Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

24.8.05
 
Ainda o ambiente!


Foto de Ana Maria Bettencourt

Eis uma imagem que vem do fogo!
E, no entanto, não se vêem labaredas nem fumo, nem gente a chorar, ou a correr, ou a lutar contra as chamas, brandindo ramos ou arrastando e assestando pesadíssimas mangueiras…
Aqui os sinais do fogo não são a agitação terrífica do lume, a movimentação tresloucada dos ares faiscando com faúlhas, o pânico ou o desalento nos rostos das pessoas, ou os seus lamentos, ou as suas justas iras e a fadiga extrema.
Esta é uma imagem do “day after”, ou melhor , talvez de um ou dois “years after” .
É silenciosa, nada espectacular, ervas crescendo em geração espontânea, a envolver restos de lenha, espectros de arbustos e de pinheiros queimados ainda jovens. As árvores morrem de pé, lembram-se? Tudo envolto em neblina, sugerindo uma manhã orvalhada de Inverno, de uma infinita tristeza…

Alguns comentários de direcção diferente
Primeiro - Como seria útil que a comunicação social, e especialmente a TV, mostrasse imagens destas, TAMBÉM RELACIONADAS COM O FOGO, e as tratasse no seu significado profundo - a dimensão do ambiente, isto é, o coberto vegetal, a vida recomeçada (em quanto tempo?) e o seu (des)ordenamento, as implicações sociais e afectivas (aqui sim, saber a ressonância deste nas pessoas: os proprietários, os vizinhos, os trabalhadores) o significado económico, em suma, processos que certamente exigem busca de informação, conduzem ao retrato dos protagonistas nos seus contextos, enfim implicam um tratamento jornalístico, com um sentido de serviço de informação sobre fenómenos de enorme importância para a população em geral e não só respeitante aos os protagonistas directos tomados como “objecto” da notícia.
Eis um procedimento que ultrapassaria totalmente a reportagem de efeito imediato, centrada na transmissão repetida das chamas e da exploração despudorada da angústia das pessoas, afinal fácil de realizar – basta focar um “repórter” empunhando um microfone num cenário de fogo (porque não sempre o mesmo, para economizar deslocações?) e dirigir a câmara para os habitantes em estado de emoção pura!
O sucesso imediato é seguro, não há quem duvide do horror…mas o desgaste desse efeito é proporcional - inevitavelmente se banalizam as imagens e as sensações e elas perdem o impacto.
Fogo à hora de jantar ?Onde fica o concelho de XYZ ? Coitadas das pessoas!…

Segundo – As responsabilidades sobre o currículo que estão atribuídas às escolas oferecem várias possibilidades de realização de actividades neste âmbito que poderão adquirir um elevado significado educativo.
No início do ano escolar, as estafadas redacções sobre “as minhas férias” bem podiam dar lugar a um foco sobre os fenómenos relacionados com a mata ou a floresta (cuja existência não é tão evidente nas áreas urbanas, o que não lhe reduz a importância) .
Seria bem oportuno o desenvolvimento de projectos, quer ao nível das turmas, quer no âmbito do projecto curricular da escola, que conduzissem à pesquisa documental em várias vertentes (bibliográfica, cartográfica, suporte visual, etc.), ao estudo articulado e transversal, à recolha de testemunhos e de observação, à elaboração de materiais, à intervenção, em suma, contribuindo para o conhecimento integrado com a cidadania.


Foto de Ana Maria Bettencourt
Texto inserido por Maria José Martins


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