Inquietações Pedagógicas

"Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso…"  Jorge de Sena in Metamorfoses

30.11.05
 
Jornal de Letras e a Autonomia
Como já devem ter reparado saiu, na passada 4ª feira, o Jornal de Letras com a página mensal das Inquietações Pedagógicas. No caso, as páginas 7 e 8. O tema é "A autonomia das escolas" e a coordenação foi feita pela Berta Macedo. Escreveram o João Barroso (já aqui publicado no blog), a Mariana Dias (também já publicada no nosso blog) e a Luisa Homem com um artigo sobre a autonomia "Na educação pré-escolar".

Na página seguinte saiu um artigo da Beatriz Bettencourt, intitulado "Gerir o Tempo", que apresenta uma análise comparativa, a partir do "Education at a Glance", Eurydice, 2005, da forma como são geridos os tempos de trabalho escolar, dentro e fora da escola, e mais especificamente ainda os tempos de trabalho dos professores, em vários países da União Europeia. Um tema da maior actualidade, como sabemos.

Mas o tema da "Autonomia" foi também objecto da Conferência anual da Gulbenkian sobre Educação. O Prof. Neves Adelino , professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa, foi o Comissário da Conferência que, durante dois dias (ontem e hoje), reuniu cerca de 400 pessoas num debate sobre a autonomia das escolas que teve, entre vários motivos de interesse, como principal originalidade o olhar da gestão organizacional sobre a escola e a defesa dos "3 pés do mesmo banco" : autonomia, avaliação e incentivos...

Maria Emília Brederode Santos

29.11.05
 
Autonomia das escolas: um projecto indefinidamente adiado?*
Em Portugal, a administração da educação tem-se concretizado no quadro de um sistema centralizado e hiper-regulamentado. Enquanto serviços periféricos do Estado, as escolas Portuguesas nunca possuíram verdadeiramente direcção própria, sendo dirigidas pelos serviços centrais, através de despachos, circulares e legislação similar. Mesmo após a transição democrática, o conceito de comunidade escolar manteve-se circunscrito aos elementos sujeitos ao poder disciplinador do Estado: professores, funcionários, alunos. Esta tradição começou a ser quebrada em meados da década de 80, quando o Estado começou a defender a participação da sociedade civil na resolução dos problemas educativos e a introduzir alguns mecanismos de microregulação das escolas. Apesar da mudança discursiva, a “reforma educativa “ apenas se traduziu numa tímida desconcentração de serviços, como se pode comprovar pelo carácter minimalista das competências atribuídas às direcções regionais de educação (1987) e às escolas preparatórias e secundárias (1989).
Mais recentemente a publicação do dec-lei nº115-A/ 98 parecia vir trazer um novo fôlego à questão da “autonomia das escolas”. No entanto, decorrida quase uma década sobre a publicação da referida legislação, praticamente tudo o que é essencial continua por resolver:
- a natureza das competências a contratualizar com as escolas
- a contradição entre o modelo de direcção e gestão centrado em projectos e equipas organizacionais e o sistema de colocação de professores (nacional , regional)
- a diversidade das lógicas que estão presentes no acesso às funções de gestão escolar (legitimidade democrática , legitimidade profissional e saber de “experiência feito”)
- a incoerência entre os padrões de mobilidade docente existentes em Portugal e o
desígnio de gestão estratégica e participadas das organizações
- a ausência de processos de regulação da educação que assegurem a equidade num quadro de diversidade organizacional.
Apesar destas indefinições, as escolas cumpriram ordeiramente as tarefas que lhe foram cometidas: elaboraram regulamentos e projectos educativos, organizaram actos eleitorais; atravessaram sucessivos desafios identitários (foram “escolas dos trezentos”, , associações de escolas, agrupamentos). Com tanta agitação poucas instituições tiveram tempo de se aperceber que autonomia significa capacidade de produzir norma própria.
Nada disto seria preocupante se a transição para a sociedade do conhecimento pudesse efectivar-se sem mudança de paradigma gestionário. Não me parece, no entanto, que exista “choque tecnológico” capaz de fazer florescer uma cultura de aprendizagem, responsabilidade e cidadania activa no quadro de um “Estado educador”. Não creio , igualmente , que uma sociedade democrática se possa construir tendo como base uma concepção profundamente instrumental e retórica da autonomia das escolas.

Mariana Dias

* Publicado no Jornal de Letras - Educação de 23 de Novembro de 2005

25.11.05
 
Ainda o Prós e Contras
Tal como a Mª Emília também senti a mesma falta de substância e de realidade no último debate sobre educação...Apesar de todos concordarem que o centro da educação era a escola (eu sempre pensei que era o aluno, mas, claro, isso depende da perspectiva em que nos colocamos...) só se falou de problemas de professores: as aulas de substituição, os concursos, as novas regras para os horários dos professores, as negociações com os sindicatos, etc. E tudo de modo excessivamente abstracto, sem nenhum exemplo concreto das tais actividades de substituição, da maneira como se deseja que a escola seja mais responsável pela aprendizagem dos seus alunos, do acompanhamento que é preciso fazer do percurso escolar de cada um. Talvez também aquela ideia de ter chamado para o debate uma professora aposentada e um ex-ministro que deixou ao abandono as escolas tenha contribuído ainda mais para a sensação de que nunca se fala do que realmente é importante em educação, ou seja, como garantir a cada criança ou jovem as melhores condições de aprendizagem, de como fazer das escolas instituições abertas, com capacidade de reflectirem sobre o seu próprio desempenho, com práticas de prestação de contas que rompam com o isolamento a que as políticas erráticas de educação as têm relegado. E, convenhamos, que a autonomia não pode ser aquele "manto diáfano da fantasia". Enfim, tantas coisas que valia a pena debater...

Teresa Gaspar

24.11.05
 
Autonomia das escolas: entre a ficção e a realidade*
“Quem dá e tira ao inferno gira!” “De boas intenções está o inferno cheio!” “Quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é tolo, ou não sabe da arte!”.

Se a sabedoria popular fala verdade, os ministros da Educação e os dirigentes da sua administração, não são tolos, sabem da arte e vão direitinhos para o inferno!
Esta é a conclusão a que se pode chegar quando se analisa, por exemplo, a retórica discursiva que recorrentemente, hoje, como no passado, apregoa os méritos da autonomia das escolas, ao mesmo tempo que tudo faz para aumentar o controlo sobre as suas decisões.
Como escrevia, num texto recente (publicado em 2004, no vol. 17, nº 2 da Revista Portuguesa de Educação da Universidade do Minho), a autonomia das escolas tem sido apresentada, em Portugal e em outros países, como “uma ficção necessária”, mas, em muitos casos, não passou de uma “mistificação” legal, mais para “legitimar”os objectivos de controlo por parte do governo e da sua administração, do que para “libertar” as escolas e promover a capacidade de decisão dos seus órgãos de gestão.
Importa sublinhar que esta situação não resulta de qualquer perversidade endémica aos sucessivos titulares da pasta da Educação, mas faz parte de uma estratégia política mais global de recomposição do poder, por parte de um Estado em perda de autoridade, em busca de legitimidade e em processo de modernização.
Neste contexto, as medidas de “reforço da autonomia das escolas” podem assumir diferentes objectivos e modalidades de concretização, em função de diferentes perspectivas políticas. Se repararmos no que se passa em muitos países, neste domínio, verificamos que predomina (por convicção ou contaminação) uma política híbrida e aparentemente contraditória que consiste em: esconder atrás do discurso da mudança (contra a burocracia e o centralismo), uma política conservadora (“é preciso mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma”); esconder atrás do discurso da modernização (pela qualidade e pela eficácia), uma política neo-liberal (é preciso “aliviar” o Estado para acabar com o Estado).
Ora, como nos tempos que correm e segundo nos dizem, “mudar é uma fatalidade” e “modernizar é o nosso destino”, logo se vê o que aconteceu à pobre “autonomia”!
Importa lembrar, porém, como venho fazendo há mais de dez anos, que nestas coisas da autonomia das escolas “há mais vida”, além do Estado e do mercado e que a alternativa não se resume a ter que escolher entre a ineficácia (da burocracia estatal), ou a injustiça (da livre concorrência mercantil). As propostas que, em 1996, fiz num estudo encomendado pelo então ministro Marçal Grilo, demarcavam-se claramente dessa falsa dicotomia. Estas propostas fundamentavam-se num conjunto de pressupostos e princípios que visavam promover e apoiar uma “uma autonomia construída” pelos próprios actores e que tinham na “contratualização” um instrumento central para a sua concretização. Como se sabe, no processo de decisão que se seguiu, para imposição de uma “autonomia decretada”, os “princípios” perderam-se e os contratos ficaram “a fazer de conta”. O que resta hoje (7 ministros e 7 anos depois) é uma manta de retalhos, ainda por cima curta, que ora destapa a cara, ora os pés dos problemas que pretende esconder.
Agora que os governantes já não falam em “dar” autonomia às escolas, é talvez chegada a altura de as escolas a exigirem e a construírem.


João Barroso
Universidade de Lisboa

*Publicado no Jornal de Letras - Educação - 23 de Novembro de 2005

22.11.05
 
Poderá ser, finalmente, permitido proibir em matéria de praxes ?
Poderá ser, finalmente, permitido proibir em matéria de praxes?

O tribunal de Santarém decidiu levar a julgamento seis dos sete arguidos num processo de violência exercida sobre uma aluna durante a praxe..
Também o ministro Mariano Gago se manifestou recentemente indignado com um outro caso ocorrido em Bragança.
São boas notícias.

As situações de violência, em matéria de praxe, são inaceitáveis e são quase sempre um sinal de cretinice da parte de quem as pratica.
Porque considero que uma das missões de um professor é educar para a cidadania, durante anos lutei na escola em que sou professora contra a praxe, trabalhei com os meus alunos textos que saíam ciclicamente nos jornais, propus por exemplo a análise de práticas rituais frequentes. Reflectimos sobre o que significavam certas posturas de subserviência, em que os alunos se deslocam como animais, ou são acorrentados como escravos, mesmo que seja com latas de coca-cola amarradas aos pés......
Enquanto estive no Conselho Directivo a nossa equipa afixava à entrada da escola um cartaz que dizia : “Os alunos têm o direito de não ser praxados”. Apesar disso havia sempre inúmeras formas de coacção. Alguns colegas meus consideravam que eu exagerava, que se tratava de umas graças inocentes, que não havia mal nisso e que “não me ficava bem” interferir.... Confesso que nunca me conformei ao ver os alunos e as alunas a fazerem os papéis mais ridículos que é possível imaginar.
Conseguimos que as praxes fossem menos violentas, mas considero que a praxe é quase sempre uma violência, uma privação de liberdade e um atentado aos Direitos Humanos. Nunca entendi alguns amigos que tenho, acérrimos defensores dos Direitos Humanos, mas que acham que a praxe é um direito.......faz parte da vida académica. Por mim sou contra os tabus e acho que não nos devemos calar.
Uma jovem dizia-me outro dia que, ao fim de uma semana de praxe, tinha enormes dores nas costas por ter tido que rastejar, e que, além disso, se sentia muito violentada por ter tido que repetir frases e palavrões que nunca havia dito em toda a sua vida....
É um triste começo de vida universitária...que bom seria estes estudantes serem acolhidos em ambiente de festa e também de cultura, por quem os ajudasse a integrar.
Em França existe uma lei que proíbe a praxe. Eu acho bem.

Ana Maria Bettencourt

 
Prós e Contras
Dum modo geral - e sobretudo nas intervenções do ex-Ministro David Justino - senti uma falta de noção quer da substância das coisas, quer da realidade. Que dizer da sua convicção sobre a distância entre o que idealizou e o que concretizou atribuida sempre a uma falha qualquer da realidade e não aos erros de uma concepção que não teve em conta essa realidade ? Que dizer da "confissão" de a tão defendida "profissionalização da gestão das escolas" não passar pela contratação de gestores profissionais por "não haver dinheiro para isso"(Ah, afinal os professores sempre são um recurso barato...) ? Que dizer da sua convicção de ser um bom gestor por ter tido cargos de gestão na Universidade ?

Que dizer também da admissão, por parte da Sra. Ministra, de que a rapidez de execução das suas medidas teve mais a ver com a duração do mandato governamental do que com o tempo necessário às escolas para se organizarem ?

Que dizer da forma como a moderadora opina superficialmente sobre as despesas educativas ?

Maria Emília Brederode Santos

21.11.05
 
"Ninguém nos ouve"
Já que estou em maré de aniversários, deixem-me que vos conte que hoje se celebrou o 16º Aniversário da Convenção sobre os Direitos da Criança.

Foi uma iniciativa do Comité Português para a UNICEF e da Câmara Municipal de Sintra e consistiu num Plenário de Crianças de 5 instituições particulares de solidariedade social (IPSS) do concelho - Casa Seis, SOlami, Associação Juvenil Ponte, Centro de Bem Estar Social de Queluz e Creche Sempre em Flor - parceiras de um programa intitulado Cidadania, Direitos e Responsabilidades das Crianças.

Nesse Plenário as crianças dirigiam perguntas à Directora Executiva do Comité Português da Unicef Madalena Marçal Grilo, ao vereador Lacerda Tavares, ao Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas Rui Marques, à representante da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens Vera Figueiredo e a mim, do Conselho Nacional de Educação.

As perguntas que me foram dirigidas vinham da Associação Juvenil Ponte e foram as seguintes :

- "Por que é que há professores que ralham e gritam por tudo e por nada ?"

- "Por que é que na escola decidem, por ex. sobre as regras da sala de aula, ou do recreio e outros espaços, sem nos ouvirem ?"

À 2ª pergunta gostei de responder mas com a 1ª vi-me aflita. Que é que vocês, leitores amigos, diriam às crianças ?

Maria Emília Brederode Santos

 
Jogo de Cores em LGP
Foi também lançado, no Dia Nacional da LGP, um jogo interactivo em LGP, concebido por Francisco Vaz da Silva que o apresentou salientando os 3 eixos em que assenta :

a) um estudo dos materiais tipo jogo multimedia já existentes;

b) dados empíricos de observação em salas das UNidades de Apoio à Educação de Alunos Surdos;

c) princípios de aprendizagem social - isto é, se os comportamentos sociais são aprendidos (por ex. os comportamentos violentos como os comportamentos pró-sociais) então deverão ser criadas oportunidades de modelagem de interacções sociais adequadas, de reflexão sobre essas situações e de reforço destes comportamentos positivos.

A programação esteve a cargo de Carlos Mendes e Luis Godinho e a produção e realização dos mesmos dos restantes materiais.

Este jogo, como o video, o DVD e os livros (editados pela Porto Ed.) serão oferecidos às Unidades de Apoio à Educação de Crianças Surdas das escolas de 1º ciclo. O serviço de Educação Especial da DGIDC espera poder depois fazer uma reedição que possa ser vendida a quem desejar comprar estes materiais.

Maria Emília Brederode Santos

 
LGP - III
Ora estes materiais agora publicados são a concretização desse direito, são um meio para as crianças surdas verem reconhecida a sua 1ª língua com igual dignidade às línguas faladas e com idênticas possibilidades narrativas e constituem um instrumento de aprendizagem dessa sua língua que, como qualquer outra verdadeira língua, requer aprendizagem e um contexto facilitador dessa aprendizagem.

E porque se trata de jogos e de histórias - e porque estão bem feitos - permitem uma aprendizagem com prazer. Hoje fala-se muito na necessidade de esforço para aprender e de se ensinar aos meninos que a aprendizagem requer esforço. Mas os meninos surdos não precisam desse ensinamento. Para eles aprender através da oralidade é um esforço imenso, extenuante, esgotante. Por isso saúdo com imenso agrado estes materiais que possibilitam uma aprendizagem com prazer.

A produtora Mª João Reis sublinhou o trabalho de equipa que o video e o DVD envolveram. E realmente nota-se que houve uma orientação pedagógica que atravessou toda a produção e que houve uma articulação com os técnicos que permitiu por exemplo que as narrações nas três linguagens (narração em off em língua oral; narração in em língua gestual e narração através das ilustrações), sem serem traduções umas das outras, se conjugassem e não entrassem em conflito; que a iluminação e o ângulo de focagem das câmaras fossem os adequados à visibilidade dos gestos e das expressões faciais. Por outro lado, e conhecendo as dificuldades financeiras destas produções, foi preciso muita imaginação e boa vontade para o humor e a adequação dos guarda-roupas dos narradores aos conteúdos das histórias.

Finalmente, cada história tem o seu formato (a 1ª tem a narradora contra o fundo de ilustrações desenhadas; a 2ª tem a narradora contra um fundo de imagem real em movimento; e a 3ª tem um narrador num contexto de imagem real seguido de algumas cenas em movimento) . Para além da adequação das histórias e seus formatos a diferentes idades das crianças destinatárias como explicou uma das responsáveis (Co-autora do guião e directora da narração em LGP) Helena Carmo, creio ver nesses diferentes formatos um experimentalismo que gostaria de ver continuado nas escolas. E que as escolas com unidades de crianças surdas - a quem vai ser oferecido pela DGIDC um exemplar de cada material - informem o serviço de Ensino Especial da DGIDC sobre as formas da sua utilização com as crianças, reacções, efeitos, seguimentos e melhorias possíveis. Digamos que cada Unidade de Surdos deveria disp^or de uma "antena" de investigação.

Por mim gostava de sugerir às Dras. Filomena Pereira e Mª João Reis que nos próximos videos/CDs dessem mais destaque aos livros, que se visse, no início e talvez no fim, que a narradora está a ler um livro e que os livros contêm histórias, ou seja, que houvesse também uma preocupação em motivar as crianças surdas para a leitura. É uma sugestão. Mas acima de tudo quero registar as minhas felicitações por um bom trabalho, não só às responsáveis pedagógicas já nomeadas mas também aos técnicos, oriundos, aliás, do ex-IIE : ao realizador José Mendes e ao Câmara e Som Pedro Humberto Rodrigues(também responsável, com José Mendes, pelo Chroma-Key). Os parabéns vão também para os narradores em LGP Marisol Coelho, Ana Isabel Chavinha e Diogo Grilo, para a intérprete de LGP Alexandra Najmark, para a locutora Isabel Freitas Guimarães e para a adaptadora das ilustrações Raquel Pinheiro.

A assistência esteve muito animada e participativa. Ficou no ar uma pergunta da mãe de uma criança surda : para quando a introdução no currículo da Língua Gestual Portuguesa ? Por que é que os alunos quando chegam ao 7º ano de escolaridade não podem optar pela LGP (pelo menos os surdos) em vez de por uma 2ª língua estrangeira ? Pergunta pertinente, não é verdade ?

 
Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa II
Recordei o caminho percorrido desde que a Língua Gestual Portuguesa era proibida e sobrevivia clandestinamente até ao 25 de Abril quando uma nova cultura de respeito pela igual dignidade de todos os seres humanos e de reconhecimento do direito à diferença criou um clima propício à aceitação e promoção da LGP.

Símbolo dessa nova atitude foi o aparecimento do quadradinho no écran da televisão com a intérprete gestual traduzindo as notícias para os surdos. Mas a história do acesso dos surdos à informação da televisão é uma história de pequenos avanços e muitas interrupções : em 1980 a intérprete gestual foi mandada para casa esperar instruções... A LGP reapareceu, em 1990, nalguns segmentos da "Rua Sésamo" onde um menino surdo contava a outras crianças histórias que eram também traduzidas oralmente. A interpretação gestual reapareceu depois nalguns programas infantis e em 1995 nalguns programas de Informação e no Acontece. Em 2003, um protocolo entre o Estado e as 3 empresas de tv obriga a um certo nº de horas de interpretação gestual e de teletexto. Como dizia o Presidente da Associação Portuguesa de Surdos "Somos diferentes mas a tv é de todos".

Ora parece-me que apesar de tudo, de todas as insuficiências e insatisfações, apesar de paragens e recuos, tem havido, na Educação, um desenvolvimento continuado no reconhecimento da importância da LGPcomo 1ª língua das crianças surdas profundas.

Ou seja : a Educação e a Escola nem sempre estão atrás das outras instituições sociais, pelo contrário, muitas vezes desempenham até um papel pioneiro e uma maior persistência nas respostas encontradas.

Outra ideia importante é que, neste domínio como noutros em que estejam em causa a defesa dos direitos humanos e dos grupos e indivíduos mais desprotegidos, por muitos recuos e paragens que se verifiquem, há, apesar disso, um avanço claro, um progresso .

A Língua Gestual Portuguesa é hoje um direito consagrado na Constituição da República Portuguesa : no cap.III, sobre Direitos e Deveres Culturais, no art. 74 sobre o Ensino e o Direito ao Ensino e à Igualdade de Oportunidades de Acesso e de Êxito Escolar, o pto 2-h) diz que "incumbe ao Estado... proteger e valorizar a língua gestual portuguesa enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e de igualdade de oportunidades".

18.11.05
 
Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa - I
Dia 15 de Novembro celebrou-se, no Ministério da Educação, o Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa com o lançamento de um video e um DVD com três histórias tradicionais contadas em LGP e narradas em off e de um CD com um Jogo das Cores feito especialmente para crianças surdas.

Depois da apresentação dos materiais, feita pelos seus autores (cujos nomes constam da ficha técnica que será objecto de ou -tro post)e pela responsável do serviço de Ensino especial, Dra. Filomena Pereira, numa sessão presidida pelo Dr. Carlos Rodrigues, coube ao Professor Alexandre Castro Caldas e a mim mesma comentar esses materiais. Como são bons foi um gosto !

Pude recordar o caminho percorrido desde que as línguas gestuais eram línguas escondidas, clandestinas, mesmo proibidas (1880) até aos anos 60 nos EUA (com a publicação do estudo de William Stockoe demonstrando que as línguas gestuais dos surdos eram verdadeiras línguas, dotadas de dupla articulação), um pouco mais tarde na Europa e depois do 25 de Abril em Portugal.

Maria Emília Brederode Santos

16.11.05
 

Aprender ao Longo da Vida” – Nº 5

Acaba de ser publicado o número cinco da revista trimestral Aprender ao Longo da Vida, editado pela Associação "O Direito de Aprender".
Está à venda em todo o país, em bancas seleccionadas.
Mais informações no site: http://www.direitodeaprender.com.pt/

Neste número destacamos:

Entrevista com o Johan NorbecK
Johan Norbeck é sueco mas fala português fluentemente. Levou a ideia das “Folk School” à Tanzânia e a Moçambique. Hoje, se voltasse a Portugal (onde esteve entre 78/79), não viria missionar com base nas experiências de outros países. Preferia tornar-se membro de um grupo de portugueses para discutir situações e necessidades. Johan Norbeck que se considera, acima de tudo, um educador em desenvolvimento popular aborda igualmente nesta entrevista o conceito de “Círculo de Estudo”.

Entrevista com Carlos Alberto Torres
Carlos Alberto Torres é uma das autoridades mundiais em teoria sociológica aplicada à sociologia da educação. Nesta entrevista à “Aprender ao Longo da Vida”, chama a atenção para a importância dos movimentos sociais no futuro da educação de adultos e sobre a necessidade de saberem enfrentar a realidade que é a globalização do planeta.

Debate sobre o Ensino Recorrente
Para onde vai o ensino recorrente? Que problemas enfrenta? Qual é o seu público? Como se articula com os cursos de educação e formação de adultos (EFA) e os centros de reconhecimento, validação e certificação de competências (CRVCC)? A “Aprender ao Longo da Vida” organizou um debate sobre estas questões com especialistas e agentes no terreno: Manuela Malhoa da Escola da Escola Secundária Marquês de Pombal, Filomena Gonçalves da Escola Secundária Tomás Pelayo, Lisete Matos da Direcção Regional de Educação do Centro (Ministério da Educação) e Jorge Pinto da ESE de Setúbal

O dossier deste número debruça-se sobre o papel das Bibliotecas ao serviço das comunidades:
No trabalho que realizámos para elaborar este dossier, encontrámos, por todo o país, um movimento que repensa a utilização destes espaços, tendo em conta os novos meios (Internet), os novos públicos (jovens) e as novas estratégias (espaços de exposição). Mas as próprias bibliotecas também podem ser reinventadas.

Reportagens:
Uma Biblioteca para todos
Na Biblioteca Municipal de Oeiras, a maior das três geridas pelo concelho, entram em média 700 pessoas por dia. O seu objectivo pode ser consultar um dos 60 mil documentos colocados à disposição, navegar na Internet, ler jornais ou participar de alguma das suas actividades. Mas as actividades que a biblioteca desenvolve são fundamentais para estabelecer uma ligação com a comunidade. E essas actividades podem ir de reunir famílias para dormir dentro da biblioteca (Pijama às Letras), a convidar contadores profissionais a narrar histórias de tradição oral (Noites de Contos).

Centro de Recursos em Conhecimento do CENCAL - Uma referência na área da cerâmica
Criado em 1985 e dispondo desde logo de uma biblioteca tradicional, o CENCAL - Centro de Formação Profissional para a Indústria de Cerâmica das Caldas da Rainha decidiu, no ano lectivo de 98/99, concorrer à rede de CRC (centro de recursos em conhecimento). Desde então, além do seu já de si notável acervo bibliográfico, passou igualmente a dispor de outros suportes documentais na área das “TIC” e do audiovisual, tornando-se um local de frequência regular para formandos e público em geral.

Onde as aprendizagens são exigentes
Não é fácil, numa grande cidade como é Lisboa, gerir um novo conceito de biblioteca municipal e adaptá-lo às necessidades de cada realidade, de cada comunidade, de cada bairro. Visitámos duas das várias bibliotecas existentes em Lisboa; a biblioteca Orlando Ribeiro e a biblioteca Museu da República e Resistência. Elas são, cada uma à sua maneira, um caso particular, dependendo da realidade em que está implantada e dos meios que possui.

A biblioteca que deambula
A palavra Bibliambule é a junção de duas palavras: biblioteca e deambular. “Biblioteca é ela e deambular sou eu”, explica Margarida Guia, uma actriz francesa de 32 anos a viver habitualmente no Norte de França mas que visita Portugal pelo menos duas vezes por ano.
Ela puxa uma caixa com rodas que tem dentro livros e visita os lugares mais inesperados. Na rua, lê livros, oferece poesias. Não escolhe com quem interage, comunica com as pessoas que passam e a todas cativa.

Bibliotecas e Aprendizagem ao Longo da Vida –Universidades Abertas
O texto de José António Calixto, Director da Biblioteca Pública de Évora, dá um contributo fundamental para enquadrar as experiências aqui relatadas. Este artigo começa por falar da evolução das bibliotecas públicas em Portugal ao longo dos últimos dois séculos, para de seguida se centrar sobre os papéis das bibliotecas no apoio à aprendizagem ao longo da vida e as razões porque elas podem ser um recurso primordial para aqueles que nela se envolvem.

Mediateca da CGD: 10 anos de existência
Passaram 10 anos da inauguração da Mediateca da Caixa Geral de Depósitos que funciona no edifício sede em Lisboa, no espaço situado no piso –1, sobre a arcada semicircular que dá acesso ao edifício pela rua do Arco do Cego.

Reportagem
D–Learning - Aprendizagem democrática e educação cívica na Europa num processo de aprendizagem ao longo da vida
D-learning é a abreviatura de Democracy Learning. É um projecto de parceria de aprendizagem que visa o desenvolvimento de uma rede europeia de organizações e de instituições promotoras da aprendizagem democrática e da educação cívica em diferentes contextos.
Esta reportagem fala-nos da reunião que decorreu no mês de Abril em Lisboa com as diversas instituições de diferentes contextos geográficos que formam a parceria deste projecto.

E ainda os seguintes artigos:

Einstein e nós
Neste Ano Internacional da Física instituído pela Unesco e pelas Nações Unidas, a “Aprender ao Longo da Vida” pediu ao Professor do Instituto Superior Técnico, Jorge Dias de Deus que escrevesse um artigo sobre Einstein.
Foi há 100 anos que o trabalho de pesquisa de Albert Einstein contribuiu decisivamente para a descoberta das duas teorias que revolucionaram a física: a relatividade e a mecânica quântica. Como pessoa e como cidadão Einstein esteve muito perto do que se pede a todo aquele que segue pelos caminhos da educação ao longo da vida: foi confiante e solidário, foi um indivíduo e foi um cidadão.

A Educação de Adultos na bacia mediterrânica
Peter Mayo Professor da Universidade de Malta colabora com a nossa revista com este texto que nos fala das realidades na área da educação de adultos da bacia mediterrânica.
O Mediterrâneo é, sob muitos aspectos, um conceito “construído”. Há quem o defina de uma forma que reflecte uma concepção colonial e eurocêntrica do mundo. Outros constroem esta região de uma maneira diferente atribuindo-lhe características do que se pode chamar, de um modo geral, o “Sul”, termo que denota marginalidade, tendo este “Sul” sido historicamente tanto um parceiro como uma vítima da colonização ocidental.

A educação comunitária no processo de educação ao longo da vida: o método (auto)biográfico
Maria da Conceição Pinto Antunes da Universidade do Minho escreve um artigo que nos ajuda a compreender a importância do método autobiográfico na formação dos adultos e a relevância que adquire em projectos de intervenção educativa junto de populações mais desfavorecidas culturalmente.


E ainda:
Livros, Internet e Notícias

 
O Presidente da CONFAP e a Educação Sexual
É com profunda satisfação que, enquanto Presidente do Conselho Executivo da CONFAP, membro do Conselho Nacional de Educação e tendo tomado parte das reuniões do Grupo de Trabalho para a Educação Sexual, presididas pelo Professor Dr. Daniel Sampaio - CONFAP - Boletim 101

Ver » http://www.confap.pt/desenv_noticias.php?ntid=422

14.11.05
 
Balanço
Ao fim de alguns meses de acção da Ministra da Educação, útil se torna fazer
um balanço:
1) Componente não lectiva
- É uma ideia fundamental; o professor não apenas um proporcionador de
conhecimento na sala de aula, mas um agente educativo no espaço comunitário.
- O que é que foi mal feito: a Srª Ministra convocou os C. Executivos
das Escolas em Julho e disparou-lhes o projecto. Em Julho estavam os C.
Executivos assoberbados de trabalho com, entre outras coisas, os exames
nacionais do Básico e secundário. Os professores ou estavam a vigiar exames
ou estavam a corrigi-los. Não podia haver pior momento para se apresentar
uma tal mudança.
- Consequência: algumas escolas - poucas - criativamente absorveram a
ideia e criaram centros de apoio, clubes de ciência e de artes plásticas
etc, outras - muitas - ficaram-se pelas substituições e, pior, em muitas
escolas há professores sem fazer nada uma hora por dia.

2) Acumulações
- A Srª Ministra publicou uma portaria(814/2005) que restringiu o tempo
de acumulação para seis horas e restringiu ainda a acumulação diária para 6
horas. Na prática quase que acabou com as acumulações.
- É uma ideia que tem por trás um equívoco; quem acumula prejudica os
dois lados em que trabalha e rouba postos de trabalho.
- É falacioso: há professores que acumulam e têm uma excelente prestação
e há professores que não acumulam e são incompetentes, laxistas e
negligentes. Um professor procura um horário completo numa escola e não
algumas horas em várias escolas.
- O que é que correu mal: A Srª Ministra publicou esta Portaria em 13 de
Setembro, as aulas começaram, por imposição da própria ministra, em 12 de
Setembro e as escolas têm que contratar os professores, o mais tardar, até 1
de setembro - nesta data começa-se a preparar o ano lectivo.
- Consequência: muitas escolas tiveram que alterar os contratos dos
professores ou até rescindi-los e contratar, já com as aulas em
funcionamento, outros professores.Os maus professores continuam a sê-lo e os
bons também com ou sem acumulação.

O que há de comum nestes dois exemplos?
A Srª Ministra não fala com os agentes educativos antes de decidir e tem um
péssimo sentido de timing.

Se assim não fosse, teria tido a calma de, durante este ano lectivo,
apresentar o seu projecto de componente não lectiva e teria tido a dita de
ouvir sugestões úteis e as Escolas teriam tido tempo de estruturar os tempos
referidos em respostas úteis e realmente transformadoras da Escola.No
próximo ano lectivo concretizar-se-ia o projecto.

Se assim não fosse teria ouvido os agentes educativos falar-lhe da realidade
das acumulações; o bom desempenho dos professores não se consegue com
medidas napoleónicas, consegue-se, olhos nos olhos, com uma avaliação de
desempenho. E teria ouvido um qualquer consultor jurídico não
particularmente brilhante dizer-lhe o óbvio:a retroactividade objectiva da
Portaria 814/2005 é ilícita. Isso mesmo, ilícita e, como tal, susceptível de
impugnação o que é abrir um flanco que sempre fragiliza uma administração.

Não podemos continuar a oscilar entre estes dois desgraçados polos que têm
marcado a nossa História: diálogo permanente sem decisão ou decisionite
autista e arrogante. A primeira cria a deriva e o caos, a segunda uma ordem
inoperante e crispação social - no próximo dia 18 há greve de professores.

João Rangel de Lima

11.11.05
 
“Quand les citoyens construisent l’École”.
QUAND LES CITOYENS CONSTRUISENT L'ECOLE
Depuis plusieurs années le débat sur l'Ecole traite essentiellement de questions polémiques comme la baisse du niveau, l'effondrement de l'autorité des enseignants ou la démission des familles. Ces discussions mobilisent l'opinion, permettent l'expression de points de vue contradictoires qui suscitent la réflexion, mais ne font guère émerger de propositions constructives.

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7.11.05
 
A escola a tempo inteiro: as perspectivas de um grupo de professores do 1º ciclo (4)*
Um pequeno grupo de professores do 1º ciclo, inquirido sobre o que pensa da perspectiva da “escola a tempo inteiro” preconizada no programa do actual governo e iniciada este ano lectivo, revela-se bastante dividido quanto a esta matéria:

N=13
Favor 5
Contra 4
Indefinido 3
Céptico 1

Sendo-lhes pedido que clarificassem o seu posicionamento, dividem-se, apresentando os seguintes argumentos:
1. Possibilidades
Reconhecendo com clareza que se trata de “uma necessidade social das famílias”, podendo “reduzir os custos” das despesas com os filhos, consideram que, por um lado, esta medida permite o “acompanhamento e preenchimento útil do tempo das crianças mais carenciadas”, ou acompanhar alunos “com dificuldades específicas”, permitindo o “desenvolvimento de projectos com as crianças” e, mesmo, promovendo “hábitos de estudo nos alunos”. Por outro lado consideram que estas actividades podem proporcionar “um verdadeiro enriquecimento curricular”, por exemplo, dedicando “mais horas de trabalho às expressões artísticas”. Insistem, no entanto, que é importante que as actividades “os cativem” e que não tenham “estrutura demasiado formal”. Indicam ainda que a permanência de tempo extra dos professores nas escolas lhes permitirá um melhor “atendimento dos encarregados de educação”.

2. Dificuldades/Riscos

Alertam, no entanto, para dificuldades e riscos que se prendem com factores de ordem estrutural e organizativa. Alertam para a “ausência de espaços e de recursos”, que podem colocar em risco uma intenção generosa, correndo o risco de transformar as escolas em “armazéns de meninos” e estes, compelidos a passar “demasiado tempo” na escola, podem mesmo “ficar saturados” dela. O facto de se sugerir “trabalhar as expressões fora do horário lectivo”, apresenta o risco de “uma incidência nas áreas de cunho académico”. Alertam para o risco de se perder a monodocência e a dinâmica de “obrigatoriedade” poder desmotivar os professores.

3. Implementação da “escola a tempo inteiro”

Inquiridos sobre como implementar uma “escola a tempo inteiro”, afirmam que se devia separar o horário dos professores do horário de permanência dos alunos. Isto é, que devia recorrer-se a outros profissionais (animadores sócio-educacionais ou professores desempregados), não confundindo o tempo lectivo, com o tempo de complemento de horário.
O grupo inquirido considera que o ponto de partida para a sua organização deverá incidir no “levantamento das necessidades da população escolar” e, a partir daí, oferecer uma diversidade de actividades. Estas actividades poderiam ser o “apoio tutorizado a crianças com necessidades educativas especiais” ou “com dificuldades” e uma animação de tempos livres que se demarque claramente do tempo lectivo. Assim, sugerem a criação de “clubes” conforme os interesses das crianças: elaboração do jornal da escola; hora do conto com convite a escritores; descoberta de culturas e/ou línguas diferentes, com criação de dicionário de línguas ou de usos e costumes; clube de filosofia para crianças; criação de um grupo de teatro ou de uma oficina de informática; criação de uma ludoteca ou de uma oficina de culinária ou, então, actividades físicas como capoeira, natação, yoga, etc.
Consideram ainda que é importante ter em atenção a qualidade dos espaços físicos destinados a estas actividades.
Os professores apontam também para que, sempre que possível, se deve incentivar a participação das famílias, criando ateliers para pais, de modo a fomentar experiências diversas com os filhos, projectos, etc. Os professores, por seu lado, deverão ocupar o seu tempo na organização destas propostas, na organização de reuniões entre si e com os pais… e em visitas às famílias sempre que os pais não venham à escola.

Estes depoimentos mostram que, apesar de, numa primeira análise, se mostrarem divididos, os professores inquiridos apresentam sugestões e propostas interessantes. De sublinhar a sua disponibilidade em ter um papel activo na organização das actividades de complemento de horário e em estratégias de envolvimento das famílias e o seu desejo de poder investir mais nas crianças com dificuldades escolares.

Teresa Vasconcelos
Professora Coordenadora da Escola Superior de Educação de Lisboa

* Publicado no Jornal de Letras - Educação a 27 de Outubro de 2005

6.11.05
 
A escola a tempo inteiro: a experiência de uma Escola Básica Integrada (3) *
“Encontrei uma fórmula que contempla o número de turmas e a diversidade curricular do serviço distribuído a cada professor, sendo variável o número de horas da componente não lectiva, a marcar por cada professor.
Com a bolsa de horas resultante, o Conselho Executivo organizou diversas actividades: assegurar as substituições em casos de faltas, apoios direccionados a alunos devidamente identificados nos conselhos de turma de Julho, tutorias e actividades de pesquisa e leitura orientadas no Centro de Recursos.
Assim, os professores estão distribuídos por várias actividades, com as respectivas horas marcadas no seu horário.
Preparámos de modo cuidado a organização das substituições: foi solicitado aos departamentos curriculares que encontrassem propostas de abordagens lúdicas, articulando e contextualizando diversos saberes, como estratégia para "ganhar" os alunos, levando-os a perceber o porquê e para quê das aprendizagens a realizar nas diversas disciplinas.
Quando não houver necessidade de substituições, por não faltar ninguém, os professores a quem está atribuído esse serviço estão no Centro de Recursos, preparando actividades para as substituições nas diferentes áreas do currículo, de acordo com as propostas dos respectivos departamentos.
A definição das horas a marcar foi feita pelo órgão de direcção. As actividades e sua organização foram discutidas em Conselho Pedagógica.
No 1º ciclo, como não temos horas que cheguem para substituir quem falta, pois cada professor marcou 3 h da componente não lectiva, dão apoio individualizado a alunos com dificuldades de aprendizagem ou que não têm a Língua Portuguesa como 1ª língua.
No que diz respeito ao ensino do Inglês, a professora foi contratada pela Associação de Pais. Mesmo assim, e de acordo com o protocolo que temos com a Associação, ela é orientada pela coordenadora do Departamento de Inglês, não estando, no entanto, presente nas reuniões.
Balanço deste curto tempo: é visível que a escola está muito mais calma e nunca conseguimos ter tantos apoios e em grupos tão pequenos (2 ou 3 alunos).
É de notar que a escola está sobrelotada (tem 680 alunos e devia ter 400), funciona de manhã à noite, o que em muito dificulta este trabalho, pois o único espaço que temos para substituições é a sala do professor que falta (o que por si só é pouco motivador para os alunos) mas tenta-se ultrapassar isso, procurando actividades que os envolvam. É o desafio...”

Teodolinda Boucinha
Escola Básica Integrada da Charneca da Caparica

* Publicado no Jornal de Letras - Educação a 27 de Outubro de 2005

5.11.05
 
A escola a tempo inteiro: Um novo mandato do professor (2)*
O testemunho de um agrupamento de escolas na periferia de Lisboa

“No início do ano escolar os Conselhos Executivos do Concelho reuniram-se e decidiram marcar, para os professores do 1ºciclo e educadores, mais 4 horas por semana. Para os dos 2º e 3º ciclos, além dos 2 tempos que já estavam previstos pela redução dos tempos de 50 para 45 minutos, mais três tempos.
Na EB 2,3 constitui-se assim uma bolsa de professores (cerca de 63 em 112) que cobre todo o horário da escola, com três professores para promoverem actividades de substituição nos tempos de falta.
Nos restantes tempos, os professores desenvolvem actividades de apoio específico aos alunos: Oficina de Língua Portuguesa para alunos que não têm o português como língua materna, Oficina de Matemática, e ainda actividades na área das Artes Visuais e da Música. Alguns destes tempos são usados para coadjuvar a monodocência no 1º ciclo e nos Jardins de Infância.
Nas EB 1e JI que funcionam em regime normal, os professores fazem prolongamento de horário nalguns dias. Para os outros dias, os pais estão a organizar-se para o assegurar. Nas EB1 em desdobramento, fazem actividades de substituição e apoio individualizado a alunos com dificuldades.”

Nuno Santos
Agrupamento de Escolas de Vialonga

* Publicado no Jornal de Letras - Educação a 27 de Outubro de 2005

4.11.05
 
A escola a tempo inteiro: um novo mandato do professor*
O despacho de orientações sobre o ano lectivo tem suscitado um clima de crispação no seio da classe docente que é compreensível, mas que resulta também de uma perspectiva focada nas condições laborais sedimentadas ao longo de décadas. E estas baseiam-se em concepções da vida escolar hoje completamente desfasadas das transformações da sociedade, dos modelos de funcionamento das organizações sociais e das exigências relativamente à escola.

O desempenho da escola

A acção do sistema educativo no nosso país manifesta pesadas lacunas no seu desempenho: a pobreza do nível de habilitações genericamente evidenciadas pela população, os índices de frequência e de abandono escolar, os resultados obtidos em estudos comparados de observatórios internacionais, os fracos níveis de literacia indiciados, quer pela utilização dos media, quer pelas actividades de lazer predominantemente escolhidas pela população, quer pelos hábitos de participação cívica...
E se não podemos imputar à escola a exclusiva responsabilidade perante estes problemas, é impossível ignorar que o seu funcionamento envolve diversos factores que podem intervir muito positivamente na vida das crianças e dos jovens que a frequentam. Desde logo, porque nas sociedades desenvolvidas, e dada a generalização da escolaridade obrigatória, a escola é, em princípio, a única instituição pela qual todos passarão. E não sendo a frequência, como sabemos, um factor seguro de igualização, a escola é certamente um espaço decisivo para a construção pessoal e um lugar de cruzamento e de “regulação” de oportunidades. Usando uma expressão oportuna de E. Lemos Pires, ao obrigar, o Estado obriga-se...Isto é, a escola para todos é um imperativo da qualidade e da diversidade de resposta às necessidades da sociedade, dos grupos sociais, das situações conjunturais.
Ora estas exigências envolvem uma complexidade de acções por parte dos profissionais do sistema escolar. Desde os anos 70, aponta -se para o alargamento das funções do professor e gradualmente foram-se desenhando os contornos de um novo mandato profissional, em que se aprofundam e se amplificam os campos de acção do professor. Reconhece-se o seu papel na gestão do currículo, diversificam-se as formas de actuação com os alunos, é reforçada a importância das equipas educativas como estratégia da organização pedagógica, abrem-se novas fórmulas de intervenção na comunidade.

A escola, um de ambiente de aprendizagem

É neste sentido que se verifica uma das mais significativas mudanças de perspectiva quanto à gestão do tempo da escola, associada à gestão do seu espaço material e social. A unidade da aula, baseada na conjugação espaço-tempo-turma-professor-conteúdo não constitui a referência exclusiva para a organização escolar. Outras combinatórias poderão favorecer experiências de aprendizagem significativa para os alunos, e mais consentâneas com a cultura contemporânea e com a variedade de recursos disponíveis.
Sabemos hoje como é relevante a construção de ambientes educativos favoráveis ao desenvolvimento das aprendizagens, à socialização dos jovens, ao desenvolvimento profissional e pessoal dos próprios professores. Sabemos também que a concepção e a construção desse enquadramento assenta em condições de autonomia, em modos de funcionamento participado e na definição de um projecto próprio que corresponda às características reais das populações. A gestão dos recursos humanos e materiais (entre os quais se contam o tempo e o/s espaço/s) será determinada pelos desígnios do projecto a construir.
Há situações em si mesmas pouco favoráveis. Sabemos que em Portugal os edifícios escolares nunca foram concebidos para o trabalho diferenciado, com espaços de pequena e média área, quer para gabinetes a usar em trabalho de pequeno grupo de professores, quer para atendimento e tutoria de alunos... Nas escolas do 1º ciclo, (e apenas desde os anos 70, nos modelos P3) só há uma sala de professores e nas escolas de 2º e 3º ciclo existem dezenas de professores e certamente os espaços e o equipamento de trabalho (como por exemplo os computadores) estão longe de ser adequados às fórmulas de organização que se preconizam...
Poderá tirar-se partido de situações em que decresceu a população escolar, como as grandes secundárias das grandes cidades, mas... e nas escolas saturadas das áreas metropolitanas, onde existem afinal mais necessidades de atendimento diferenciado dos alunos, e de trabalho aprofundado dos professores em equipa?

Os testemunhos de algumas escolas ( que se apresentarão proximamente) documentam o desafio (como diz uma das professoras) para racionalizar recursos e consolidar práticas, aliás já desenvolvidas em muitas situações. Eles demonstram a importância de os órgãos de gestão assumirem o planeamento estratégico em função de finalidades educativas. Deixam também entrever a salvaguarda de um tempo a gerir individualmente pelos professores.
Eles evidenciam que a participação dos profissionais na concepção e na programação das actividades constitui uma mais –valia na qualidade do serviço e reverte afinal na melhoria do clima de escola.

Maria José Martins
Professora Adjunta da Escola Superior de Educação de Lisboa

*Publicado no Jornal de Letras - Educação a 27 de Outubro de 2005

2.11.05
 
Ranking
Muito se tem falado de rankings ultimamente.
Seria bom pôr alguma lógica na discussão:
1) Não interessa nada dizer que não se tem em conta, nos rankings, as condiçoes do meio social onde a escola se insere. É relativamente fácil, do ponto do vista estatístico, introduzir o factor de correcção adequado.
Faça-se isso de uma vez por todas.
2) O que ainda ninguém referiu é que também é muito importante indicar a taxa dos alunos, em cada escola, que vão a exame e fazê-la pesar no ranking.
É que uma escola que realmente trabalha, dá as respostas adequadas aos alunos e, portanto, a taxa de alunos que vão a exame é superior a uma outra,em semelhantes condições sociais, que, pura e simplesmente, só exija.
Não ter isto em conta é só medir a saída sem se saber como foi conseguida.Um ranking bem feito só pode ser útil. Ninguém ganha com impressões e sensações.
Já agora e a talho de foice. Porque é que não foi publicado o ranking das escolas nos exames nacionais do ensino básico?


João Rangel de Lima