Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

6.3.05
 
Avaliação das Escolas*
É com muita satisfação que encontro, amiúde, no Programa Eleitoral do PS para a educação preocupações com a avaliação, a prestação de contas, o rigor, a regulação e a exigência. Vejamos: “enraizar em todas as dimensões do sistema de educação e formação a cultura e a prática da avaliação e da prestação de contas”, “maior autonomia significa maior responsabilidade e prestação de contas”, “um programa nacional de avaliação das escolas”, “o Ministério da Educação deve concentrar em si as funções de financiamento e regulação do sistema…., avaliação e inspecção”, “a exigência e rigor que se pretende imprimir ao funcionamento do sistema educativo implica transparência e responsabilização … pelo que constitui imperativo do PS consolidar e disponibilizar um sistema de informação actualizado e credível, coerente e acessível”.

Como é que todos estes anseios se vão traduzir em realidade? Concretamente, como é que vão tomar corpo na avaliação externa da escola?

É muito oportuna a leitura do relatório editado em 2004 pela Comissão Europeia sobre a avaliação das escolas na Europa, aonde, tristemente e com referência a Portugal, se diz que o programa da avaliação externa das escolas iniciado em 1999 “foi suspenso em 2002 na perspectiva de um reajustamento” (aonde, três anos depois, está no terreno esse reajustamento?). Reconhece-se aí que a necessidade e urgência de avaliação das escolas na Europa decorre dos movimentos que marcaram a gestão da educação no sentido da “descentralização de recursos e harmonização de objectivos a nível nacional”. Eu também a relacionaria com o fortalecimento das políticas internacionais e europeias de definição de indicadores comuns para analisar e comparar os sistemas educativos e o seu desempenho.

Identificam-se quatro principais categorias de avaliação dos sistemas educativos – realizada, “na maior parte dos países, por um corpo de inspecção dependente do estado central”, em alguns outros por “autoridades educativas distintas” –, a saber:
– a que considera o estabelecimento de ensino no centro do sistema de avaliação, integrando nele a avaliação dos professores a título individual executada pelo director da escola;
– a que também considera a escola no cerne do sistema da avaliação mas não realiza, de forma regular, a avaliação dos professores;
– a que centra a avaliação nos professores, desenvolvendo pouco ou nada a relação desta com a avaliação da escola como entidade autónoma;
– a que centra a avaliação nas autoridades locais de educação como responsáveis pela oferta educativa existente e, consequentemente, pelo desempenho das escolas.

Quando o PS se propõe “lançar” um programa nacional de avaliação das escolas, que, ao ser governo, não se esqueça do percurso que, no passado recente, já fez nesta matéria. Porque tudo se pode e deve reajustar, melhorar e corrigir e, por certo, o programa de avaliação externa das escolas, obrigatória e sistemática e conduzido pela Inspecção Geral da Educação, necessita de progredir e aprofundar algumas áreas, nomeadamente, a da avaliação da eficiência. Mas ignorá-lo e desconhecê-lo, ou parar para começar de novo e do nada é que não. Não, porque não há progresso e é um eterno retorno que raramente permite ultrapassar a mediania e se fica pela ambição fácil e insustentável.

Acabe-se, definitivamente, com o que, de forma tão expressiva, os examinadores da OCDE referiram, em 1981, no seu relatório sobre a política educativa portuguesa, ao afirmarem que a educação em Portugal era“ como se arquitectos com concepções radicalmente diferentes tivessem sido nomeados, em sucessão rápida, para um mesmo projecto. Cada arquitecto, antes de ser substituído, teria tido o tempo exactamente suficiente para apresentar um projecto de grande envergadura e, por vezes, para derrubar ou pelo menos minar qualquer estrutura já existente que lhe fizesse obstáculo”.

Maria José Rau
* Publicado no jornal A Capital a 5 de Março
Comentários inquietacoes_pedagogicas@hotmail.com

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