Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

25.4.07
 
OS ANÚNCIOS PERDEDORES
Nos meus verdes anos fui copywriter numa agência de publicidade (Alguns dos anúncios em que colaborei duraram décadas, como foi o caso do "Compal é mesmo natural" que, fabricado em meados dos anos 60, se manteve quase idêntico até muito recentemente...) Talvez por isso, gosto de analisar campanhas publicitárias, de as apreciar ou de as desmontar. E começo a convencer-me que nada há tão difícil como fazer boa publicidade em matérias educativas. Já aqui me interroguei muito criticamente sobre a apocalíptica campanha dos "últimos profissionais" : "Esta é a última oceanógrafa portuguesa..." Lembram-se ? Tratava-se de um grupo de empresários que queria lançar o mecenato de apoio à escolaridade básica e secundária (pelo menos foi o que me explicaram...) mas mais parecia uma campanha denunciando os possíveis efeitos negativos do processo de Bolonha !

Agora é a campanha de divulgação do programa "Novas Oportunidades" que, contrariamente à que referi acima, tem sido amplamente criticada. Claro que algumas críticas são absurdas, mas outras, mais substantivas, são certamente pertinentes.

Retenho duas :

a) Falta de clareza : vistos de longe (como o devem ser) os cartazes parecem transmitir uma mensagem contrária à pretendida. Maria Gambina com uma tesoura nas mãos e a frase "Esta é a Maria Gambina que não terminou os estudos" parece querer dizer "A Maria Gambina que não terminou os estudos afinal é uma estilista de sucesso...) Idem para a Judite de Sousa e possivelmente para os outros...

b) Conceitos ultrapassados e contraditórios: afinal, aquelas imagens representam a "Maria Gambina que seria costureira se não tivesse acabado os estudos" e a "Judite de Sousa que seria empregada numa loja de videos se..."etc implicando uma desvalorização das aprendizagens não formais que o programa Novas Oportunidades quer ver reconhecidas e uma desvalorização dos bons profissionais a quem os estudos na maioria das vezes ajudaram e... às vezes não. (De Maria Elisa a Saramago muitos são os exemplos de bons profissionais que não "acabaram os estudos").

b) Concepção errada do que é (deve ser) a Educação de Adultos, o programa Novas Oportunidades, os Centros RVCC : o que deve ser promovido é o desejo e a possibilidade de aprender em qualquer idade, o que deve ser promovido ainda é a valorização do saber e a existência de "oportunidades" (novas ou velhas...) que permitam a concretização daquele desejo. O reconhecimento de competências é um meio para motivar as pessoas para isso, para facilitar o seu reingresso no circuito das aprendizagens, para as reconciliar com o aprender. Não é um fim em si mesmo, como o também não é (não deve ser) a obtenção de um diploma, nem a melhoria das estatísticas da escolaridade em Portugal, nem o sucesso a todo o custo.

O que é preciso promover em Portugal é o desejo de aprender e de bem fazer.

Maria Emília Brederode Santos

Comments:
Completamente de acordo!

Como se a profissão de costureira e afins não fossem importantes!

Que raio de país este! Que raio de mentalidades estas!
 
Um comentário muito bom.Espero que não tenha terminado os estudos.Eu ainda não terminei os meus e já vou nos sessenta...
 
Em qualquer idade...
estudar é mesmo natural!...
 
Enviar um comentário

<< Home