Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

27.10.08
 

Diário da Finlândia - dia II

Organização e Tranquilidade


O primeiro contacto

Poucos minutos antes das 10.00 horas chegámos à escola.
Um segurança silencioso conduz-nos à sala dos professores. Um professora entrega-nos um jornal finlandês, tece alguns comentários sobre as eleições municipais que tiveram lugar ontem e pede-nos que aguardemos um pouco pela Directora, que estava a terminar uma aula de Matemática, e que chega às 10.00 - tal como estava previsto - e nos prepara para a realidade que vamos conhecer.

A escola, do 1º ao 6º ano de escolaridade, tem 260 alunos, entre os 7 e os 13 anos de idade e 19 professores: 11 são responsáveis, em regime de quase monodocência, pelo conjunto das aprendizagens. Os outros 8 distribuem-se da seguinte forma: 2 são professores de Inglês, 2 de educação especial e 4 de finlandês língua não materna.
O seu trabalho é apoiado por assistentes que estão presentes nas turmas com alunos com necessidades educativas especiais e imigrantes.
As turmas podem ter até 29 alunos mas se tiverem crianças com necessidades educativas especiais ou imigrantes as aulas não têm mais de 20 alunos.
A actividade lectiva ocupa 20 a 26 horas de trabalho por semana, conforme o ano de escolaridade.

Soluções para o sucesso

Ouvimos que a Escola é apoiada, semanalmente, por técnicos diferenciados – psicólogos, técnicos de serviço social, enfermeiros.
Um Centro de Formação em Educação Especial apoia os professores na solução dos casos mais difíceis.
Os alunos identificados no Pré-Escolar com maiores dificuldades de aprendizagem têm um ano Pré preparatório que faz a transição para o 1º ano de escolaridade.
Os alunos oriundos de outros países, e em início de escolaridade, beneficiam de um trabalho prévio, em pequeno grupo, realizado por um professor de Finlandês apoiado por um assistente.

A autonomia

A escola tem grande autonomia face ao Ministério da Educação – muito distante, no dizer da Directora - e que define as grandes linhas de política educativa - e à municipalidade de Helsínquia, onde existe um departamento de educação que fixa o orçamento das escolas segundo alguns critérios, designadamente o número de alunos em geral, o nº de alunos com NEE e o número de alunos imigrantes.
A escola tem uma percentagem do orçamento muito significativa – entre sessenta e setenta mil Euros/ano - para a aquisição de livros e outros materiais, organização de visitas de estudo, conhecimento da natureza, acampamentos, iniciativas culturais como cinema, etc.
Presente no discurso uma grande preocupação com a integração das crianças. Uma atenção que se traduz num grande enquadramento e num conhecimento profundo de todos os alunos.


Uma diferente concepção do espaço escolar

O que mais impressiona na visita à escola é a concepção de espaço.
Amplos corredores, com cabides para mochilas, casacos e sapatos, desaguam em recantos com um sofá, uma planta que convidam a um tempo de leitura.
Finalmente, as salas de aula. Habituadas a espaços frios, ocupados por mesas, cadeiras alinhadas em frente do professor e um quadro, entramos agora em espaços de trabalho.
Tudo está lá, devidamente organizado. O materiais necessários à realização das tarefas, as produções dos alunos expostos nas paredes, bibliotecas de sala de aula, mediatecas.
E os armários onde tudo fica acessível e organizado, tendo cada aluno a sua gaveta para guardar os seus materiais.
Afixadas na parede 5 regras em frases curtas. Parecem ser suficientes para criar um clima de grande tranquilidade e trabalho.

Prosseguimos a visita e o armazém de material escolar esmaga-nos. Tudo está lá: os cadernos, os lápis, os manuais escolares… todo o material escolar que é fornecido gratuitamente.

A biblioteca da escola em espaço amplo e bem equipado divide a sua missão: durante o tempo escolar serve os alunos; no período da tarde está aberta à Comunidade.

Trabalho autónomo

A organização das salas de aula tem a marca de uma pedagogia activa, caracterizada pela diferenciação pedagógica, pela responsabilidade de alunos e professores pelas aprendizagens.

Entramos numa sala de aula em que os alunos de 6º ano estudam matemática com a professora que os acompanhou ao longo dos últimos seis anos e que nos diz ver com tristeza o fim do trabalho em comum daquele grupo.
Em Portugal em situação idêntica os alunos teriam já sete a 10 professores no mínimo. Aqui a professora é responsável por quase todas as disciplinas com excepção da ginástica para os rapazes, as línguas e a música.

Os alunos estudam de modo independente, em silêncio, imperturbáveis com a nossa chegada. De tempos a tempos um dos alunos levanta-se para corrigir os exercícios que acabou de fazer com recurso a fichas de auto-correcção. A professora vai dando atenção a outros alunos.
Os exercícios não são iguais para todos, havendo uma diferenciação em função da evolução dos alunos. A professora diz-nos que é possível os alunos trabalharem em matérias diferentes ao mesmo tempo cabendo-lhe, a si, a organização do trabalho.

Preocupação com a integração

A preocupação com a integração marca o discurso e as actividades que pudemos observar.
Na escola ressalta a multiculturalidade da população escolar: cerca de 20% dos alunos são originários da imigração. Visitámos uma “classe preparatória” constituída por um grupo de alunos que estavam a ser iniciados na língua finlandesa e na escolaridade, afim de poderem integrar com sucesso a escola primária. Uma professora e uma assistente desenvolviam actividades com eles.
Em quase todas as classes estavam assistentes a apoiarem os professores.
Um grande enquadramento dos alunos favorece o clima de tranquilidade. No refeitório, que os alunos frequentam em horários desfasados, estão sempre acompanhados por professores. Um “detector “ de ruído assinala com uma luz encarnada quando há barulho a mais no refeitório.

Percebemos o que significa a orientação “intervenção ao primeiro sinal de dificuldade” de que fala a OCDE e que se manifesta no sucesso das aprendizagens nesta Escola: em 2006/2007, apenas três alunos não tiveram sucesso; em 2007/2008, o número desceu para um.
Ana Maria Bettencourt, Maria Armandina Soares, Maria Emília Brederode Santos

Comments:
Qual a língua materna dos professores de inglês?
Qual a origem dos imigrantes?
Qual o horário dos professores e suas tarefas?
Fala-se muito de avaliação?
Leitor atento e interessado.
 
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