Inquietações Pedagógicas
"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…" Jorge de Sena in Metamorfoses
9.1.06
O que fazer deles?
O que fazer deles?
Chumbam repetidamente, ou melhor, ficam retidos repetidamente, quando passam, ou melhor quando transitam, é por favor e, normalmente saem da escola por excederem a idade ou por, finalmente, com ou sem alguma benevolência/saturação, terem concluído o 9º ano a escolaridade obrigatória.
A conclusão do 9º ano é sempre especial dado o número de níveis negativos com que se pode concluí-lo três!
O que fazer deles?
Todos os governos até hoje andam com estas "crianças" nas mãos sem saberem oque lhes fazer.
Vai daí, legislam. Já é uma mania. Este governo não é excepção. Produziu o Despacho normativo nº 50/2005 e mais um, cujo número não sei, que institui as "turmas de percurso curricular alternativo". O primeiro obriga a fazer o despiste "deles" logo no primeiro período (o que tem lógica) e obriga a gizar um plano de recuperação. Quando a retenção é repetida é o diabo a sete: apoios, actividades de enriquecimento curricular (gostava de conhecer a pessoa que, no Ministério da Educação, inventa estes nomes), contactos com os encarregados de educação, parecer dos serviços de psicologia etc. O segundo institui turmas só com dez alunos e aplica um programa mais adaptado a "eles", mais prático (adoro esta!) e refere que se contratarão com outras entidades, cursos de artes e ofícios (mais despesismo e gostava de saber quais serão essas entidades). Por outras palavras, atafulha-se o tempo dos professores com papelada, com os célebres apoios e o resultado é muito fraco. A taxa de recuperação é reduzida e a frustração dos professores é muita. Criam-se mesmo, em desespero, instituições que integram crianças em risco com um rácio professor aluno de 1 para 2! A taxa de sucesso na recuperação destas crianças é muito baixa. Muitas delas são notícia quando são mortas em acções policias de perseguição após um assalto. O que fazer então para acabar com a instituição de processos e estruturas cada vez mais pesados, cada vez mais burocratizados e cada vez mais caras e cada vez...mais inúteis? O que fazer deles? O óbvio. Começar por perceber o que está mal com "eles": "Eles" vêm de famílias disfuncionais ou de bairros disfuncionais. Pois bem, de pouco ou nada serve dar-lhes aulas de apoio, fornecer tutores e criar as tais turmas de percurso curricular alternativo, se não se intervier junto da família e junto do bairro em termos comunitários. Ora a isto chama-se serviço social, não é função da escola, é do Ministério do Trabalho e Solidariedade Social, autarquias e não está a funcionar. Enquanto isto não se fizer, "eles" continuam na escola a ocupar lugar, agastar o dinheiro de todos nós e a perturbar o funcionamento da dinâmica de aprendizagem, E continuam com fome, e continuam a assistir à violência física entre os pais e à violência da lei do mais forte na rua do seu bairro e ao roubo. Porque intervir socialmente implica ir lá, sujar as botas, trabalhar com as famílias e o bairro, restituir-lhes dignidade e auto-estima pela mobilização dos seus valores e das suas qualidades, implica mobilizar as pessoas para fazerem alguma coisa por elas próprias pois só assim terão toda a força do mundo para exigir do estado. Com esta dinâmica a funcionar, então é possível integrar estas crianças na escola através duma desejável e necessária colaboração entre os serviços sociais e a escola. Mas é mais fácil desculparmo-nos todos com papéis..."Eles" têm falhas em termos conceptuais. Pois bem as aulas de recuperação só terão efeito útil se for feito um diagnóstico destas falhas. Após o diagnóstico, será possível ir "atrás" e refazer, conceito a conceito, aestrutura. Dar mais do mesmo, ou seja voltar a dar a matéria que o aluno não percebeu, não serve para nada. "Eles" são desorganizados no estudo e ou apresentam dificuldades pontuais eou têm uma família com défice cultural e ou tiveram um longo período de doença, etc. Neste caso as aulas de apoio e a tutoria resultarão. "Eles" não estudam porque não estão para isso, porque estudar é ser beto e porque a família até acha graça. Bom, neste caso, com toda a frontalidade e com toda a força duma lei que ainda não foi publicada, a escola deve convidar a família a empregar o respectivo educando como modelo, como actor de telenovela ou como rico (se for o caso).
João Rangel de Lima
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Permiti-me sugerir a leitura deste "post" lá no meu cantinho e não é a 1ª vez que o faço em relação a artigos deste blog. Mas do que gostaria era de ver em jornais alguns alertas que o Inquietações Pedagógicas exprime, não podendo ser em vez das barbaridades que lemos nos jornais, ao menos um contrabalanço a elas.
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