Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

14.11.08
 

O País do “NIM”?
“Facilitismo” ou “Exigência intolerável”?
O Estatuto do Aluno dos Ensinos Básico e Secundário (Lei 3/2008), estabelece, entre outras matérias, que:
• os alunos devem recuperar os saberes perdidos nas suas ausências, sejam elas justificadas ou injustificadas.
Não me parece haver nada de preocupante aqui: compete às escolas criar condições para que todos os alunos aprendam.
• as medidas a adoptar devem ser estabelecidas no Regulamento Interno de cada uma das escolas
Também aqui continuo tranquila: defendo a progressiva Autonomia das Escolas e o Regulamento Interno é um instrumento que há 8 anos cumpre esta missão – com base na legislação definir formas contextualizadas de intervenção.
No entanto este Estatuto do Aluno provocou enorme controvérsia na Assembleia da República e na Opinião pública, centrando-se a tónica no princípio do FACILITISMO.
Podemos ler, em “Salteadores da Arca” – 3 de Julho 2008:

A maioria socialista aprovou , com os votos contra de toda a oposição, o novo Estatuto do Aluno, que permite que os estudantes passem de ano sem frequentar as aulas, desde que sejam aprovados nas provas de recuperação, noticia a Lusa.
A proposta dos deputados do PS mantém a possibilidade de um aluno transitar de ano sem comparecer nas aulas, desde que obtenha aprovação na prova de recuperação, não sendo definido qualquer limite para o número de testes a que pode ser sujeito.
«Cuidado do PS em facilitar a vida aos alunos faltosos»
Para o PSD, que hoje propôs que um aluno fique automaticamente na situação de retenção ou exclusão caso volte a faltar injustificadamente depois de realizar a prova, esta medida defendida pela maioria transmite «uma mensagem muito negativa» aos estudantes.
«Há um grande cuidado do PS em facilitar a vida aos alunos faltosos, mas fica completamente esquecida qualquer mensagem aos alunos cumpridores, que agora não têm qualquer estímulo», acusou o deputado social-democrata Emídio Guerreiro.
A crítica foi partilhada pelas restantes bancadas da oposição, que acusam o Governo e a maioria parlamentar de «menosprezar o valor da assiduidade» e «mascarar as estatísticas» do abandono escolar.
«Agora o aluno vai poder faltar o que quiser e não pôr os pés nas aulas, desde que vá passando nas provas de recuperação a que for sendo sujeito, o que põe em causa o princípio fundamental da avaliação contínua», criticou igualmente João Oliveira, do PCP.

O mesmo princípio de “facilitismo” expresso pelo Arouca.Biz (13 de Nov 2007)
O que estão a fazer no sistema educativo é tão ridículo e despropositado que me faltam adjectivos para o qualificar mas talvez "facilitismo" e "balda" se adequem. Os professores são fortemente incentivados a um "laissez faire, laissez passer" porque toda a legislação saída nos últimos tempos encurrala-os de tal forma que vai levar quase inevitavelmente a este tipo de atitude para que o objectivo do governo se concretize, ou seja, boas taxas de "sucesso" escolar. Sucesso?!! criar ineptos? ignorantes? é essa a função da escola? Como se não bastasse ter que passar alunos a todo o transe e agora isto. (estatuto do aluno – 007 ordem para nada fazer, há 1 Ano)
Mas subitamente, tudo se baralha e contra o “facilitismo?” se insurgem os alunos: contra regime de faltas (5. Nov.2008)


Cerca de 1500 estudantes do Secundário manifestaram-se em Lisboa contra o regime de faltas estabelecido pelo Estatuto do Aluno. Estes estudantes querem entregar um conjunto de reivindicações ao Ministério da Educação.
(Lusa – Manifestação de estudantes em Lisboa contra o regime de faltas)

Temos assim, duas posições antagónicas: à ideia do facilitismo de que este Estatuto tem sido acusado, opõe-se, agora, a “revolta” dos estudantes contra as exigências de que, na sua opinião, estão a ser vítimas.

“Democracia” ou “Turbamulta”?
E como é que esta “revolta” juvenil se manifesta?
O movimento estudantil não pára de crescer. Têm ocorrido incidentes um pouco por todo o lado. Esta tarde, a luta dos estudantes contra a política educativa do Governo e, em particular, contra o Estatuto do Aluno, teve o seu epicentro na Escola Secundária D. Dinis, em Lisboa. Os dois secretários de estado, Valter Lemos e Jorge Pedreira, foram mal recebidos pelos alunos que atiraram ovos e tomates contra os carros onde seguiam Valter Lemos e Jorge Pedreira e contra os carros onde seguiam Valter Lemos e Jorge Pedreira e contra as paredes da sala onde os dois governantes estavam reunidos com duas centenas de PCEs. (Luta Social, 13.11.2008)
Comentários do mesmo jaez vão surgindo. E o sorriso de professoras que, surpreendentemente, no meio dos jovens “em luta” e com as paredes da escola cheias de restos de ovos, afirmam que estes alunos são muito bem comportados.
Fico estupefacta. Será que tenho andado enganada sobre o significado de “Democracia”, “Formação Cívica” e, por que não?, “Respeito”?
Será que estamos preparados, nós, professores, para sermos os alvos seguintes de toda esta revolta juvenil?
Maria Armandina Soares

Comments:
As questão que se me põem: que tipo de avaliação foi feita ao regime de assiduidade dos alunos em vigência até há um ano e que conclusões daí se extraíram? Qual a percentagem de alunos que estava a ser excluída ou retida por excesso de faltas injustificadas? Qual a percentagem de alunos retidos por terem faltado, justificadamente, meia dúzia de vezes por período?
Só as respostas a estas questões permitiriam perceber e explicar a necessidade e a bondade das alterações introduzidas na revisão do estatuto do aluno. Sem isso, a lei é cega, torna-se irracional e é lida como sinal de desconfiança, por parte da tutela, do empenho dos professores relativamente à questão da assiduidade dos seus alunos. Por outro lado, as medidas que, em geral, estão a ser regulamentadas, tornar-se-ão esteriotipadas e rotineiras, sem qualquer valor acrescentado. É um faz de conta, para cumprir a lei.
É imperioso combater o abandono escolar irresponsável e a irresponsabilidade de algumas famílias. Mas não é com diarreia legislativa, em que se incluem os R.I., que servem só para justificar as medidas sancionatórias, com o argumento de que se cumpre a lei e descansar as consciências legalistas.
É com trabalho pedagógico, liderado pelas direcções das escolas e associações de pais, e acompanhado por equipas de apoio às famílias, em casos mais problemáticos. Trabalho paciente, moroso (as estatísticas terão que esperar um bocado), mas o único consistente e capaz de gerar mudanças positivas. Além disso,
poupava-se em papel, em horas de discussões bizantinas (time is money) e criavam-se alguns postos de trabalho útil.
O diálogo é sempre preferível à lei.
Maria Neves
 
Maria Neves

Concordo com o seu comentário, que agradeço.
Mas devolvo-lhe outra questão:entendo a medida no quadro da responsabilização das escola (que aceito) pela aprendizagem dos seus alunos.
Então, para mim, faz sentido pensar que, se o aluno esteve ausente, não aprendeu.
Devem, então, os professores, com bom senso, acordar um plano de trabalho que possa remediar esta situação.
Armandina Soares
 
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