Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

26.3.08
 

Indiferença social face às crianças e às famílias da Granja
O casamento adiado do Ricardo Carolino

Hoje, era o dia do casamento do Ricardo Carolino, jovem de etnia cigana que conheci como aluno do 9º ano na EB2,3 de Vialonga, no ano passado.
Escrevi sobre ele neste blog, há uns meses. Tinha completado com sucesso o 9º ano e, apesar dos apelos da escola para que frequentasse um curso profissional, tinha abandonado os estudos para ir fazer a feira. O pai já lhe tinha construído uma barraca onde iria viver com a prometida, uma prima direita, após o casamento. Havia então uma ameaça de demolição das barracas da Granja onde vive a família Carolino e várias outras famílias das quais fazem parte mais de cinquenta crianças.
A demolição punha em causa os projectos de integração escolar em curso, organizados para combater o absentismo e insucesso escolar . Foram movidos da parte da presidente do agrupamento de escolas de Vialonga vários esforços para serem encontradas soluções que garantissem a estabilidade das famílias e a continuidade das crianças nos projectos educativos que frequentavam. Mobilizaram-se autarquia, a escola e vários outros serviços daquele território. As famílias do bairro cigano da Granja descansaram então, certas de que haveria uma solução breve para o problema.
Às seis da manhã de hoje , foram surpreendidos com uma ordem para abandonarem as habitações, operação que seria levada a cabo pela GNR, por decisão do tribunal. Tudo se passou com uma relação de tranquilidade, entre os habitantes do bairro e as dezenas de agentes da GNR.
Foram transportados os haveres para um depósito tendo ficado todas as pessoas, incluindo as crianças, na rua, durante longas horas, ao frio e sem terem comido. Várias crianças estavam doentes.
Nem autarquia, nem segurança social...sucederam-se as horas sem que os habitantes soubessem se teriam um tecto para passar a noite. Nem uma palavra de solidariedade, nem um gesto para tornar o dia daquelas famílias e sobretudo daquelas crianças menos penoso.
As crianças tinham fome e frio? Ninguém parecia preocupar-se com o assunto.
Assistiu-se ao longo do dia a uma trágica ausência de responsabilidade social... ao lamentável jogo do empurra que tão tristemente marca a vida de muitas crianças deste país...em que se considera com demasiada frequência ser bom que a responsabilidade pertença a outros!
Ao longo do dia a escola era a única entidade presente naquele triste espectáculo de demolição, em que a plateia triste dos habitantes do bairro, tinha como companhia a GNR e os seus cães.
Só alguns habitantes de moradias próximas, chocados com o que se passava, foram passando por lá.
A mediação entre as famílias e as instâncias que poderiam resolver o problema foi sendo realizada pela presidente da EB2,3 de Vialonga, Armandina Soares.
Já à tarde soube-se então que a Segurança Social iria alojar aqueles que o pretendessem numa pensão em Lisboa....até ser encontrada uma solução. As crianças seriam transportadas para Vialonga todos os dias, para frequentarem a escola.

O casamento do Ricardo ficou a aguardar melhores dias.

26-03-08
Ana Maria Bettencourt

Comments:
Onde estava a Câmara Municipal?
Como queremos que se acredite nos(as) políticos(as)?
Que triste!
Como fazer a formação cívica dos jovens com estes espectáculos?
 
Abaixo a indiferença!
 
Enviar um comentário

<< Home