Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

13.3.05
 
A propósito do 8 de Março: a situação das mulheres na Educação*
A par de muitos outros, um dos direitos por que as mulheres tiveram de lutar foi, sem dúvida, pelo direito à educação. Todas nós nos lembramos daquelas pioneiras que movidas pelo desejo de aprender não hesitaram em encobrir a sua condição feminina, disfarçando-se de homens, para poderem ter acesso às universidades, ou daquelas que rompendo com os preconceitos familiares e sociais conseguiram afirmar-se nos meios académicos e profissionais por mérito exclusivamente seu.
Relativamente a Portugal, os últimos 30 anos mostram que se verificaram mudanças profundas. Pese embora as taxas de analfabetismo na população com mais de 45 anos de idade apresentarem valores para as mulheres que em média são o dobro dos encontrados para os homens, a situação actual nos grupos etários mais jovens no que respeita ao tempo de permanência no sistema educativo, níveis de ensino atingidos e aproveitamento escolar é surpreendente. Para além dos 15 anos, limite de idade da escolaridade obrigatória, as mulheres tendem a permanecer em maior proporção no sistema educativo, nomeadamente nas idades correspondentes à frequência dos ensinos secundário e superior. O seu aproveitamento escolar é superior ao dos rapazes, comprovado pelas menores taxas de reprovação ou de abandono escolar em todo o percurso pós-ensino básico.
Para já, as explicações para estes factos são ainda hipóteses. Numa interpretação optimista, poder-se-á acentuar a confiança que as raparigas depositam no processo formal de ensino para ganharem a sua independência económica, terem acesso a profissões mais bem remuneradas e usufruírem da educação como importante factor da mobilidade e estatuto social. O seu processo de socialização, as suas características psicológicas diferenciais, a maior conformidade com as regras que enformam a organização escolar, o facto de serem ainda as primeiras gerações a beneficiar de uma efectiva democratização do ensino, são geralmente apontados como aspectos que parecem justificar o melhor desempenho das jovens ao longo do seu percurso escolar e as expectativas positivas que as mulheres têm na educação.
Uma perspectiva mais pessimista sustentará que a actual organização do ensino, os seus planos de estudos, a preparação que oferece estão desfasados da realidade e dos interesses dos alunos. Os ensinos básico e secundário estão pensados na lógica do prosseguimento de estudos, poucas são as alternativas de formação, o sistema continua marcado por uma excessiva uniformidade, os conhecimentos que proporciona não valorizam o saber-fazer nem preparam para a vida activa, pelo que a escolaridade pós-básica representa uma desilusão para os rapazes, levando-os a procurar formas de inserção no mercado de trabalho mais imediatas, sem necessidade de outras qualificações. As raparigas, pela herança cultural que transportam da sociedade tradicional, suportariam melhor processos longos de formação.
Como tentativas de explicação estas são necessariamente incompletas. Representam, contudo, visões que coexistem na sociedade portuguesa face à massificação da educação.

Teresa Gaspar
* publicado no jornal A Capital a 12 de Março
Comentários inquietacoes_pedagogicas@hotmail.com

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