo vai ser determinado pela regulamentação que se seguir … O que é mais significativo é o estar-se já a ler neste documento o que lá não está escrito! ... e isso é o que mais me preocupa!

Margarida Belchior
(Professora do 1ºCEB)

16.3.06
 

Cidadania, impostos e infoexclusão

O cumprimento dos deveres fiscais é uma das dimensões essenciais da cidadania.
Por isso deve ser matéria explicada na escola com o objectivo de contrariar a mentalidade muito generalizada que valoriza quem foge ao fisco. Quando trabalho o conceito de educação para a cidadania com futuros professores, não me esqueço de focar esta questão.
Existem progressos inegáveis para quem consegue utilizar a NET para fins fiscais.
Mas quem tiver visto cenas como a que presenciei hoje numa repartição de finanças perde a vontade de defender o sentido democrático dos impostos: a fila de pessoas que pacientemente, enchia as escadas de um prédio não enganava quanto ao seu nível educativo incluindo literacia informática, lugar na sociedade. Ao balcão um único funcionário atendia ...enquanto os outros tratavam calmamente de outros assuntos
..as pessoas tinham um ar de condenados. Condenados a perder um dia de trabalho, a perder o seu tempo.
Onde estão as estratégias para desenvolver o sentimento de participação dos cidadãos ? para desenvolver o medo, o sentimento de exclusão talvez.....a educação não se passa só na escola . As repartições do Estado deveriam ter a preocupação de fazer sentir que existem deveres dos cidadãos mas também existem direitos.
A cena que presenciei lembrou-me tempos que gostaria de esquecer ...

Ana Maria Bettencourt

 
"Graus de Bolonha"
Ontem, ao abrir na Internet um sítio de uma Universidade suiça, reparei que os programas de estudo tinham os seguintes títulos genéricos: Mestrados de Bolonha, Licenciaturas de Bolonha, etc... A instituição em causa teve a preocupação de advertir o público de que os programas conferentes de grau que agora oferece são qualitativamente diferentes dos seus anteriores programas, conducentes aos mesmos graus.

Este facto suscitou-me diversas reflecções que partilho convosco:
- A transparência da informação que as Universidades e Institutos Politécnicos fornecem ao público exige, de facto, que se faça uma destrinça entre uns e outros cursos. Quanto a nós, essa distinção deveria ser feita utilizando uma fórmula comum a todas as instituições de ensino superior, fórmula facilmente reconhecível pelo público, ainda que a expressão "de Bolonha" não me pareça feliz.
- A pouca informação, clara a acessível ao comum dos cidadãos, sobre as transformações que se estão a operar no ensino superior é deveras preocupante. Como é que os futuros alunos que não tiveram acesso a orientação escolar e com pais pouco informados vão compreender a oferta educativa que lhes será proposta já para o próximo ano (?) e como irão escolher o seu curso?
- Até agora, e que eu tenha conhecimento, só o Diário Económico, na sua edição de 17 de Janeiro publicou informação detalhada e acessível sobre as características dos novos cursos. O público visado é restrito, abrangendo uma camada especialmente interessada - a dos empregadores. Neste caso, é de prever que as consequências em termos de remuneração dos diplomados não tardará, existindo também o risco de que os detentores dos anteriores graus sejam também desfavorecidos, por arrastamento.

Finalmente e como conclusão considero que temos o dever de nos indignar com a falta de informação e de transparência para o público em geral de todo este processo de reconversão do ensino superior. Não estou contra o processo que, entre outras, tem a vantagem de permitir aos nossos estudantes e diplomados uma maior mobilidade. Compete, contudo, ao poder público assegurar a mobilização dos meios adequados de divulgação pública e de regulação do processo (como é o caso das nomenclaturas dos cursos) sem os quais são de prever bastantes efeitos perversos, socialmente discriminatórios.

Beatriz Bettencourt

15.3.06
 
Pontos nos ii
Saiu ontem mais um número desta revista da Texto Editora. Logo a abrir, o editorial de Santana Castilho anuncia a calamidade que grassa na escola, na sociedade, nas famílias – ninguém faz o que devia, as “morais aberrante” do individualismo dominam o nosso viver colectivo... Por isso, a escola é campo aberto de todas as violências e comportamentos desviantes! É isso que o dossier temático depois procura ilustrar com histórias de professores, tristes, sem dúvida, mas que tantas dúvidas nos deixam quando sabemos que o que se passa nas escolas tem sempre a ver com as questões de relação pedagógica professor-aluno e de clima de escola...
Felizmente que todos nós conhecemos outras histórias que nos mostram como diariamente se gerem conflitos, se ultrapassam dificuldades, se envolvem os alunos e os professores em projectos de melhoria da aprendizagem e que, em geral, o ambiente das nossas escolas é tranquilo, os alunos gostam de lá estar e os professores estão empenhados no que fazem. Claro que muito há a mudar, mas será que estas visões catastrofistas ajudam a descobrir os novos caminhos a percorrer? Sinceramente, qual o papel de uma revista destas?

Teresa Gaspar

 
Insucesso Escolar- 3
Insucesso -abandono escolar 3

Substituição das repetências no ensino básico por apoio eficaz à melhoria das aprendizagens
A escola portuguesa vai-se organizando melhor para impedir que tantos alunos fiquem pelo caminho ou se desmotivem.
Alguns exemplos de práticas positivas hoje possíveis na escola portuguesa (entre outros):

Prolongamento dos horários de trabalho dos alunos na escola: as crianças podem, se a escola for capaz de se organizar, trabalhar mais tempo, a um ritmo mais adequado, num meio culturalmente mais rico e pedagogicamente bem organizado. A organização do trabalho dos alunos na escola é uma chave essencial do sucesso escolar.

Uma maior responsabilidade da escola pelos percursos escolares: escolas que não consideram o insucesso escolar como uma fatalidade, analisam os resultados que os alunos obtêm, os obstáculos à aprendizagem, e desenvolvem estratégias para os melhorarem.

Equipas pedagógicas que assumem metas para o progresso dos alunos e trabalham com eles para que aprendam mais e ultrapassem os problemas.

Diversificação de ofertas educativas integrando componentes vocacionais que motivem os alunos para continuar a estudar e contribuam para evitar abandonos precoces.

Estabilidade das equipas pedagógicas, condição decisiva e ainda mais importante do que a estabilidade dos professores na escola (esta sem aquela terá um efeito muito insuficiente).

O Estudo Acompanhado, orientado de modo a que os alunos aprendam a estudar, a organizar a informação, a trabalhar mais e com gosto. Professores que aproveitam o recurso constituido por este tempo pedagógico para conhecerem melhor cada um dos seus alunos e os ajudarem a superar as dificuldades.
Ana Maria Bettencourt

 
Clube Os Curiosos e novidades sobre os professores
O meu post sobre As artes na Educação propiciou-me o conhecimento (através de um comentário) do Clube os Curiosos, clube de divulgação científica e histórica através das artes.

Merece uma visita virtual e, se possível, ao vivo !

Quanto aos anúncios das novas exigências para os novos professores, confesso que ainda não os li como deve ser. Mas uma coisa deixou-me perplexa : se bem percebi os educadores de infância e os professores do 1º ciclo voltariam a ter uma formação inferior (pelo menos em nº de anos) aos professores dos outros níveis de ensino. Isto faz sentido ? Quem me explica ?

Maria Emília Brederode Santos

14.3.06
 
Informações do Público (14/3/2006)
"A proposta do Ministério da Educação que pretende alterar as condições de formação inicial e de acesso à profissão docente não agrada a universidades e politécnicos" . Assim inicia o Público de hoje um artigo sobre a proposta para a formação e recrutamento de docentes... A maioria das individualidades entrevistados no artigo, manifesta receios de que haja uma desvalorização do 1º ciclo. Isabel Martins, U. Aveiro: "ao discriminar os professores do 1º ciclo e os educadores de infância, andamos no mínimo 10 anos para trás". Teresa Vasconcelos, especialista em educação de Infância (ESE de Lisboa) : "Vejo com grande preocupação um documento que firma uma clivagem na formação de
professores".
Os responsáveis da ARIPESE (Associação das ESE)
manifestam perplexidade ao ver que, num momento em que há uma aposta política no 1º ciclo, se estabelece uma clivagem.

Inquietações Pedagógicas

 
Habilitações Profissionais para a Docência
Fui ontem à Reitoria assistir à apresentação do documento “Habilitações Profissionais para a Docência”, feita pelo Secretário de Estado da Educação Valter Lemos. Perante uma sala cheia de pessoas ligadas à formação de professores, o Secretário de Estado expôs as linhas que deverão, no futuro, orientar os processos de aquisição de qualificação profissional e de recrutamento de professores para o ensino público. A novidade, largamente noticiada na comunicação social durante toda a manhã, parecia ser a criação de exames nacionais para selecção dos futuros professores a recrutar para os diferentes níveis de educação e ensino. Porém, o que nos foi apresentado foi muito mais. Foi um documento de princípios, onde se distinguem claramente as componentes de formação que devem integrar a aquisição da habilitação profissional para a docência, a cargo das instituições do ensino superior, do processo de recrutamento a realizar pela administração educativa. Foi um documento que remete para a autonomia das instituições de formação e para flexibilização de percursos de formação a oferecer. Foi – e tenho de confessar que é algo que defendo há muito tempo – um separar de águas entre o que são as necessidades curriculares das escolas e os professores de que precisam e as lógicas das instituições de formação.
Claro que muita coisa haverá a trabalhar e a aprofundar. O debate que se seguiu mostrou isso mesmo. Mas gostei, porque me pareceu ver uma luz na eterna questão das habilitações para a docência!

Teresa Gaspar

13.3.06
 
Insucesso escolar - 2
A sociedade portuguesa vai-se organizando para impedir que as crianças e os jovens que encontram dificuldades pelo caminho vão ficando para trás.

Dois exemplos de iniciativas entre as muitas que poderiam ser referidas:

A AMUCIP - Associação para o Desenvolvimento das Mulheres Ciganas Portuguesas - inaugurou a semana passada a sua primeira sede, no Seixal, visando realizar actividades que promovam a reintegração social da comunidade cigana e apoiem as crianças ciganas com insucesso escolar.

É muito importante que as famílias se organizem.

Encontrei um destes dias uma antiga colega de Liceu, professora de matemática que se aposentou cedo e apoia, numa paróquia de Lisboa, crianças com dificuldades naquela disciplina pertencendo a famílias com dificuldades financeiras. É um bom exemplo seguido por muitas outras colegas. Num país em que os níveis educativos das famílias portuguesas são tão baixos, seria bom que houvesse mais apoios da parte de quem sabe.

Ana Maria Bettencourt

 
INSUCESSO ESCOLAR - MITOS
As repetências são responsáveis por grande número de abandonos.
Não se aprende mais repetindo o ano.
A sociedade portuguesa viveu sempre na ilusão de que o chumbo era a melhor maneira de o aluno “preguiçoso” estudar mais. A culpa do insucesso era sempre atribuída ao aluno. Seria assim imoral que quem não obtivesse bons resultados transitasse de ano. O aluno teria por isso de ser castigado. Nesta óptica, a avaliação servia essencialmente para castigar. Foi com base nestes mitos e nas práticas a que deram origem, que chegámos ao 25 de Abril com mais de 30% de analfabetos e que continuamos a ter mais de 40% de alunos que não completam o ensino secundário,
Hoje sabe-se por estudos internacionais que os países onde, por definição, não existem repetências ao longo da escolaridade básica, obtêm melhores resultados nos testes internacionais, ou seja os alunos aprendem melhor. Porque as repetências fragilizam os percursos escolares, desmobilizam para o estudo e afastam muitos alunos dos caminhos da educação e da cultura.

Ana Maria Bettencourt

12.3.06
 
As artes e a educação
As artes e a educação, as artes na educação, o ensino artístico, as expressões - tudo isso foi objecto da 1ª Conferência Mundial da UNESCO sobre Artes e Educação que teve lugar em Lisboa de 6 a 9 de Março (de 2ª a 5ªf. à tarde).

O neurologista António Damásio considerou as artes na educação fundamentais para o desenvolvimento da inteligência emocional e da criatividade - e estas competências essenciais para o cidadão do século XXI.

Outra ideia importante defendida foi a de que o ensino artístico faz parte do direito à educação e que a qualidade da educação implica que haja educação em artes.

(Continua no próximo número)

Maria Emília Brederode Santos

11.3.06
 
Good night and good luck
Não percam o filme do "liberal" George Clooney intitulado "Good night and good luck", a frase com que o pivot Ed Murrow se despedia dos telespectadores da CBS nos anos 50. Passa-se durante o macartismo, descreve o clima de medo que se pode instalar mesmo numa democracia, indica alguns dos instrumentos que podem ser usados para isso, e narra também como é possível resistir-lhe e ... vencer.

Termina com uma frase de novo e sempre actual : "Television can teach, can illuminate, it can even inspire... If it doesn't it is nothing but a box full of wires..." (cito de memória mas o sentido é este)

Maria Emília Brederode Santos

7.3.06
 
Opinião de Boaventura Sousa Santos - Publicado na Visão em 2 de Março de 2006
As Escalas do Despotismo

Um grupo de jovens menores maltratou sadicamente, apedrejou e espancou até à morte o transexual brasileiro Gisberto, um sem abrigo de 45 anos. Aconteceu no Porto. >> mais http://www.ces.fe.uc.pt/opiniao/bss/151.php