Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

31.5.05
 
Venturas e desventuras duma donzela docente
Sou professora contratada do 1º ciclo. Este ano já estive em três escolas diferentes, todas de bairros ditos "difíceis". São bairros sociais que realojaram os habitantes de antigos bairros da lata. A maior parte dos pais dos meus alunos são muito novos, tiveram muitos filhos e tiveram-nos muito cedo. Quase todas as mães e muitos pais (quando presentes) estão desempregados ou dedicam-se a biscates. Valorizam pouco a escola. Talvez não acreditem nela. Talvez a receiem. Talvez até tenham alguma razão.

Fui colocada na primeira escola em finais de Outubro. Era um 2º ano com horário duplo (das 8 h às 13 h). Antes de mim os alunos já tinham conhecido as seguintes situações : como a professora que lhes foi atribuída estava em licença de parto, foram distribuídos pelas outras turmas durante duas semanas; depois foram atribuídos a uma professora que se ia reformar muito proximamente e depois a mim que lá fiquei até os entregar à sua professora entretanto regressada da licença de parto.
Claro que as professoras têm todo o direito às suas licenças de parto e de maternidade mas parece-me que, nos casos em que já se sabe que a professora vai estar de baixa ou em licença de parto, se devia logo colocar um/a professor/a substituto/a para evitar esta instabilidade. Fiquei "passada" quando comecei a trabalhar com os meus alunos : tinham-me dito que a turma era "excelente" à excepção de um ou dois "casos difíceis". Alguns nem reconheciam as letras !

. Porque é que quando se sabe que uma professora vai estar de licença de parto lhe atribuem uma turma que vai andar de Herodes para Pilatos durante esse tempo ? Todas as escolas precisam de professores de apoio. Quando a professora terminasse a sua licença e regressasse podia ir para os apoios. Ou então que lhe fosse atribuída uma turma mas que se soubesse desde o início quem seria a substituta e que ficassem as duas até ao fim - até porque em geral a professora que esteve em licença de parto terá uma redução de horário para amamentação - o que obriga a mais soluções instáveis.

Na segunda escola em que estive fiquei com um terceiro ano em horário regular (das 9 h às 15 h). Estes meninos também só começaram as aulas em Outubro. A professora que lhes foi atribuída pediu destacamento e só lhes chegou a dar uma semana de aulas. Depois eles ficaram em casa ou foram distribuídos pelas outras turmas durante duas semanas Em finais de Outubro deram-lhes uma professora grávida. Embora o bebé estivesse previsto para meados de Dezembro nasceu logo a seguir ao 1 de Dezembro e a professora já não voltou. Entre 2 de Dezembro e as férias de Natal foram distribuídos por várias turmas ou não foram à escola. Eu fui lá colocada no início do 2º período. Ou seja : em Janeiro já era a 4ª ou 5ª professora que conheciam ! E não fui a última.

Esta escola era mais complicada do que a primeira e os meninos bem mais difíceis. Provavelmente também porque a instabilidade dos professores tende a agravar a situação à medida que o ano avança, não é ? E no entanto a minha terceira escola tem sido uma experiência feliz. Logo que possa falo-vos das instalações, dos equipamentos e das intervenções pedagógicas que podem, apesar de tudo, ultrapassar em parte estas dificuldades. Ah, e talvez também dos agrupamentos de que todas es escolas do 1º ciclo se queixam. Parece que uma solução que podia ser tão boa para todos tem sido pervertida e desnaturada. Mas esperamos conseguir um final feliz !

Alexandra Magno

Publicado no jornal A Capital a 29 de Maio

30.5.05
 
Em tempos de crise é preciso ter a coragem de investir no futuro
Fala-se muito por estes dias da necessidade de fazer cortes no orçamento. Creio que já compreendemos todos a inevitabilidade de tal vir a acontecer.
É preciso gastar menos, para além de outras medidas que se diz que estão a começar a dar frutos, como por exemplo o combate à fraude fiscal.

Todos olham para a saúde e para a educação como sectores gastadores.
Na educação, não acredito que seja desejável investir menos.
Sei que é possível gastar melhor.
É preciso uma análise cuidada dos nossos objectivos e dos meios que estão à disposição.
Os cortes cegos, ou os cortes decididos por critérios que nada têm a ver com prioridades políticas e que visam meramente evitar manifestações ou complicações com ministros ou lobbys poderosos são vias que comprometem o futuro, a inteligência e a nossa capacidade competitiva.

Um exemplo: o combate ao insucesso e abandono escolares, um dos cancros da nossa educação. Sabemos, rigorosamente, que a herança que temos de baixos níveis educativos condiciona os resultados escolares porque os pais têm dificuldades em enquadrar os filhos. Mas sabemos também que o bom funcionamento de uma equipa educativa, assessorada por sistemas de apoio aos alunos, pode ajudar a ultrapassar grande parte dos problemas que se colocam.
Existem hoje meios para diminuir o insucesso. Existem milhares de professores de apoio cujo trabalho pode ser decisivo, mas será que estão a desenvolver a acção necessária? Quem avalia este trabalho? As qualificações destes professores? E o investimento realizado?. Existe a área de Estudo acompanhado que deveria contribuir para que os alunos trabalhem e aprendam mais e melhor. Quem avalia o trabalho desenvolvido e os recursos avultados que esta importante proposta educativa, se for bem gerida, representa?
Sabemos que o sistema de colocação de professores mobiliza meios incalculáveis e é uma fonte de desestabilização das escolas, tão prejudicial a uma maior responsabilidade das equipas pelos percursos escolares e pelo sucesso dos alunos. São completamente diferentes os resultados obtidos por um grupo de professores, efémero, ou por uma equipa responsável. A situação que temos não é justa nem para os alunos, nem para os professores, nem para a sociedade.
Sabemos ainda que existem situações em que foram conseguidos excelentes resultados. Quem mostra à sociedade os caminhos seguidos? E o resultado do investimento realizado? Por que andamos sempre a dizer que somos maus e não resolvemos os nossos problemas quando conhecemos tão mal as nossas realidades?

Por estes dias em que se fala tanto do défice das contas públicas e das metas de Bruxelas, seria bom que todos assumíssemos os caminhos para ultrapassar o nosso défice educativo. E esse caminho passa por uma melhor gestão mas passa também pela definição de metas e pelo investimento no futuro e na inteligência. Jack Lang, citando P. Mauroy quando era primeiro ministro de França : neste período de austeridade, devemos deixar acesas as lanternas do futuro. Referia-se à educação, à cultura e à investigação científica.
Estes factores são fonte de crescimento económico, de integração e de civilização. Se for inevitável proceder a cortes na educação tem de se entender onde e porquê.

Ana Maria Bettencourt
Publicado no jornal A Capital a 29 de Maio

29.5.05
 
Fórmula de cálculo de nível final exames nacionais é uma aberração
Há um princípio matemático evidente: não se aplicam fórmulas - muito menos
ponderadas - a níveis qualitativos.
Pois foi o que o Min. da Educação fez com o seu despacho normativo 1/2005
(exames nacionais do ensino básico).
Neste despacho consagra-se um fórmula que dá um peso de 70% à nota de fim de
ano e de 30% à nota do exame nacional...só que aplica estas percentagens aos
níveis de 1 a 5 que são qualitativos (nível 1-Mau, nível 2-Medíocre, nível
3-Suficiente etc.). Imaginam o que é 70% de Suficiente?
Viram os níveis e como eram representados por números (podiam ser letras
como se faz nos países anglo-saxónicos), zás, aplicaram a fórmula.
Para além de ser um absurdo, esta singular operação provoca situações de
flagrante injustiça como demonstro na simulação que anexo em que alunos que
deveriam passar chumbam porque se aplica a fórmula aos níveis e não, como
deveria ser, às percentagens, ou que baixam de nível pela mesma razão.
Já alertei a anterior Ministra da Educação e a actual e...nada. Entretanto
os exames continuam a ser preparados a todo o vapor e este erro, ninguém tem
a coragem de o corrigir. E se os Pais resolverem impugnar este resultado?
João Rangel de Lima

24.5.05
 
Escolas e educação permanente

Os seres humanos estão condenados a aprender, algo tão necessário, natural e inevitável como respirar. Mas a verdade é que a maior parte daquilo que sabemos não foi aprendido na escola. Para lá dos seus méritos, a escola tem o gravíssimo defeito de não trabalhar com pessoas, mas sim com alunos. O seu propósito principal é habituá-los a estar sentados, em silêncio, a cumprirem o que lhes é prescrito e, com frequência, a tentar adivinhar o que o professor pretende deles. A afirmação de que, na escola, o “mais difícil é sentá-los” exprime a ideia de que a socialização nas regras escolares constitui um pré requisito, dissociado da aprendizagem. Se a vontade e o desejo de aprender é algo de intrínseco ao ser humano, cuja recompensa reside no seu próprio exercício, talvez não seja exagerado afirmar que é na escola que o aprender se torna um problema. O ensino escolar pressupõe, em regra, a incompetência e a ignorância do aluno, ignorando o seu património experiencial e dificultando a construção de um sentido para o trabalho escolar. É por isso que, como afirmou o famoso psicólogo Jerome Bruner, as situações escolares, por vezes, tornam os alunos “funcionalmente estúpidos”.
A crença cega nas virtudes da escolarização conduziu à extensão em massa da educação escolar ao mundo dos adultos, transformando a Terra numa imensa sala de aula à escala planetária. Esta extensão da educação ao mundo dos adultos teve o mérito de alimentar uma acção teórica e prática de crítica ao modelo escolar (visto como “natural”) e tornar visíveis e concretizáveis modalidades de intervenção educativa orientadas para a emancipação e a realização plena da pessoa humana (é o exemplo da obra teórica e prática de Paulo Freire). Outro efeito importante foi o de ajudar a construir abordagens teóricas da educação e da aprendizagem que esbatem as fronteiras ou dicotomias entre as diferentes idades da vida. No essencial, as crianças e os adultos aprendem da mesma forma e esse processo coincide com o seu ciclo vital.
Será então possível regressar a uma ideia nunca concretizada, e hoje em desuso, a de uma educação permanente, em que a escola terá um lugar importante, mas cuja matriz essencial serão os processos educativos não escolares, reforçando-se o potencial educativo dos vários contextos de socialização e articulando-se num processo único o aprender, o viver e o trabalhar.
Então o que fazer à escola? Na minha opinião, um dos caminhos mais promissores para transformar positivamente a escola é torná-la num conjunto de recursos plurifuncionais abertos a uma utilização intensiva por parte de públicos e parceiros diversos, empenhados em desenvolver actividades de aprendizagem, as mais variadas. O meu pressuposto é o de que a escola, entendida como um “colectivo inteligente”, precisa de aprender a partir de experiências educativas não escolares. O objectivo seria que cada escola se pudesse transformar num centro de educação permanente, profundamente enraizada no contexto local e fazendo interagir múltiplos tipos de aprendentes. O que está em causa não é fazer regressar os adultos à escola, mas fazer dela um lugar onde se multipliquem as oportunidades de aprendizagem e se tornem habituais situações similares à que é descrita, num texto escolar, por uma criança de uma escola rural do concelho de Portalegre “Fui eu que ensinei a minha avó a ler e a escrever. Ensinei-a a ler para me ditar os ditados. E depois a escrever, para ela conseguir fazer a sua assinatura”

Rui Canário

Publicado no jornal A Capital a 22 de Maio

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22.5.05
 
AGENDA
Hoje estreia O Rouxinol, espectáculo baseado no conto de Hans Christian Andersen (por ocasião das comemorações mundiais do bicentenário do seu nascimento) que o encenador - educador José Caldas transformou num espectáculo maravilhoso para todas as idades. No Teatro Municipal Mirita Casimiro no Monte Estoril às 17 horas. Para mais informações : tel. 214670320 ; e-mail : t.e.c@mail.telepac.pt; http://www.tecascais.org/


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Dia 24 de Maio, a Professora Miriam Halpern Pereira profere a sua Lição de Aposentação sobre o tema A História e as Ciências Sociais. No Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), Auditório B203, pelas 15 horas.

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O Conselho Nacional de Educação (CNE) leva a cabo, dia 8 de Junho, um Seminário sobre Ciência e Educação em Ciência.

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Em Huelva (Espanha) prepara-se, para Novembro, um Congresso Hispanoluso de Comunicação e Educação sob o título Para uma televisão de qualidade – A televisão que queremos...Os seus organizadores partem da convicção que é cada vez mais necessário reflectir sobre o papel da tv nas nossas vidas e pedir que este meio seja um recurso essencial nas sociedades democráticas para o fomento dos valores cidadãos, sem contudo se renunciar à sua vertente lúdica. “Contar com uma tv de qualidade é uma exigência social e cívica em que todos temos que nos implicar. Todos, comunicadores e educadores, temos uma responsabilidade essencial no fomento de um meio que, enquanto entretém, forme e eduque para a cidadania”.
Até 20 de Junho a inscrição custa 36 euros. Para mais informações : congreso@grupocomunicar.com; http://www.grupocomunicar.com/; www.uhu.es/comunicar/congreso/

21.5.05
 
Ainda sobre Educação Sexual...

ver http://dn.sapo.pt/2005/05/20/sociedade/educacao_sexual_e_sob_ataque.html

e ainda...

Júlio Machado Vaz comenta a polémica que também o envolve

http://murcon.blogspot.com/


Professor António Marques,

Chame-me louca se quiser, mas enviei este mail a esta associação de gente mal informada.

Enfim, dei comigo numa de lhes responder pelas petições que andam a organizar e pela forma como falam do que não sabem...como sou uma ilustre desconhecida, até posso escrever o que penso.

Andrea



Exmos. senhores e senhoras:

Li a vossa petição relativamente à Educação Sexual e fiquei perplexa!
Sou mãe e estudante numa ESE e considero serem evidentes as expectativas sociais que a este tema estão ligadas e que, desde o final do séc. passado, têm vindo a aumentar pela sua reconhecida importância em todo o processo educativo, fundamentalmente no que diz respeito à Promoção da Saúde em Meio Escolar em todas as suas diferentes dimensões, curricular, psicossocial, comunitária, ecológica, entre outras. Ora, vem-se assumindo cada vez mais a urgência em clarificar ideias, conceitos, princípios, bem como, acima de tudo, definir estratégias.
Vamos a esclarecimentos:
O que se entende como Educação Sexual e qual a implicação que a mesma poderá ter na construção da identidade da criança?
A Educação Sexual define-se como um processo em que a pessoa se desenvolve enquanto ser sexuado e sexual, perante acções que são estruturadas e formais – Educação Sexual Explícita – e, em simultâneo, perante acções não estruturadas e informais – Educação Sexual Implícita. Ora, estando apenas esta última vertente presente na formação do indivíduo, poder-se-á assistir ao aparecimento de uma série de conceitos, comportamentos, princípios, atitudes e valores deturpados, que poderão ter implicações na realização pessoal de cada um, condicionando a vivência de uma sexualidade ampla e feliz, a nível pessoal, familiar e social.

É então esta a situação defendida por vós, em defesa da moral e bons costumes, certo? Um modelo onde não exista a intervenção directa do educador, logo, onde todo o conhecimento é implícito, sem orientação, e decorre da vivência da criança.

Pois bem, a Educação Sexual explícita tem como grande finalidade alterar esta situação, levando a criança a alargar os seus conhecimentos ligados à sexualidade, a desenvolver valores positivos e atitudes positivas e a adquirir comportamentos sexuais responsáveis aos níveis pessoal e social. Este modelo tem por base princípios e valores humanos, a clarificação de conceitos e a formação integral do indivíduo.

Tendo em conta que a família tem responsabilidades educativas próprias no campo da sexualidade da criança, será sempre de todo o interesse adequar a óptica da complementaridade e da partilha entre a Escola e a Família, a quem se devem dar explicações sobre as actividades que se vão desenvolver, de forma clara e assumida. Nesta dinâmica com a Família, a Escola pode desempenhar um papel importante no reforço e desenvolvimento das competências familiares, promovendo a partilha das suas dúvidas e anseios com outros pais e/ou encarregados de educação e garantindo a confiança no trabalho dos profissionais.

Pode-se e deve-se escolher, imaginar, idealizar e construir o futuro pessoal, familiar, profissional e social, o modelo de relações pessoais, a utilização do tempo e as expectativas sociais, analisando o presente e escolhendo o que se quer perpetuar e mudar. Através da atribuição de valores individuais e sociais, idealizando comportamentos e modelos de relação interpessoal e social, é possível projectar um futuro diferente, rompendo e modificando o que já foi recebido e aprendido.

Considero que são estes alguns dos pressupostos que justificam a Educação Sexual na Escola, em qualquer nível de Ensino/Aprendizagem, quer pelas temáticas que poderão ser escolhidas, quer pela interdisciplinaridade que é possível conseguir.

Acima de tudo, não concluo que a Educação Sexual venha a resolver todos os males de que a sociedade padece, mas a sua ausência da Escola poderá fazer com que essa dimensão continue a decorrer nas escolas, sim, mas de forma oculta, ignorante e prejudicial.

Atenciosamente,

Andrea Diegues

18.5.05
 
Vem aí a escuridão ou será que alguma vez houve luz?
Já há tempos que se anunciava, silenciosamente, mas eis que, finalmente, através de um péssimo trabalho de uma jornalista credenciada (Rosa Pedroso Lima - Expresso), a oposição à educação sexual reentra em cena.
Através de uma peça jornalística - cuja temática poderia fazer algum sentido e até falta - a referida jornalista conseguir fazer, na última edição do Expresso - uma espécie de caldeirada 'informativa' que mistura tudo, sem clarificar nada. Dado que não é inexperiente, só pode ter sido propositado:

- refere-se a programas estatais e a manuais oficiais que não existem;
- desenquadra as estratégias propostas em manuais (que nem sequer cita) de modo a que possam ser, de facto, assutadores e fruto do trabalho de profissionais sem preparação técnica nem científica, no fundo, de mentes preversas;
- socorre-se de profissionais supostamente 'experts' e, como não sabemos como lhes comunicou as conclusões do seu 'estudo' desses documentos, estes não se fizeram rogados em classificá-los ("o exercício proposto é ridículo"; "não há contexto emocional" - Manuela Calheiros).
A mim, enquanto profissional e activista, e sem misturar o facto de ser voluntário da APF (visada claramente em toda esta estratégia), choca-me e assusta-me o caminho que está a ser traçado.

É de referir que a (eterna!) Associação das Famílias Numerosas, entre outros defensores da moral e bons costumumes, está perfeitamente atenta a tudo isto e têm já a correr um abaixo assinado contra a educação sexual e até a punição de todos os responsáveis, entre outros documentos, das 'Linhas Orientadoras', dos Ministérios da Educação e da Saúde e da APF. Se não se tinham aliado antes, a jornalista e este tipo de associações estão em perfeita sintonia.

Não sei o que pensam de tudo isto e se têm acompanhado, mas parece-me que, se estas notícias também vos preocupam, deveriam agitar-se, nomeadamente, congratulando esta senhora jornalista por ter conseguido ser muitíssimo eficaz na destruição.

Caso não tenham o jornal, poderão consultar a notícia e o seu desenvolvimento no site:
http://www.forumdafamilia.com (ficam a conhecer estas mentes brilhantes!).
Mais um blog deste género: http://faccioso.blogspot.com/2005/05/chegou-o-momento-de-dizer-no-extractos.html
Um abraço
António Manuel Marques

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Processo de Bolonha
Está a decorrer uma reunião em Bergen...
ver mais: http://www.bologna-bergen2005.no/

From Berlin to Bergen
Ministers responsible for higher education in 40 European countries meet in Bergen 19-20 May 2005
to take stock of the progress of the Bologna Processsince the Berlin meeting in September 2003
and to set directions for the further developmenttowards the European Higher Education Area to be realised by 2010

Conference documents

17.5.05
 
FÓRUM PAULO FREIRE
IV ENCONTRO INTERNACIONAL

CAMINHANDO PARA UMA CIDADANIA MULTICULTURAL PLANETÁRIA

CARTA DO PORTO

Vivemos numa conjuntura histórica globalizada que, interpretada, critica e esperançosamente, nos desafia a “trabalhar a legitimidade do sonho ético-político da superação da realidade injusta” (Paulo Freire). Por isso, o IV Encontro Internacional do Fórum Paulo Freire, realizado na cidade do Porto, Portugal, de 19 a 22 de Setembro de 2004, com o tema “Caminhando para uma Cidadania Multicultural”, reafirma a complexidade e variedade das interpretações e das explicações do mundo actual, não justificando, com isso, a manutenção e aprofundamento da exclusão da maioria da humanidade.
Neste Encontro, trabalhámos para consolidar novas propostas de cidadania multicultural planetária, dando continuidade às propostas do Fórum Paulo Freire, formuladas e aprovadas nos Encontros Internacionais de São Paulo (Carta de São Paulo,1998), como princípios orientadores da acção em defesa dos oprimidos; de Bolonha (Carta de Bologna, 2000), na qual foi lançado o Movimento Universitas Paulo Freire (UNIFREIRE); de Los Angeles (Planetaries Elections, 2002), em que foram firmados os compromissos por um mundo “como sonho possível”.
O Fórum do Porto sublinha a importância de construirmos relações humanas fundadas na convivência emancipatória, amorosa, sensível, criativa e reconhece que cumprir este objectivo impõe a substituição da ordem capitalista por uma nova ordem mundial, em que as comunidades e os povos sejam sujeitos de suas próprias histórias. Valoriza as identidades e subjectividades individuais e colectivas, defendendo, especialmente, o fortalecimento da cidadania, da democracia e do carácter público da educação. Assume o diálogo intertranscultural crítico como instrumento, como prática libertadora e como fortalecimento dos processos de conhecimento.
Com base nesses pressupostos, defendemos a implementação de todos os movimentos e acções mundiais pela não-violência, que potencializam a inclusão social, a resistência às transgressões éticas e se opõem, radicalmente, a todas as formas imperialistas de dominação e de opressão, particularmente a militar, e reiteramos os seguintes compromissos:

Lutar para superar a situação de opressão das pessoas, comunidades e povos que se encontram em situações de opressão, para que se tornem sujeitos de seus direitos e valores e assumam a educação com sonho possível.
Contribuir para potencializar as iniciativas relacionadas com o projecto eco-político-pedagógico das diferentes comunidades.
Integrar redes locais, nacionais e mundiais de pessoas e de instituições para a valorização e fortalecimento de formas de Cidadania Multicultural Planetária, numa perspectiva de questionamento crítico e de combate ao neoliberalismo e a outras formas de poder hegemónico.
Contribuir para os movimentos sociais, especialmente no âmbito da justiça, da luta pela paz e da defesa dos princípios da “Carta da Terra” (1999), do “Manifesto 2000” (Unesco), da “Declaração do Milénio” (2000), dos documentos aprovados nos Encontros Internacionais do Fórum Paulo Freire, bem como de todos aqueles já consagrados nas amplas discussões nacionais e internacionais, como reivindicação ético-libertadora dos povos – e, particularmente, os do Fórum Mundial de Educação e do Fórum Social Mundial.
Reafirmar a educação, o conhecimento, a ciência e a tecnologia como direitos de todos e de todas, recusando, veementemente, a sua mercadorização, como vem sendo defendida por agências bilaterais e multilaterais, especialmente pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

 
Formação matemática dos professores: uma questão a discutir
Face aos baixos resultados obtidos pelos alunos portugueses no PISA2003, a Ministra da Educação enunciou um conjunto de medidas concretas no sentido de valorizar a formação matemática dos professores do ensino básico.

Não poderia estar mais de acordo com este objectivo! Qualquer pessoa de bom senso concordará que todo o professor que ensina Matemática deverá ter uma boa formação em matemática. A questão que gostaria de deixar aqui para reflexão é: O que significa uma boa formação matemática para os professores?

O que se entende por uma boa formação matemática para os professores tem vindo nos últimos anos a estar na agenda de educadores matemáticos e de matemáticos em diversos países. Existe um considerável número de investigações que alertam para que a formação matemática dos professores tem particularidades específicas distintas daquela que é necessária para os que usam esta ciência, como seja os matemáticos. Uma coisa é fazer matemática, outra é ensinar. Enquanto um utilizador de matemática pode fazer recurso ao seu saber matemático, sem em cada momento se questionar porque o faz deste ou daquele modo, quem ensina matemática não só tem de conhecer o procedimento, como tem de ter presente o seu significado, a sua origem histórica, a sua justificação e procedimentos equivalentes. A consciência de que estas ideias têm tido pouco eco na formação matemática dos professores levou a que, há cerca de um ano, fosse criado um grupo de trabalho, a convite da Secção de Educação e Matemática da Sociedade Portuguesa de Ciências de Educação, envolvendo representantes desta secção, da Associação de Professores de Matemática e da Sociedade Portuguesa de Matemática. O seu objectivo é elaborar um conjunto de recomendações para a formação inicial de professores de qualquer nível de ensino, no que respeita à componente matemática.

Muito embora o trabalho desta equipa ainda não esteja concluído, é desde já possível avançar com algumas das ideias que temos vindo a discutir e que gostaria de aqui deixar. Desde logo é de assinalar que melhorar a formação matemática de professores não significa necessariamente aumentar o número de disciplinas de matemática e o tempo dedicado a esta componente. A questão não é tão simples. Se é certo que num ou noutro caso tal terá de acontecer, a questão central que atravessa a formação matemática do professor de qualquer nível de ensino é de que não basta saber matemática, é essencial que esta formação favoreça, através de experiências matemáticas ricas e significativas, o desenvolvimento de uma compreensão profunda da matemática que se via ensinar. É preciso, por exemplo, que o professor conheça os conceitos, procedimentos e estruturas matemáticas, a sua origem histórica, diversas abordagens e perspectivas, e as relações entre diferentes temas matemáticos de forma a poder utilizá-los e a interrelacioná-los no seu ensino. Como pode um professor responder a um dado aluno com dificuldades de compreensão num dado conceito matemático com uma outra abordagem possível se ele próprio não conhece mais nenhuma? Como pode o aluno ter uma visão integrada da Matemática se o próprio professor não a tem?

Uma compreensão profunda da própria natureza da matemática é outra característica essencial. Tal como é largamente documentado na investigação, o entendimento que se dá à matemática marca de forma inevitável o modo como se ensina. Se se acredita que na matemática, por exemplo, o raciocínio intuitivo e os processos de tentativa e erro são secundários e apenas usados na criação matemática, remetida exclusivamente para os matemáticos, o ensino certamente será fortemente marcado por apresentar uma matemática já acabada, muitas vezes incompreensível para os alunos.

Estas duas ideias, embora não cubram todas as orientações que estamos a elaborar, são por si já suficientes para questionar o que são ainda muitas das práticas da formação matemática que se faz nas instituições de formação inicial e contínua de professores de todos os níveis de ensino. Este parece ser um momento particularmente adequado – Portugal está presentemente a reequacionar todo o ensino superior, nomeadamente por razões decorrentes do Processo de Bolonha – para que se repensem as opções do passado, enfrentando os desafios que hoje se colocam.


Leonor Santos
Faculdade de Ciências
Universidade de Lisboa
Comentários inquietacoes_pedagogicas@hotmail.com

 
Revista Aprender
A partir de amanhã já poderá encontrar o quarto número da revista Aprender ao longo da vida, publicação trimestral da Associação O Direito de Aprender.

Neste quarto número poderá ler um dossier sobre Saúde numa perspectiva de aprendizagem ao longo da vida.
O médico ANTÓNIO CARDOSO FERREIRA fala-nos da sua larga experiência de promoção da saúde e mostra como a visão do “aprender” tem de ser muito mais larga do que a que advém da leitura de livros. • Berta Nunes, médica e antropóloga, escreve sobre o papel que a medicina popular pode desempenhar no tratamento de uma doença • O economista Rogério Roque Amaro analisa as novas formulações de Saúde e Desenvolvimento que se têm proposto nos últimos 30 anos.
2005 é o Ano Europeu da Cidadania pela Educação, e MARIA EMÍLIA BREDERODE SANTOS escreve o primeiro dos artigos de diversos autores sobre este tema que a revista irá abordar ao longo deste ano.
Numa entrevista, o Professor Budd Hall, director da Faculdade de Educação da Universidade de Victoria, no Canadá, que tem estado ligado às dimensões de aprendizagem das mudanças sociais durante grande parte da sua vida, diz que tudo o que aprendeu foi fora das Universidade.
Nos anos 70, o Austríaco IVAN ILLICH era muito lido e discutido. As suas obras influenciavam todos os que queriam pensar a escola e problematizar a Educação. Hoje está quase completamente esquecido e, no entanto, as suas ideias são, em muitos aspectos, mais actuais do que nunca.Sobre o legado e actualidade de Ivan Illich conversam Rui Canário, da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, e Olga Pombo, da Faculdade de Ciências da mesma Universidade.
A situação da Educação de Adulltos em Portugal é abordada em dois artigos. No primeiro, ALBERTO MELO afirma que a sociedade portuguesa necessita de um forte movimento social que permita pressionar no sentido de um contexto cultural, legal e organizacional mais propício à educação de todos e à cidadania activa e participativa.No segundo, Paula Guimarães analisa o papel que a Unidade de Educação de Adultos (UEA) da Universidade do Minho tem procurado ter desde a sua criação em 1976 até hoje.
Este número da revista Aprender inclui ainda uma reportagem sobre a rádio local de Pedrógão Grande – Rádio Triangulo: O boom das rádios locais registado em meados dos anos 80 foi explicado pela novidade do veículo, a linguagem popular que utilizava e a atenção dada a temas desprezados pelas rádios nacionais. Mas, como todas as rádios locais, esta também enfrenta problemas de sobrevivência apesar de cumprir o papel de garantir aos habitantes da vila que o seu dia-a-dia pode ser notícia.
E ainda:Livros, Internet e Notícias

16.5.05
 
CUIDAMOS MAIS DAS ELITES DO QUE DO BÁSICO PARA TODOS

Numa visita recente a escolas portuguesas, um grupo de noruegueses, interpretando uns gráficos que uma delas disponibilizava sobre a avaliação do ano anterior, chegou à conclusão que em Portugal nos preocupamos mais com as elites do que com as bases, contrariamente ao que acontece no regime que os rege. Conforme explicaram, no seu caso e também no ensino básico, a atenção é mais dirigida à elevação do nível cultural de todos do que a fazer evoluir mais aqueles que, à partida, já têm mais facilidade. Desiludam-se aqueles que, como eu, pensam que todo o esforço dos professores deste nível de ensino, aqui em Portugal, se concentra nos alunos que têm mais dificuldade, para que todos consigam atingir um determinado patamar de conhecimento que o Estado define como essencial. Acredito mesmo que, se se lhes perguntasse, essa seria a imagem que a maioria dos professores devolveria daquilo que fazem.
Mas, afinal, parece que estão à vista as provas do contrário…

O que levou o grupo de visitantes a pensar que o nosso sistema é selectivo foi obviamente o elevado número de “negativas” em cada disciplina e o elevado número de alunos que não transitaram de ano. Mas o que mais contribuiu para confirmar as suas suspeitas foi a frequência com que os alunos são classificados (por ano e por período), os prazos demasiado curtos entre os vários momentos de avaliação e, sobretudo, uma primeira classificação numérica atribuída a escassos três meses do primeiro contacto. Não esqueçamos que no nosso país esta situação tem contornos ainda mais preocupantes, se considerarmos que, ano após ano, os professores mudam de alunos e os alunos mudam de professores. E se a esta mudança acrescentarmos o facto de um professor ter, em cada ano, mais de cem alunos, fácil é deduzir que o tempo de apreciação é demasiado curto para um conhecimento aprofundado de cada um e para uma intervenção individual. Nas condições que temos e apesar de um discurso de orientação diferente, o que é, de facto, incentivado é que os alunos sejam classificados conforme as competências que já detinham: os “mais desenvolvidos” estão votados ao sucesso e os “menos desenvolvidos” são votados ao fracasso.

O mínimo que se pode dizer é que impera a ambiguidade. A um sistema de classificação mais consentâneo com a selecção dos mais capazes são frequentemente associadas normas de sinal contrário, mais próximas da retórica da educação para todos, que mais não fazem que gerar efeitos não desejados. São exemplo disso a tentativa de desmotivação, por via burocrática, quer da atribuição de uma percentagem elevada de “negativas” por disciplina, quer das chamadas “descidas” de nível ao longo do ano. Mantendo-se a organização do processo de ensino entre parênteses, a primeira é susceptível de produzir como consequência a desaceleração do ritmo para possibilitar o acompanhamento de, pelo menos, mais alguns (aqui encontrarão razão os que consideram que o sistema de ensino é nivelado por baixo); quanto à segunda, não admira que provoque alguns mecanismos de defesa na atribuição dos níveis, sobretudo no primeiro momento de avaliação (que é quando menos se conhecem os alunos) e que leve, muitas vezes, à aplicação do princípio in dubio contra reo.

Poderão eventualmente os professores não ter ainda encontrado o melhor modo de agir face às características das novas populações escolares (os tempos já não são o que eram e a questão é muito mais complexa do que um mero assumir de exigência e rigor…), mas a incoerência entre o discurso e a prática aos vários níveis de decisão não é certamente o melhor caminho.
Filomena Matos
Publicado no jornal A Capital a 15 de Maio de 2005
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15.5.05
 
DO PISA ÀS MEDIDAS ENUNCIADAS PARA O 1ºCICLO

É com alguma preocupação que nos vamos confrontando com os dados que o PISA nos vai revelando sobre a posição de Portugal em relação aos outros países da OCDE. Todavia, também é hoje cada vez mais abundante a literatura que se vai produzindo e chamando a atenção para as leituras relativizadas que se devem fazer de qualquer estudo de educação comparada.

Lembro que esta febre comparativa já surgiu na Europa nos anos 20 com os testes psicométricos em que se comparavam as inteligências das populações dos diversos países. Há ainda estudos que nos mostram como o PISA vai construindo uma ideia de insucesso "nacional" e portanto com uma fatalidade gerada pelos próprios sistemas educativos de massas.

Mas a questão que queria deixar é a seguinte: sendo a prioridade o trabalho no 1º ciclo e sendo este conduzido em regime de monodocência, não terá mais sentido uma abordagem integrada e globalizante da forma de conduzir esse tipo de ensino do que focalizar agora as questões quase exclusivamente na matemática? Escrever um texto não implica também ser capaz de resolver um problema? Codificar as ideias por palavras, ou através de outras conceptualizações é, na minha opinião, a questão central. Naturalmente que a resolução deste problema não se faz sem um suporte de conhecimentos específicos, mas também exige ser-se capaz de pensar uma estratégia que faça apelo ao uso de tais instrumentos/conhecimentos que se podem ir buscar a diversas fontes. É aqui que o trabalho dos apoios às dificuldades dos alunos, agindo "just in time", pode ser decisivo. Dito isto, penso que, mais do que mais matemática ou outra coisa qualquer, é preciso romper com uma lógica de pedagogia "burocrática" que assenta em todos fazerem quase o mesmo no mesmo tempo. Esta perspectiva não é contraditória com mais formação em matemática ou noutra área, mas permite olhar o trabalho formativo como um todo fazendo apelo à importância da equipa.

Quanto às propostas da Srª Ministra sobre a necessidade de criação de uma escola a tempo inteiro, não posso estar mais de acordo, mas penso que, para isso, é preciso uma negociação séria com as Câmaras Municipais, no que concerne à transferência de competências e de recursos; acabar de vez com o regimes duplo,; negociar com o sector privado de "tempos livres" que até agora tem suprido esta lacuna da escola pública; e finalmente cuidar da inclusão do primeiro ciclo de forma adequada nesta verticalização à força nos agrupamentos que, em muitos locais, se tornam parte do problema em vez de solução.

Sabemos que estes problemas não se resolvem à velocidade da enunciação das medidas. Exigem um trabalho diversificado e multilateral de apoio, assistência e consultoria aos vários actores em presença. É também neste terreno que as instituições de formação de professores, nomeadamente as ESE, podem dar um importante contributo pelo seu estatuto de proximidade local e, naturalmente, pelo seu conhecimento sobre estas questões enunciadas.
Jorge Pinto
Publicado no jornal A Capital a 15 de Maio de 2005
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13.5.05
 
Para além do Pisa...
“Em vez de carpir a perda de um passado nostálgico que nunca existiu, ou de cantar hossanas por soluções ‘milagrosas’ copiadas de outros países que são fruto da sua História, mais vale que cada um de nós, em Portugal, saiba o que pode fazer pela educação, a começar pelos responsáveis políticos, passando pela sociedade no seu todo e acabando onde tudo começa: a sala de aula”

João Barroso
Jornal A Capital de 8 de Maio de 2005

Este poderia ser o parágrafo de início do meu artigo, não sendo meu, pedi-o emprestado ao professor João Barroso. E porquê? Porque tem o mérito de (d)enunciar, mais uma vez, a nossa tradicional tendência para nos preocuparmos com o estado das nossas coisas quando é reflectido por outros, ou seja, de fora para dentro. Nas últimas semanas assistimos mais uma vez à divulgação, repetida quase até à exaustão, dos resultados do Pisa levando-me a pensar no que internamente está por fazer e por reflectir. Penso essencialmente na formação de professores e embora sabendo que a sala de aula de que fala João Barroso não é a sala de aula onde decorre a formação de professores, atrevo-me a dizer que também é urgente pensar nessas outras salas de aula. É que não podemos deixar-nos enredar em raciocínios circulares que não ajudam muito a romper com lógicas e práticas instaladas se a montante não conseguirmos mudar os modelos de formação e as maneiras de pensar o que acontece na sala de aula (agora falo da sala de aula dos ensinos básico e secundário).

A lógica reprodutora ainda impera na formação de professores e mesmo nas situações em que as instituições de formação conseguem introduzir mudanças a ‘aterragem’ dos jovens professores no campo profissional é demolidora e, em muitos casos, o confronto com os colegas é dissuasor do empreendimento de novas formas de estar e de trabalhar.

João Barroso retoma alguns elementos (e a meu ver justamente, porque são dimensões de que os analistas de pendor mais economicista se esquecem sistematicamente) da clássica análise sociológica da relação escola-classes sociais. No entanto, a aceitação desta realidade não pode produzir os mesmos efeitos que produzia há uns anos atrás, ou seja, de resignação dos indivíduos face ao determinismo estrutural que lhes tolhia movimentos e ambições, mas deve servir para aclarar situações, sobretudo num país como Portugal em que a democracia ainda está em construção e em que a origem social ainda pesa de sobremaneira nas escolhas e oportunidades individuais. Contudo muito caminho já foi percorrido e embora os efeitos da massificação sejam nocivos, a democratização que lhe esteve na origem é inquestionável. É sabido que Portugal está longe de ser um país sobreescolarizado e os actuais frequentadores do ensino superior são, na sua maioria, oriundos de famílias que não atingiram esse grau de ensino e isto é um dos resultados evidentes do processo de democratização da Educação (p.ex., em 1999, cerca de 70% dos pais diplomados do 1º ciclo do ensino básico tinham apenas concluído a antiga 4ª classe - ODES, 2000).

Assim, quando falamos de uma profissão em que a constante actualização é uma necessidade inegável e em que se exige uma lúcida consciência sobre o mundo, as pessoas e as coisas, torna-se ainda mais urgente desenvolver modelos de formação, que incluam dimensões que ajudem a rasgar os horizontes culturais e profissionais dos jovens professores. Por isso, a insistência continuada na necessidade de desenvolver competências específicas (a Matemática e o Inglês) parece-me redutora e empobrecedora de um processo desejavelmente mais global em que os professores recém-formados percepcionem o seu trabalho num contexto mais amplo de intervenção educativa com uma forte componente de intervenção social.

Por outro lado, sem um sistema de monitorização/acompanhamento/reequacionamento das práticas dos profissionais que estão há mais tempo no terreno, será difícil mudar os processos de ensino/aprendizagem que decorrem na sala de aula de modo a obter resultados diferentes dos evidenciados pelo Pisa. A proposta da Ministra da Educação sobre os dispositivos de monitorização como apoio às escolas e ao desenvolvimento do sistema educativo é de aplaudir e desenvolver.

Resta, pois, recentrarmos o nosso olhar no que é essencial, retirando dos exemplos exteriores os ensinamentos necessários ao entendimento do que ocorre internamente, de modo a desenvolver formas de pensar e trabalhar mais eficazes mas simultaneamente mais consentâneas com a nossa realidade .
Cristina Gomes da Silva

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12.5.05
 
OBESIDADE INFANTIL: UMA NOVA EPIDEMIA
Segundo a International Obesity Task Force "os níveis de excesso de peso e obesidade nas crianças do Sul da Europa são superiores aos das do Norte à medida que a tradicional dieta mediterrânica tem vindo a ser substituída por alimentos mais ricos em gordura e sal"

O excesso de peso atinge por exemplo 20% das crianças de sete a onze anos em Inglaterra e o governo de Blair já declarou guerra à fast food nas escolas.

Portugal tem uma das taxas de obesidade infantil mais elevadas na União Europeia com 30% das crianças de sete a onze anos com excesso de peso.

Por isso o Plano Nacional de Saúde 2004-20010 inclui um Programa Nacional de Combate à Obesidade. E a DECO (Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor), depois de ter realizado e publicado um estudo da publicidade emitida pelos canais televisivos RTP1, SIC e TVI, vai levar a cabo um seminário com o título "A obesidade infantil : uma nova epidemia" onde, entre outros aspectos, se serão abordadas questões relacionadas com o sedentarismo das crianças, a sua alimentação na escola e a promoção da educação alimentar.

Dia 16 de Maio 2005, das 9 h às 19 h no Auditório da FLAD - Fundação Luso-Americana, Rua do Sacramento à Lapa, 21 em Lisboa.

Publicado no jornal "A Capital" no dia 8 de Maio de 2005

Ver também no jonal Público de 12 Maio http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1222997&idCanal=58

9.5.05
 
Portugal, a educação e as comparações internacionais:que fazer com estes resultados?
Mais uma vez, com a publicação do relatório PISA relativo ao ano de 2003, a imprensa denunciou os “maus resultados” obtidos pelos nossos alunos nas comparações internacionais e fez eco das inúmeras tomadas de posição de dirigentes do Ministério da Educação, de associações de pais e de professores, bem como de alguns “líderes” da opinião publicada, sobre o assunto.
Embora pela negativa, o relevo que durante uns dias foi dado aos problemas da educação na comunicação social é importante e podia contribuir (juntamente com muitos outros diagnósticos e estudos já realizados em outros contextos) para uma análise informada dos problemas que afectam a educação em Portugal e para uma indagação fundamentada das melhores soluções.
Infelizmente, tal não acontece, porque o que faz o êxito mediático do PISA não são alguns dados interessantes que o relatório fornece sobre cada um dos países envolvidos no estudo, mas sim a tensão competitiva que a divulgação de um “ranking” de países, em função dos resultados obtidos pelos alunos nos vários testes, facilmente gera.
Embora nestas questões da educação a “coopetição”(isto é, uma “competição colaborativa”) seja mais importante do que a “competição”, a divulgação do “ranking” não traria grande mal ao mundo se fosse devidamente ponderada e explicada e se, na ânsia de comparar os países, e de encontrar nos campeões as “receitas de sucesso”, não se esquecesse o que faz a especificidade de cada caso.
Relativizar as comparações
Na verdade, as leituras apressadas (e simplificadas) que se fazem dos resultados dos alunos nos testes do PISA não têm, normalmente, em conta a multiplicidade de factores (muitos deles contextuais) que interagem com esses resultados e a diversidade de “leituras” que é possível obter através dos mesmos dados quando cruzados entre si . É o que acontece, entre muitos outros exemplos, com Portugal, quando cruzamos os resultados obtidos nos testes, com o grau de escolaridade da mãe dos alunos. Atendendo aos baixos índices de escolaridade que apresenta a população adulta portuguesa (e especificamente as mães dos inquiridos) os alunos portugueses obtém resultados claramente superiores aos “expectáveis”, por comparação com os países onde as mães têm níveis de escolaridade claramente superiores. Assim, se houvesse ponderação destas variáveis, Portugal estaria entre os 10 primeiros lugares nos referidos “rankings”, revelando (nesta como em outras análises do mesmo tipo) índices de equidade superiores à maior parte dos países abrangidos pelo estudo.
Esta observação e outras que se poderiam fazer para ilustrar que nem tudo vai mal na nossa educação, não visam diminuir o impacto da avaliação negativa que, objectivamente, os dados do PISA, na sua maioria, revelam. Elas visam, por um lado, contrariar as teses catastrofistas que, de tanto exagerarem as dimensões da crise, mais não fazem do que ter um efeito paralisante, face à “magnitude” dos problemas a resolver. Por outro lado, elas pretendem sublinhar o facto de não podermos compreender os problemas do presente sem conhecer o nosso passado (e neste caso o nosso passado recente).

O que foi preciso fazer para chegar aqui
Não podemos esquecer que Portugal, nos últimos trinta anos, e no que se refere ao crescimento e aperfeiçoamento do sistema educativo, teve de saltar múltiplas etapas que os outros países europeus já tinham percorrido, desde o princípio do século XX e, em particular, a partir dos finais da segunda guerra mundial, no que concerne a articulação entre a educação e desenvolvimento económico. E nestes trinta anos Portugal conseguiu não só recuperar o enorme atraso que tinha, nomeadamente, na quantidade e equidade da oferta educativa, mas também, e apesar das insuficiências, promover a democraticidade da escola pública que um passado, de pelo menos 50 anos, tinha amputado.
Para se perceber o esforço que foi preciso fazer neste domínio, basta lembrar quatro factores macro-estruturais que condicionaram (e dificultaram) a expansão do ensino público após o 25 de Abril de 1974:
- Construir, na educação, o “Estado Providência”, em plena crise global do modelo do “Estado Providência”.
- Desenvolver uma política expansionista (típica dos “30 gloriosos anos” de crescimento económico que os países europeus mais desenvolvidos tiveram a seguir à segunda guerra mundial), nos anos pós-1974 que não foram “tão gloriosos” quanto isso (na ressaca das crises petrolíferas, dos acordos com o FMI, com a recessão à vista, etc.)
- Ter necessidade de introduzir mudanças estruturais fortes na oferta educativa (construções escolares, planos de estudo, formação de professores, etc.), com um Estado fraco, em perda de legitimidade, submetido às críticas do centralismo e da burocracia.
- Promover a “refundação democrática” do sistema educativo nacional, no mesmo período em que aumentava a influência política externa (e por consequência a regulação transnacional), na sequência da nossa integração na União Europeia e do aumento dos processos de globalização económica.
Nem milagres nem “clones”
Apesar de tudo isto, muita coisa foi feita. O balanço é suficiente? Claro que não! Ainda há muita coisa para fazer? Claro que sim! Os problemas estão identificados, as soluções existem e muitas já são postas em prática na invisibilidade dos espaços escolares não mediatizados. Em vez de carpir a perda de um passado nostálgico que nunca existiu, ou de cantar hossanas por soluções “milagrosas” copiadas de outros países que são fruto da sua História, mais vale que cada um de nós, em Portugal, saiba o que pode fazer pela educação, a começar pelos responsáveis políticos, passando pela sociedade no seu todo e acabando onde tudo começa: a sala de aula.

João Barroso
Publicado no jornal A Capital a 8 de Maio
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5.5.05
 
Alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo
Foi aprovada pelo Conselho de Ministros de 28/4/2005 a proposta que altera a Lei de Bases do Sistema Educativo. Será agora enviada para a Assembleia da República. O Governo pretende assim criar o enquadramento legal para a concretização do Processo de Bolonha e para a reorganização do sistema de ensino superior português. Tem sido dado grande ênfase neste processo ao sistema de três ciclos, mais conhecido por LMD (licenciatura, mestrado, doutoramento) bem como à duração de cada um deles. Mais interessante do que o número de anos que se estuda será porém saber se, com a aplicação do processo de Bolonha às nossas escolas, se conseguirá renovar formas de trabalho de alunos e professores, o modo como se aprende e se avalia o estudo. São tantas as inquietações pedagógicas: que disponibilidade existe para conhecer e valorizar boas práticas existentes, para trocar experiências, para melhorar a eficácia do sistema? Que incentivos serão criados para que os professores pensem o ensino centrado na aprendizagem e não nos conteúdos ensinados?

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4.5.05
 
Do Pisa às medidas enunciadas para o 1.ºCiclo
É com alguma preocupação que nos vamos confrontando com os dados que o PISA nos vai revelando face à posição de Portugal em relação aos outros países da OCDE. Todavia, também é hoje cada vez mais abundante a literatura que se vai produzindo e chamando a atenção para as leituras relativizadas que se devem fazer de qualquer estudo de educação comparada. Lembro apenas que esta febre comparativa já surgiu na Europa nos anos 20 com os testes psicoméricos em que se comparavam as inteligências das populações dos diversos países. Tais procedimentos levaram a posteriores desenvolvimentos em diversos sistemas educativos europeus. Há ainda estudos que nos mostram como o PISA vai construindo uma ideia de insucesso "nacional" longe dos alunos e portanto com uma fatalidade gerada pelos próprios sistemas educativos de massas.
Mas a questão que queria deixar é a seguinte: Sendo a prioridade o trabalho em redor do 1º ciclo e sendo este conduzido em regime de monodocência, não terá mais sentido uma abordagem integrada e mais globalizante da forma de conduzir esse tipo de ensino do que focalizar agora as questões quase exclusivamente na matemática? Escrever um texto não implica também ser capaz de resolver um problema? Codificar por palavras, ou através de outras conceptualizações, as ideias é na minha opinião a questão central. Naturalmente que a resolução deste problema não se faz sem um suporte de conhecimentos específicos, mas também exige ser-se capaz de pensar uma estratégia que faça apelo ao uso de tais instrumentos/conhecimentos que se podem ir buscar às diversas fontes. É aqui que o trabalho dos apoios às dificuldades dos alunos, agindo "just in time", pode ser decisivo. Dito isto, em minha opinião, penso que do que mais matemática, ou outra coisa qualquer, é preciso romper com uma lógica de pedagogia "burocrática" que assenta em todos fazerem quase o mesmo no mesmo tempo. É certo que esta perspectiva não é contraditória com mais formação em matemática ou noutra área qualquer, mas permite olhar o trabalho formativo como um todo fazendo apelo à importância da equipa.
Quanto à propostas da Srª Ministra sobre a necessidade de criação de uma escola a tempo inteiro, não posso deixar de estar mais de acordo, mas penso que para isso é preciso, uma negociação séria com as Câmaras Municipais, no que concerne à transferência de competências e de recursos; de acabar de vez com os regimes duplo, pois é inaceitável que hoje eles ainda se mantenham; de negociar com o sector privado de "tempos livres" que até agora tem suprido esta lacuna da escola pública; e finalmente "cuidar" da inclusão do primeiro ciclo de forma adequada nesta verticalização à força nos agrupamentos, que em muitos locais, se tornam parte do problema em vez de solução. Sabemos que estes problemas não se resolvem à velocidade da enunciação das medidas. Exigem um trabalho diversificado e multilateral de apoio, assistência e consultoria aos vários actores em presença.
Penso que é também neste terreno que as instituições de formação de professores nomeadamente as ESE´S podem dar um importante contributo pelo seu estatuto de proximidade local e, naturalmente, pelo seu conhecimento sobre estas questões enunciadas.

Jorge Pinto


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2.5.05
 
Pisa 2003
Os dados do estudo internacional PISA 2003 apresentados na última quarta-feira pelo Ministério da Educação merecem-nos algumas reflexões. Segundo o Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE) o PISA 2003 focou a literacia matemática definida como a “capacidade de um indivíduo identificar e compreender o papel que a matemática desempenha no mundo, de fazer julgamentos bem fundamentados e de usar e se envolver na resolução matemática das necessidades da sua vida, enquanto cidadão construtivo, preocupado e reflexivo”. Para os pais e professores que queiram conhecer alguns dos itens que medem esta competência podem fazê-lo consultando uma das publicações editados pelo GAVE. A pontuação nas escalas de literacia matemática foram agrupadas em seis níveis de proficiência que representam conjuntos de tarefas de dificuldade crescente em que o nível 1 é o mais baixo e o nível 6 o mais elevado. De notar que em Portugal ainda existem cerca de 30% dos nossos jovens de 15 anos com nível 1 ou inferior a 1, quando nos países da OCDE essa percentagem é de 21%. Este dado é preocupante pois representa que cerca de um terço dos nossos alunos apenas é capaz de responder a questões que envolvem contextos familiares e resolver procedimentos que correspondem a situações de rotina. Em contrapartida enquanto que nos países da OCDE 15% dos alunos estão nos níveis de proficiência 5 ou 6, em Portugal apenas 5% se encontram nessa situação.
O baixo nível de desempenho a matemática tem vindo a repetir-se nas diferentes avaliações nacionais e internacionais. Existem problemas de vária ordem, nomeadamente os que têm a ver com aspectos económico-sociais para os quais não é fácil encontrar resposta a curto prazo. Mas outros são intrínsecos ao próprio sistema educativo, como o da retenção (vulgo repetência) dos alunos. Os dados do PISA mostram mais uma vez que não se promove o sucesso dos alunos através da sua retenção.
De realçar a atitude da Ministra da Educação que, reconhecendo o problema da literacia matemática como grave, decidiu avançar com medidas que, embora pontuais não deixam de ser importantes. Como tem vindo a ser dito por muitos é no 1º ciclo do ensino básico que muitos dos problemas começam. Daí a importância das medidas anunciadas, nomeadamente as que se referem à formação inicial e contínua de professores daquele nível de ensino. Assim, espero que se concretize, já a partir do próximo ano lectivo, o plano nacional de formação contínua de professores em matemática anunciado numa parceria com o ensino superior. Este processo deve conduzir a médio prazo à criação de estruturas que garantam localmente um ambiente de reflexão e discussão sobre as práticas de ensino e em especial da Matemática, tendo em conta que os professores do 1º ciclo são professores generalistas, que têm de ensinar todas as áreas. Este trabalho pode e deve ser dinamizado por um professor do 1º ciclo, dos muitos que existem com boas práticas a matemática, a quem seja atribuída essa função.

Maria de Lurdes Serrazina

Publicado no jornal A Capital a 30 de Abril

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1.5.05
 
GRÃO A GRÃO ENCHE A GALINHA O PAPO
A propósito da apresentação pública dos resultados do estudo PISA* 2003, no passado dia 27 de Abril, foram definidas importantes linhas de orientação estratégica para a Educação.

O Primeiro Ministro referiu quatro principais objectivos:

1º - Rigor, avaliação e exigência para todos (governo, administração, professores, escolas, alunos);
2º - Medidas a tomar, dia a dia e pontualmente, de ataque aos pontos críticos já identificados e analisados e que estudos como o PISA sugerem. Fazer com que as conclusões e recomendações das análises e avaliações feitas tenham resultados práticos e abandone-se a ideia das grandes reformas;
3 º - Prioridade à matemática;
4º - Estabilização do corpo docente das escolas, sem o que políticas de rigor e exigência se tornam absurdas e ineficazes.

Foram também quatro as medidas concretas que a Ministra da Educação anunciou e que, em grande parte, decorrem directamente dos resultados de estudos como o PISA:

1 º Formação contínua em matemática e em situação (na escola) dos professores do 1º ciclo com o apoio das instituições do Ensino Superior;
2 º Revisão das condições de acesso e formação profissional dos professores do 1º ciclo;
3º Alteração das habilitações e condições de recrutamento dos professores de matemática do 2º e 3º ciclos do ensino básico;
4º Racionalização do uso dos recursos educativos, como sejam, por exemplo, o alargamento do horário escolar dos alunos com a articulação entre as actividades escolares e as de tempos livres, a ocupação plena dos tempos escolares e o agrupamento e rentabilização dos apoios educativos.

Parecem decisões do mais elementar bom senso porque os pontos críticos do sistema educativo estão, há muito, ampla e longamente identificados e é bom que alguns deles se vão resolvendo, “grão a grão”, gradual e sistematicamente.

Mas há riscos e alguns dos grãos não são fáceis de atacar. A educação é um sistema, as escolas são organizações e mexer numa pedra sem “aconchegar” e sustentar as outras pode fazer ruir o edifício. Há o enorme risco de – se as pequenas mudanças se não integrarem num plano geral sólido e articulado – ao invés de se ganharem, se perderem algumas das valências essenciais da qualidade da educação. Na definição de cada grão tem de estar subjacente a relação com o todo, com “o papo cheio da galinha”, para que ao fim e “a posteriori” a necessária grande reforma educativa acabe por ficar consagrada.

Se não veja-se, em apenas dois exemplos, como – e mantendo o suporte dos provérbios populares – uma árvore pode esconder a floresta:

- O 1º ciclo do ensino básico tem de ser, desejável e essencialmente e como consagra a lei de bases, “globalizante e da responsabilidade de um professor único”. A tentação da “disciplinarização”, mesmo que da matemática, tão no jeito dos docentes dos restantes ciclos do ensino básico, pode, sem proveito, agravar uma situação já em si tão frágil. Porque nada nos diz que à matemática não se seguirão outras especialidades (o inglês, as ciências, …) e de professores coadjuvantes passaremos a ter professores especialistas de disciplinas, dividindo-se a amplitude de espaço e de tempo imprescindíveis às iniciações e consolidações dos primeiros anos de escolaridade. Atente-se à formação dos professores “únicos” do ensino básico dos países europeus com melhores resultados em matemática!!!

- A racionalização de recursos que pode ter no agrupamento de escolas um dos seus sinais mais positivos e evidentes, pode – como muitas vezes se tem verificado – apenas significar uma rentabilização financeira, sem, como o programa de XVII Governo Constitucional consagra, “uma lógica em que a organização seja instrumental face às finalidades educativas”.

Apoia-se e valorizam-se as pequenas decisões que põem cobro a situações críticas evidentes e conhecidas, mas não se ignore que a sua pequenez e facilidade é só aparente e não prescindem de se enquadrar num todo articulado e sólido.



*Programme for International Student Assessement


Maria José Rau

Publicado no jornal A Capital a 30 de Abril

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